Acadêmico

Como os poemas de Safo foram recebidos ao longo do tempo

Sara Anjos e Rafael Silva

12 de outubro de 2023(atualizado 28/12/2023 às 22h09)
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Violência, silêncio e revolta velada nas leituras de Safo (fr. 31 Voigt)

Autoria

Sara Anjos e Rafael Silva

Lattes

Área e sub-área

Literatura Clássica/ Estudos de Gênero

Publicado em

10/12/2021

Este artigo analisou como as obras da poetisa grega Safo foram recebidas e interpretadas. Safo viveu durante o século 6 a.C em Lesbos, terceira maior ilha grega. Grande parte do seu trabalho poético se perdeu, mas o trabalho remanescente influenciou de forma profunda o modo como a cultura ocidental concebe o amor e o desejo.

O trabalho observou como os textos de Safo foram avaliados ao longo do tempo e o que isso diz sobre o desenvolvimento do imaginário social com relação a questões complexas como gênero e sexualidade.

1Qual pergunta a pesquisa responde?

Como Safo de Lesbos e sua poesia foram recebidas ao longo dos séculos?

2Por que isso é relevante?

A recepção dos poemas de Safo variou radicalmente, ao ritmo das mudanças na própria mentalidade de seus leitores e suas leitoras, de modo que acompanhar diacronicamente essa variação é evidenciar o desenvolvimento do imaginário social com relação a muitas das questões complexas trazidas por sua poesia. A posição social da mulher, por exemplo, ou alguns aspectos do homoerotismo – assuntos profundamente imbricados em Safo – prestam-se de modo frequente como material para essas leituras, partindo de algumas das perspectivas vigentes num dado período a fim de criar e reforçar certos discursos de poder.

3Resumo da pesquisa

Safo de Lesbos é uma poeta grega antiga, cuja vida se desenrolou entre os anos de 630 e 580 a.C., com um destino excepcional para uma mulher do contexto histórico em que viveu: compôs poemas que se tornaram incontornáveis no âmbito da tradição literária ocidental, figurando como um dos expoentes da poesia grega e de um de seus gêneros mais importantes, a mélica (habitualmente chamada de lírica). Embora seja o único nome feminino no conjunto de poetas cuja obra nos chegou da Grécia arcaica (800-480 a.C.), e muitas anedotas sobre sua vida possam ser colhidas em obras posteriores, pouquíssimas são as informações seguras de cunho biográfico acerca dela – como costuma acontecer com a maioria dos poetas do período arcaico.

A história da recepção dos poemas de Safo varia gradualmente, ao ritmo das mudanças na própria mentalidade de seus leitores, de modo que acompanhar cronologicamente essa variação é evidenciar o desenvolvimento do imaginário social com relação a muitas das questões complexas trazidas por sua poesia.

A posição social da mulher, por exemplo, ou aspectos do homoerotismo prestam-se de modo frequente como material para essas leituras, partindo de algumas das perspectivas vigentes num dado período a fim de criar e reforçar discursos de poder. O famoso fragmento 31 Voigt de Safo é um caso emblemático dessa multiplicidade de leituras. O intuito da pesquisa é partir dele para tecer considerações e esclarecimentos sobre algumas facetas da obra de Safo encobertas por séculos de violência, silêncio e revolta velada.

4Quais foram as conclusões?

A multiplicidade de leituras revela o avanço de estudos que permitem ler e interpretar textos à luz de novas considerações, em parte mais livres (e, quando não, ao menos mais conscientes) de pressuposições que deformam textos potencialmente subversivos ao abordá-los e domesticá-los a partir da perspectiva do grupo dominante numa dada sociedade. No caso de Safo, essas abordagens tradicionais tendem a rechaçar os aspectos mais radicais de sua poética, tais como a releitura profunda que ela leva a cabo de toda a tradição épica, a contestação da subalternidade feminina e o recalque da sexualidade e do prazer da mulher.

"Safo e Erina em um jardim", Simeon Solomon (1864)

Safo e Erina em um jardim

No estudo que dedica à linguagem amatória de Safo, Giuliana Lanata (1996) defende que as seleções feitas pela poeta no âmbito do patrimônio lexical da poesia épica, como os novos meios linguísticos com os quais ela dava expressão a um mundo diverso do mundo épico, estavam destinadas, por sua vez, a se consolidar como tradicionais. Que tais dimensões da poética sáfica comecem a ser ressaltadas em algumas das leituras mais recentes de sua obra é um importante indicativo de que os olhos da recepção aos poucos são iluminados por feixes que lhe permitem ver facetas encobertas por séculos de violência, silêncio e revolta velada.

5Quem deveria conhecer seus resultados?

O público em geral e, mais especificamente, pessoas que se interessam pela história do movimento LGBTI+ e estudos de gênero.

Sara Anjos é graduada em letras clássicas pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Atuou como estagiária no projeto de extensão Contos de Mitologia da mesma universidade. Fez iniciação científica voluntária no projeto Tradução e estudo do Liber Prodigiorum, de Iulius Obsequens, sob a orientação do professor Matheus Trevizam. Defendeu a monografia intitulada Helena trama: tecidos e histórias no canto IV da Odisseia de Homero, sob a orientação do professor Antonio Orlando Dourado-Lopes. Possui artigos publicados na área Recepção Clássica e Estudos Feministas e de Gênero. Faz mestrado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da UFMG, orientada pelo professor Jacyntho Lins Brandão. O título da dissertação é Tiámat e Gaia: Uma leitura ecocrítica de Enuma Elish e Teogonia.

Rafael Silva é professor de Literatura da UECE (Universidade Estadual do Ceará), com bacharelado em Grego Antigo e licenciatura em Português-Francês pela Faculdade de Letras da UFMG, além de mestrado e doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários pela mesma universidade. Atualmente, faz pós-doutorado sob a supervisão do professor Nabil Araújo (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Elaborou a monografia “Uma poética de Platão”, a dissertação “Arqueologias do drama: uma arqueologia dramática” e a tese “O Evangelho de Homero: Por uma outra história dos estudos clássicos”. Na UFMG, atuou como professor voluntário do Apoio Pedagógico (2016-2021), co-organizador do Seminário do Núcleo de Estudos Antigos e Medievais e professor substituto de Grego Antigo (2019). Entre 2018 e 2021, foi editor da “Em Tese”, revista discente de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários. Também publicou artigos e capítulos e livros, com destaque para “Origens do drama clássico na Grécia Antiga” (Edições Loyola, 2022) e, em coautoria, “Ser clássico no Brasil: Apropriações literárias no modernismo e pós” (Editora da Universidade de Coimbra, 2022).

Sara Anjos é graduada em letras clássicas pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Atuou como estagiária no projeto de extensão Contos de Mitologia da mesma universidade. Fez iniciação científica voluntária no projeto Tradução e estudo do Liber Prodigiorum, de Iulius Obsequens, sob a orientação do professor Matheus Trevizam. Defendeu a monografia intitulada Helena trama: tecidos e histórias no canto IV da Odisseia de Homero, sob a orientação do professor Antonio Orlando Dourado-Lopes. Possui artigos publicados na área Recepção Clássica e Estudos Feministas e de Gênero. Faz mestrado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da UFMG, orientada pelo professor Jacyntho Lins Brandão. O título da dissertação é Tiámat e Gaia: Uma leitura ecocrítica de Enuma Elish e Teogonia.

Rafael Silva é professor de Literatura da UECE (Universidade Estadual do Ceará), com bacharelado em Grego Antigo e licenciatura em Português-Francês pela Faculdade de Letras da UFMG, além de mestrado e doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários pela mesma universidade. Atualmente, faz pós-doutorado sob a supervisão do professor Nabil Araújo (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Elaborou a monografia “Uma poética de Platão”, a dissertação “Arqueologias do drama: uma arqueologia dramática” e a tese “O Evangelho de Homero: Por uma outra história dos estudos clássicos”. Na UFMG, atuou como professor voluntário do Apoio Pedagógico (2016-2021), co-organizador do Seminário do Núcleo de Estudos Antigos e Medievais e professor substituto de Grego Antigo (2019). Entre 2018 e 2021, foi editor da “Em Tese”, revista discente de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários. Também publicou artigos e capítulos e livros, com destaque para “Origens do drama clássico na Grécia Antiga” (Edições Loyola, 2022) e, em coautoria, “Ser clássico no Brasil: Apropriações literárias no modernismo e pós” (Editora da Universidade de Coimbra, 2022).

Referências

  • RAGUSA, Giuliana. Fragmentos de uma deusa: A representação de Afrodite na lírica de Safo. Campinas: Editora da UNICAMP, 2005.
  • RAGUSA, Giuliana. Lira grega: antologia de poesia arcaica. Organização e tradução de Giuliana Ragusa. São Paulo: Hedra, 2013.
  • HALLETT, Judith P.. “Sappho and Her Social Context: Sense and Sensuality”. In: GREENE, Ellen (Ed.). Reading Sappho: Contemporary Approaches. Berkeley: University of California Press, 1996. p. 125-142.
  • SEGAL, Charles. “Eros and Incantation: Sappho and Oral Poetry”. In: GREENE, Ellen (Ed.). Reading Sappho: Contemporary Approaches. Berkeley: University of California Press, 1996. p. 58-78.
  • MALTA, André. “Re-visão do amor em Safo ou Safo para além de Safo”. Anais de Filosofia Clássica, v. 12, n. 23, p. 96-106, 2018.

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