Este estudo analisa como o programa Bolsa Família atua para reduzir desigualdades na educação de crianças e adolescentes por meio da identificação dos principais problemas de estudantes beneficiários.
Entre as conclusões, a pesquisadora destaca os efeitos positivos nos índices de acesso às escolas e uma melhoria ainda incipiente em relação às demais necessidades dos alunos.
Esta pesquisa investiga como o direito à educação está inserido no programa Bolsa Família, principal mecanismo de redução de pobreza do governo federal. A pergunta que a pesquisa busca responder é: quais as conexões do Bolsa Família com a questão educacional e em que medida o programa reduz as múltiplas dimensões de desigualdade educacional enfrentadas pelos participantes?
A referência utilizada para o estudo é a formulação de Marcel Crahay, que define três tipos de igualdade na educação: de acesso, de tratamento e de resultados. Para responder a essa pergunta, foram definidos três objetivos específicos para a pesquisa: analisar o papel da educação no desenho do Bolsa Família; diagnosticar a desigualdade educacional (de acesso, tratamento e conhecimento) enfrentada pelos beneficiários do programa e analisar em que medida ele tem efeitos na redução da desigualdade educacional.
Além de combater a situação de vulnerabilidade das famílias por meio da transferência de renda, o Bolsa Família estabelece algumas condicionalidades. Elas são as contrapartidas que os beneficiários devem realizar e que visam ao corte do ciclo intergeracional de pobreza em que eles estão inseridos.
Na área de educação, a condicionalidade é que as crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos estejam matriculados na escola, com frequência mínima de 85%. Para os jovens entre 16 e 17 anos, a presença estabelecida é de no mínimo 75%. Apesar de o programa colocar como objetivo educacional direto apenas o aumento do acesso à escola, a desigualdade educacional manifesta-se não apenas na dimensão do acesso, mas também no tratamento e no ensino de estudantes mais vulneráveis. É importante, portanto, considerar outras dimensões.
É possível que a integração da área educacional com os setores responsáveis pelo programa tenha efeitos indiretos positivos sobre o tratamento educacional ofertado aos beneficiários e sobre o aprendizado deles. O ponto é que o Bolsa Família identifica os alunos vulneráveis, e o mapeamento deles pode gerar políticas educacionais de justiça corretiva.
Essa dissertação tem como objetivo explorar as conexões do programa Bolsa Família com a educação, analisando principalmente as múltiplas dimensões da desigualdade educacional enfrentadas por seus beneficiários. Adotou-se a concepção de desigualdade educacional de Marcel Crahay, que define três dimensões necessárias de igualdade: acesso, tratamento e conhecimento.
A situação enfrentada pelos beneficiários em cada uma dessas categorias foi avaliada. O diagnóstico foi realizado a partir de bases de dados do Sistema Presença, Censo Escolar, Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e outros indicadores educacionais disponibilizados pelo Inep ((Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Por fim, a maneira como o programa busca reduzir as múltiplas dimensões da desigualdade educacional foi analisada. Este último passo foi realizado a partir de uma revisão de literatura das produções acadêmicas da área e de um estudo de caso na rede municipal de Osasco. A conclusão é que os principais efeitos do Bolsa Família são sobre a dimensão do acesso, ainda que ele tenha efeitos potenciais e incipientes sobre as dimensões de tratamento e aprendizado, principalmente via integração setorial.
Os beneficiários do Bolsa Família já têm taxas de acesso à escola praticamente iguais às de não beneficiários, e essa dimensão da desigualdade deixou de ser relevante. Porém, estudam em escolas de pior infraestrutura, com corpo profissional de formação menos adequada, e têm desempenho menor.
O Bolsa Família tem condições de ter efeitos sobre as outras dimensões da desigualdade educacional na medida em que a intersetorialidade é almejada pelo programa como uma das estratégias de ação. Os efeitos institucionais do programa sobre a intersetorialidade, no entanto, ainda são incipientes.
O programa foi capaz de gerar uma maior integração da área educacional com as outras, mas as ações são realizadas principalmente no sentido de solucionar os problemas dos alunos relacionados ao cumprimento das condicionalidades.
Poucas ações preventivas com objetivo de reduzir as desigualdades enfrentadas por esses alunos são feitas. A literatura que discute os efeitos sobre o desempenho educacional dos estudantes beneficiários não apresenta resultados conclusivos. De maneira geral, os efeitos são estatisticamente insignificantes.
Os acadêmicos, gestores públicos e educadores preocupados com a questão das desigualdades educacionais e com os desafios da educação das populações mais vulneráveis. Além disso, gestores federais e municipais do programa Bolsa Família.
Gabriela Thomazinho é economista formada pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e mestre pela Faculdade de Educação da mesma universidade (FE-USP). Já trabalhou para instituições como Todos Pela Educação e Cenpec.
Referências
- BOURDIEU, P. Reprodução Cultural e reprodução Social. Em BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. Tradução e organização: Sergio Miceli. São Paulo: Perspectiva, 2007. p. 295–336.
- COLEMAN, J. S. Desempenho nas escolas públicas. Em: SOARES, J. F.; BROOKE, N. (Org.) Pesquisa em eficácia escolar: origem e trajetórias. Tradução: Viamundi Idiomas e traduções: Cleusa Aguiar Crooke e Rômulo Monte-Alto. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. p. 26–32
- CRAHAY, M. Poderá a escola ser justa e eficaz? Da igualdade das oportunidades à igualdade dos conhecimentos. Lisboa, Instituto Piaget, 2000.