Coluna

Tiago Mitraud

Saneamento é básico

13 de setembro de 2019

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A ausência de saneamento básico impacta a saúde e a qualidade de vida de milhões de brasileiros. Precisamos de um debate focado na resolução de problemas para garantir a universalização do serviço

Mais de 100 milhões de brasileiros não possuem coleta de esgoto em casa. Cerca de 35 milhões não têm sequer acesso a água tratada . Tais números mostram quão longe ainda estamos de algo que deveria ser básico no século 21. Com uma legislação que privilegia a oferta do serviço via concessionárias estatais e dificulta a entrada do investimento privado no setor, estamos ainda muito distantes da meta de universalização do serviço no Brasil até 2033, estabelecida pelo Plano Nacional de Saneamento Básico.

O impacto mais evidente da falta de saneamento básico é na saúde. Cerca de 35% dos municípios registraram epidemias ou endemias como dengue, diarreia e verminoses, doenças que costumam decorrer da falta do serviço. Mas a ausência de saneamento básico impacta também na qualidade de vida. São milhões de famílias brasileiras que, ao saírem de casa para estudar ou trabalhar, testemunham o esgoto a céu aberto e o seu despejo não tratado em afluentes. Para piorar, muitas crianças e jovens não têm acesso ao serviço nem mesmo na escola. O Censo Escolar 2018 (Inep) revelou que 49% das escolas do ensino básico não estão ligadas à rede de esgoto e 26% não têm acesso a água encanada.

Estima-se que sejam necessários cerca de R$ 615 bilhões de reais em investimentos para que consigamos levar saneamento para todos os brasileiros no prazo previsto. No entanto, o ritmo do investimento — hoje majoritariamente público — tem sido muito abaixo do adequado. Em 2016, investiu-se menos de R$11 bilhões , enquanto o valor necessário seria da ordem de R$ 40 bilhões. Insistir no atual modelo é privar a maior parte da população brasileira da dignidade que o acesso a água potável, coleta e tratamento de esgoto trazem.

Sem qualquer expectativa de que o setor vá receber investimentos públicos que sejam suficientes, já que na grave crise fiscal em que vivemos falta dinheiro para quase tudo — exceto para regalias do Judiciário e do Legislativo — é necessário que sejamos pragmáticos para reconhecer que o poder público é hoje incapaz de garantir a velocidade e qualidade necessárias para a expansão do saneamento a todos os brasileiros.

É comum ouvir argumentos falhos de que empresas privadas se recusam a alcançar municípios menores ou que cobram muito caro do cidadão. Na realidade, os números mostram que mais da metade das empresas privadas — que hoje são apenas 6% do setor, segundo dados de 2018 do SPRIS (Sistema de Informações do Segmento Privado do Setor Saneamento) — estão em municípios com menos de 20 mil habitantes, oferecem serviço de melhor qualidade e têm tarifas comparáveis às aplicadas pelas empresas estatais, enquanto o nível de investimento é bastante superior. Mesmo mantendo uma faixa pequena do mercado, elas têm sido responsáveis por cerca de 20% do investimento no setor (SPRIS, 2018).

Tiago Mitraud

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