Dissertação: Experiências menstruais de meninas adolescentes da periferia de Porto Alegre
Autora
Januária Monteiro Menegotto
LattesOrientadora
Fernanda Bittencourt Ribeiro
Área e sub-área
Ciências Sociais, antropologia
Publicado em
PUC-RS 26/08/2022
Como participar?
Esta dissertação analisa como raça, classe e gênero impactam a primeira experiência menstrual e quais os efeitos das narrativas predominantes sobre menstruação.
A partir de relatos de seis meninas que moram na periferia da capital do Rio Grande do Sul, o estudo questiona o discurso predominante sobre o processo natural e suas consequências para as diferentes formas de existências menstruais. Também avalia os sentimentos de nojo e vergonha culturalmente projetados no sangue menstrual.
A pesquisa conclui que é importante garantir acesso, a partir de políticas públicas, a produtos e recursos, e que os símbolos que cercam o assunto são mais violentos e injustos para meninas negras e pobres.
Como raça e classe impactam nas experiências menstruais de meninas e quais narrativas sobre menstruação foram e seguem sendo criadas nos universos dessas adolescentes?
Corpos que menstruam são alvo de vigilância, controle e constrangimento há séculos. Até hoje esses corpos são vistos como compulsoriamente reprodutivos, como abjetos, desviantes e descontrolados — e quando se trata de mulheres negras e pobres tudo isso toma formas ainda mais violentas.
Aproximadamente 1,8 bilhão de meninas, mulheres, homens trans — que não realizaram intervenções cirúrgicas, nem hormonização — e pessoas não binárias em idade reprodutiva menstruam mensalmente no mundo. Ou seja, em média, 26% da população mundial passa de três a sete dias por mês menstruada. No Brasil, 60 milhões de pessoas menstruam, ou seja, 30% do país.
Ao assumir a menstruação como eixo de uma pesquisa etnográfica com adolescentes periféricas, emergiram temas como o controle e o disciplinamento dos corpos femininos, e todos os impactos disso na vida social, cultural e pessoal de meninas e mulheres cisgênero.
Menstruar pela primeira vez é um evento que cria uma nova realidade. A menarca é culturalmente entendida como a entrada na feminilidade e isso implica uma série de imperativos na vida de quem menstrua. Neste trabalho, toma-se a menstruação como fio condutor para mergulhar no universo de seis meninas que vivem em uma região da periferia da cidade de Porto Alegre (RS).
O objetivo é estudar as temáticas que se desdobram a partir das experiências menstruais dessas adolescentes, como: o discurso hegemônico patriarcal cis-heteronormativo, que carrega uma série de dispositivos de controle e vigilância sobre os corpos de meninas e mulheres; a imposição do saber biomédico e suas consequências para as diferentes formas de existências menstruais; os sentimentos de nojo, vergonha e abjeção culturalmente projetados no sangue menstrual; a menstruação como um território também de resistência e enfrentamento às violências da vida cotidiana.
O texto tem como ponto central as histórias das seis meninas e usa essa etnografia para dialogar com autoras e abordagens que se relacionam com o tema menstruação de alguma forma. Além disso, a pesquisa se propõe a usar a interseccionalidade como ferramenta analítica para pensar de que maneira questões de gênero, classe e raça afetam e moldam a complexidade e a diversidade de experiências menstruais.
Tão importante quanto garantir acesso através de políticas públicas a produtos e recursos para o gerenciamento da menstruação de todas as pessoas que menstruam, são as questões simbólicas. Os sentidos socioculturais que a menstruação carrega são reflexo de um sistema que historicamente controla e vigia os corpos das mulheres. Tais sentidos são ainda mais violentos e injustos quando trata-se de meninas negras e pobres.
Menstruar significa ser afetada por uma série de normatividades diferentes e, às vezes, conflitantes: ideias biomédicas de normalidade do fluxo, ideias da indústria de cuidados femininos, ideias de homem cis e até ideias ativistas de que menstruar precisa ser uma experiência boa, desejada por todo mundo. E tudo isso é irreal e opressor porque existe uma abundância de experiências vividas por quem menstrua. A “menstruação normal” é uma ficção.
Pesquisadores e pesquisadoras de estudos de gênero e ciências da saúde. Profissionais que pensam políticas públicas e toda a sociedade.
Januária Monteiro Menegotto é mestra em ciências sociais (bolsa Capes) e bacharel em comunicação social pela PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul). Trabalha como redatora e produtora de conteúdo e é pesquisadora na área de antropologia urbana, com foco em mulheres, meninas e juventudes periféricas.
Referências
- BOBEL, Chris et al. The Palgrave Handbook of Critical Menstruation Studies . London: Palgrave Macmillan, 2020.
- COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Interseccionalidade . São Paulo: Boitempo, 2021.
- MANICA, Daniela Tonelli. Estranhas entranhas: de antropologias e úteros . Amazônica Revista de Antropologia, Pará, v.10, n. 1, p. 20-41, 2018. Disponível em: https://periódicos.ufpa.br/index.php/amazônica/article/view/5852/4872. Acesso em: 9 dez. 2021.
- TARZIBACHI, Eugenia. Cosa de mujeres: menstruación, género y poder . Buenos Aires: Sudamericana, 2017.
- YOUNG, Iris M. On Female Body Experience: “Throwing Like a Girl” and Other Essays. New York : Oxford University Press, 2005.