É POSSÍVEL SER FELIZ MESMO EM MOMENTOS DE CRISE?: Inspiração e autoajuda empreendedora dos coaches na pandemia da Covid-19
Autoria
Flávia Carvalho de Freitas
LattesÁrea e sub-área
Ciências sociais aplicadas/ Comunicação
Publicado em
15/12/2022
Como participar?
Há mais de uma década, os conteúdos de autoajuda deixaram de ser restritos aos livros e ambientes virtuais de alcance limitado. As redes sociais possibilitaram que qualquer pessoa produzisse e compartilhasse conteúdos inspiracionais nas plataformas, até mesmo durante a crise sanitária provocada pela covid-19.
Esta dissertação analisou criticamente os mecanismos discursivos utilizados por e coaches no Instagram durante o primeiro ano da pandemia. O estudo observou que os coaches utilizam discursos técnico-científicos de forma estratégica para ganhar a confiança da audiência que os acompanha online.
Como os coaches influentes no Instagram materializam o discurso inspiracional voltados à crise em um período de instabilidade como a pandemia?
Os famosos chavões do discurso inspiracional, como “tudo é possível, basta acreditar”, “trabalhe enquanto eles dormem” e “busque sempre a felicidade” permeiam o imaginário social, mas pouco se discute as suas problemáticas e como este tipo de discurso é impregnado de despolitização e apagamento de problemas estruturais. Entendendo o período pandêmico decorrente da covid-19 como um acontecimento discursivo, que ressignifica enunciados e gera novos efeitos de sentido, foi realizada uma análise crítica para compreender as dinâmicas do discurso inspiracional durante uma das crises mais impactantes dos últimos anos. É pertinente ressaltar também a falta de estudos acadêmicos relacionados ao “fenômeno coaching”, sobretudo na área de comunicação.
Desde as primeiras décadas dos anos 2000, a autoajuda vem obtendo mais visibilidade na mídia em decorrência do seu crescimento exponencial. Por consequência, o gênero extrapolou a literatura e se fragmentou na ambiência dos sites de redes sociais. Neste contexto, figuras como coaches ganharam destaque em virtude de polêmicas como a falta de regulamentação da atividade, a prática ilegal da psicologia e a espetacularização do discurso inspiracional nas mídias sociais digitais.
Este trabalho se propôs a analisar como coaches influentes no Instagram materializam o discurso inspiracional voltados à crise em um período de instabilidade como a pandemia. A abordagem metodológica está amparada na análise de conteúdo e análise do discurso. Selecionamos como objeto de estudo vídeos do Instagram produzidos pelos masters coaches José Roberto Marques e Paulo Vieira.
Devido à lógica da autoajuda empreendedora, que impulsiona a produção de “empreendedores de si mesmo” e estimula uma produtividade incessante, a perspectiva do coletivo é silenciada mediante a abundante ênfase na perspectiva individual como premissa para a solução de todos os problemas, sendo o discurso inspiracional muitas vezes enaltecido como a tábua de salvação.
Constatou-se que a positividade tóxica é resultante também de um silenciamento, uma vez que o forte impacto ocasionado pela pandemia é reduzido, enquanto o excesso de positividade é exaltado.
Para proferir seu discurso inspiracional, os coaches se ancoram em um léxico técnico e científico para delinear a figura de um sujeito crível que deve despertar a confiança dos seus seguidores e os fazer consumir tanto suas ideias quanto seus próprios serviços de coaching.
Pesquisadores de comunicação, consumo, linguística, literatura de autoajuda, redes sociais digitais, educação e demais áreas correlatas. Pesquisadores com temas voltados à religião e espiritualidade, devido à proximidade dos coaches com o discurso religioso. Pessoas interessadas em entender as problemáticas das dinâmicas do discurso inspiracional, sobretudo no período pandêmico, incluindo o discurso meritocrático e a sua despolitização.
Flávia Carvalho de Freitas é mestra pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e graduada em Publicidade pela mesma universidade. É também turismóloga pelo IFPE (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco). Participa do grupo de pesquisa PHINC (Publicidade Híbrida e Narrativas de Consumo) e do grupo FEGECCAP (Núcleo de Estudos Críticos de Feminismos, Gênero, Consumo e Capitalismo).
Referências
- CABANAS, E; ILLOUZ, E. Happycracia – Fabricando cidadãos felizes. Ubu editora. 2022.
- CASAQUI, V. Abordagem crítica da cultura da inspiração: produção de narrativas e o ideário da sociedade empreendedora. In: E-Compós, v. 20, n. 2, p. 1-18, mai./ago., 2017.
- MAINGUENEAU, D. Discurso e análise de discurso. São Paulo: Parábola editorial, 2015.
- MARÍN-DIAZ, D. L. Autoajuda, educação e práticas de si: genealogia de uma antropotécnica. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.
- PÊCHEUX, M. O discurso: estrutura ou acontecimento. Campinas, SP: Pontes Editores, 2006.