ESPECIAL
A rainha-mãe africana
que foi enviada ao Brasil:
Agontimé
Por Lucas Gomes e
Fredy Alexandrakis
em 19 de novembro de 2021
Membro da realeza do Daomé, ela foi escravizada após uma disputa familiar. As hipóteses sobre sua trajetória do outro lado do Atlântico sugerem uma importante influência sobre a cultura brasileira
Dinâmicas do comércio de escravizados, disputas sucessórias de um extinto reino africano e o desenvolvimento de uma nova religião são elementos que se cruzam na história de Agontimé, figura pouco conhecida pelos brasileiros. Com origem na nobreza do Daomé, no atual Benin, ela teve um destino comum a mais de 12 milhões de africanos: acabou transportada contra a própria vontade às Américas no tráfico transatlântico de pessoas.
Pouco se sabe sobre sua trajetória a partir daí. Muito provavelmente, veio parar no Brasil, assim como a maior parte dos escravizados que partiram do golfo do Benin no século 18 — região que ficou conhecida como Costa dos Escravos. Segundo uma hipótese, aqui ela teria ganhado outro nome: Maria Jesuína. E continuando seu culto às divindades daomeanas, fundou no Maranhão um dos primeiros centros religiosos de matriz africana, que virou modelo para a região. Saiba quem foi Nã Agontimé:
PARTE 1
Agontimé em Daomé
Benin
Abomey
Nigéria
Gana
Togo
Reino de Daomé, atual Benin
Golfo do Benin
A corte do rei Agongono
Reino de Daomé
Agontimé era uma das oito esposas de Agongono, monarca do antigo Daomé, localizado no atual Benin
O reino foi fundado pelo povo fon por volta de 1600 e existiu até 1904, quando foi dominado pela França.
Estabeleceu-se como uma potência no tráfico de escravizados com a conquista de cidades costeiras. Lá se cultuavam divindades chamadas voduns, às quais eram feitos sacrifícios humanos em celebrações anuais.
No século 18, o reino tinha uma economia baseada na conquista de outros povos e venda de escravizados aos europeus
Sucessão
Oráculo de ifá
O Ifá é um sistema divinatório com origem na etnia iorubá, da região da Nigéria.
As consultas são mediadas por um sacerdote, que seleciona aleatoriamente um conjunto de textos míticos e ajuda a interpretá-los.
Foi reconhecido como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela Unesco, em 2005.
Adandozan era filho do rei e herdeiro do trono de Daomé
Após consultar o oráculo de Ifá, no entanto, Agongono decidiu que seu sucessor seria o jovem Gapê, seu filho com Agontimé
Reino de terror
O TRONO DESTRUÍDO
Quando Agongono morreu, em 1797, Adandozan contrariou os desejos do pai e tomou o poder
O trono do rei Adandozan pertencia ao acervo do Museu Nacional e foi destruído no incêndio de 2018.
Acredita-se que o objeto tenha feito parte de uma coleção enviada pela embaixada do próprio Adandozan a Dom João 6º, de Portugal, em 1810.
Ele ficou conhecido por sua crueldade como governante. Sob seu reinado, cidadãos do próprio Daomé passaram a ser vendidos ao tráfico de escravizados pela primeira vez
PARTE 2
Isolada do reino
África
Porto de Uidá, no atual Benin
Costa
da Mina
Oceano
Atlântico
Rota da Mina
América
do Sul
tráfico de pessoas
Rumo ao Novo Mundo
Na disputa sucessória pelo poder, Adandozan enviou membros da família real às Américas como escravizados
TRÁFICO DE
ESCRAVIZADOS
De meados do século 16 até o século 19, o golfo do Benin ficou conhecido como Costa dos Escravos.
Daomé estabeleceu uma lucrativa relação comercial com os portos brasileiros, que se manteve forte por décadas, mesmo após acordos com o Império Britânico pela abolição do tráfico de escravizados.
Um deles foi Agontimé. Seu destino exato ainda é incerto
Em busca da rainha-mãe
TRAFICANTE ALIADO
Gapê destronou Adandozan em 1818, coroando-se rei e adotando o nome Ghézo
Um dos aliados de Ghézo na busca por Agontimé foi o mercador de escravizados brasileiro Francisco Félix de Souza. Enviado à África em 1788, tornou-se comandante do porto de Uidá, ainda sob o reinado de Agongono.
Félix chegou a ser preso por um conflito com Adandozan e fez um pacto de sangue com Ghézo, ajudando-o a derrubar o irmão. Ganhou o honorífico de chachá e monopólio da exportação de escravizados.
Ele nomeou Agontimé como kpojito, rainha-mãe, e enviou uma comitiva em sua procura nas Américas
Sem rastros
KPOJITO
Aqui a história da rainha-mãe passa a ter menos registros históricos e entra no campo da especulação
Agontimé ficou conhecida como Nã Agontimé. Nã era um título honorífico. E a kpojito, rainha-mãe, era apontada pelo rei entre as esposas do monarco antecessor.
A escolha de Agontimé, quando ela já estava perdida nas Américas, pode simbolizar a rivalidade de Ghézo com Adandozan.
Há relatos de que Agontimé foi encontrada no Brasil e levada de volta ao Daomé, outros apontam que ela nunca foi achada
PARTE 3
Um ritual de fé
Oceano
Atlântico
Baía de
Marajó
Casa
das Minas
Pará
Maranhão
em são luís
brasil
Primeiros indícios
HISTÓRIA DA CASA
Historiadores encontraram pistas do paradeiro de Nã Agontimé na Casa das Minas-Jejê, templo em São Luís (MA)
O nome Casa das Minas-Jejê é relacionado à origem dos africanos que fundaram o centro, por volta de 1840. “Minas” vem de Costa da Mina, ou Costa do Ouro; “jejê” é um grupo étnico presente no Daomé.
O centro tinha estrutura matriarcal e teve oito gerações de sacerdotisas (vodunsis), mas, por falta de sucessoras, não realiza ritos religiosos desde 2015.
As divindades cultuadas pela casa eram as mesmas da antiga realeza daomeana, e houve forte fluxo de escravizados do reino ao Maranhão no século 18
Sob outro nome
Agontimé pode ter sido a mesma pessoa que Maria Jesuína, fundadora do centro, segundo teoria desenvolvida pelo antropólogo francês Pierre Verger
VODUNS
O Maranhão é o único lugar das Américas onde se encontraram cultos às divindades ancestrais da realeza do Daomé.
O nome africano da Casa das Minas é Querebentã de Zomadonu, o que significa algo como “Casa grande de Zomadonu”, em referência ao vodum protetor da fundadora Maria Jesuína.
A rainha-mãe teria sido enviada ao país com dezenas de suas criadas, o que coincide com descrições do grupo que fundou o templo
Influência na religião
A Casa das Minas é apontada como o primeiro templo de tambor de mina no Maranhão
TAMBOR DE MINA
Assim como outras religiões afro-brasileiras, o tambor de mina tem como característica o estado de transe ou possessão assumido pelas vodunsis, que incorporam divindades durante o culto.
Outro importante terreiro maranhense, contemporâneo da Casa de Minas, é a Casa de Nagô. Ambas foram tombadas pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Também foi um dos primeiros centros religiosos de matriz africana no Brasil. Embora não tenha casas filiadas, serviu de modelo para outras no Norte e Nordeste do país
Fonte: CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. A Casa das Minas de São Luís do Maranhão e a saga de Nã Agontimé. Sociologia & Antropologia, v. 9, n. 2, p. 387-429, 2019.
Produzido por Lucas Gomes
Texto por Fredy Alexandrakis
Design e ilustrações por Lucas Gomes
Desenvolvimento por Caroline Souza
Edição por Gabriel Zanlorenssi
©2021 Nexo Jornal
Membro da realeza do Daomé, ela foi escravizada após uma disputa familiar. As hipóteses sobre sua trajetória do outro lado do Atlântico sugerem uma importante influência sobre a cultura brasileira
Dinâmicas do comércio de escravizados, disputas sucessórias de um extinto reino africano e o desenvolvimento de uma nova religião são elementos que se cruzam na história de Agontimé, figura pouco conhecida pelos brasileiros. Com origem na nobreza do Daomé, no atual Benin, ela teve um destino comum a mais de 12 milhões de africanos: acabou transportada contra a própria vontade às Américas no tráfico transatlântico de pessoas.
Pouco se sabe sobre sua trajetória a partir daí. Muito provavelmente, veio parar no Brasil, assim como a maior parte dos escravizados que partiram do golfo do Benin no século 18 — região que ficou conhecida como Costa dos Escravos. Segundo uma hipótese, aqui ela teria ganhado outro nome: Maria Jesuína. E continuando seu culto às divindades daomeanas, fundou no Maranhão um dos primeiros centros religiosos de matriz africana, que virou modelo para a região. Saiba quem foi Nã Agontimé:
PARTE 1
Agontimé em Daomé
Benin
Abomey
Nigéria
Gana
Togo
Reino de Daomé, atual Benin
Golfo do Benin
A corte do rei Agongono
Reino de Daomé
Agontimé era uma das oito esposas de Agongono, monarca do antigo Daomé, localizado no atual Benin
O reino foi fundado pelo povo fon por volta de 1600 e existiu até 1904, quando foi dominado pela França.
Estabeleceu-se como uma potência no tráfico de escravizados com a conquista de cidades costeiras. Lá se cultuavam divindades chamadas voduns, às quais eram feitos sacrifícios humanos em celebrações anuais.
No século 18, o reino tinha uma economia baseada na conquista de outros povos e venda de escravizados aos europeus
Sucessão
Oráculo de ifá
O Ifá é um sistema divinatório com origem na etnia iorubá, da região da Nigéria.
As consultas são mediadas por um sacerdote, que seleciona aleatoriamente um conjunto de textos míticos e ajuda a interpretá-los.
Foi reconhecido como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela Unesco, em 2005.
Adandozan era filho do rei e herdeiro do trono de Daomé
Após consultar o oráculo de Ifá, no entanto, Agongono decidiu que seu sucessor seria o jovem Gapê, seu filho com Agontimé
Reino de terror
O TRONO DESTRUÍDO
Quando Agongono morreu, em 1797, Adandozan contrariou os desejos do pai e tomou o poder
O trono do rei Adandozan pertencia ao acervo do Museu Nacional e foi destruído no incêndio de 2018.
Acredita-se que o objeto tenha feito parte de uma coleção enviada pela embaixada do próprio Adandozan a Dom João 6º, de Portugal, em 1810.
Ele ficou conhecido por sua crueldade como governante. Sob seu reinado, cidadãos do próprio Daomé passaram a ser vendidos ao tráfico de escravizados pela primeira vez
PARTE 2
Isolada do reino
África
Porto de Uidá, no atual Benin
Costa
da Mina
Oceano
Atlântico
Rota da Mina
América
do Sul
tráfico de pessoas
Rumo ao Novo Mundo
TRÁFICO DE
ESCRAVIZADOS
Na disputa sucessória pelo poder, Adandozan enviou membros da família real às Américas como escravizados
De meados do século 16 até o século 19, o golfo do Benin ficou conhecido como Costa dos Escravos.
Daomé estabeleceu uma lucrativa relação comercial com os portos brasileiros, que se manteve forte por décadas, mesmo após acordos com o Império Britânico pela abolição do tráfico de escravizados.
Um deles foi Agontimé. Seu destino exato ainda é incerto
Em busca da rainha-mãe
TRAFICANTE ALIADO
Gapê destronou Adandozan em 1818, coroando-se rei e adotando o nome Ghézo
Um dos aliados de Ghézo na busca por Agontimé foi o mercador de escravizados brasileiro Francisco Félix de Souza. Enviado à África em 1788, tornou-se comandante do porto de Uidá, ainda sob o reinado de Agongono.
Félix chegou a ser preso por um conflito com Adandozan e fez um pacto de sangue com Ghézo, ajudando-o a derrubar o irmão. Ganhou o honorífico de chachá e monopólio da exportação de escravizados.
Ele nomeou Agontimé como kpojito, rainha-mãe, e enviou uma comitiva em sua procura nas Américas
Sem rastros
KPOJITO
Aqui a história da rainha-mãe passa a ter menos registros históricos e entra no campo da especulação
Agontimé ficou conhecida como Nã Agontimé. Nã era um título honorífico. E a kpojito, rainha-mãe, era apontada pelo rei entre as esposas do monarco antecessor.
A escolha de Agontimé, quando ela já estava perdida nas Américas, pode simbolizar a rivalidade de Ghézo com Adandozan.
Há relatos de que Agontimé foi encontrada no Brasil e levada de volta ao Daomé, outros apontam que ela nunca foi achada
PARTE 3
Um ritual de fé
Oceano
Atlântico
Baía de
Marajó
Casa
das Minas
Pará
Maranhão
em são luís
brasil
Primeiros indícios
HISTÓRIA DA CASA
Historiadores encontraram pistas do paradeiro de Nã Agontimé na Casa das Minas-Jejê, templo em São Luís (MA)
O nome Casa das Minas-Jejê é relacionado à origem dos africanos que fundaram o centro, por volta de 1840. “Minas” vem de Costa da Mina, ou Costa do Ouro; “jejê” é um grupo étnico presente no Daomé.
O centro tinha estrutura matriarcal e teve oito gerações de sacerdotisas (vodunsis), mas, por falta de sucessoras, não realiza ritos religiosos desde 2015.
As divindades cultuadas pela casa eram as mesmas da antiga realeza daomeana, e houve forte fluxo de escravizados do reino ao Maranhão no século 18
Sob outro nome
Agontimé pode ter sido a mesma pessoa que Maria Jesuína, fundadora do centro, segundo teoria desenvolvida pelo antropólogo francês Pierre Verger
VODUNS
O Maranhão é o único lugar das Américas onde se encontraram cultos às divindades ancestrais da realeza do Daomé.
O nome africano da Casa das Minas é Querebentã de Zomadonu, o que significa algo como “Casa grande de Zomadonu”, em referência ao vodum protetor da fundadora Maria Jesuína.
A rainha-mãe teria sido enviada ao país com dezenas de suas criadas, o que coincide com descrições do grupo que fundou o templo
Influência na religião
TAMBOR DE MINA
A Casa das Minas é apontada como o primeiro templo de tambor de mina no Maranhão
Assim como outras religiões afro-brasileiras, o tambor de mina tem como característica o estado de transe ou possessão assumido pelas vodunsis, que incorporam divindades durante o culto.
Outro importante terreiro maranhense, contemporâneo da Casa de Minas, é a Casa de Nagô. Ambas foram tombadas pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Também foi um dos primeiros centros religiosos de matriz africana no Brasil. Embora não tenha casas filiadas, serviu de modelo para outras no Norte e Nordeste do país
Fonte: CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. A Casa das Minas de São Luís do Maranhão e a saga de Nã Agontimé. Sociologia & Antropologia, v. 9, n. 2, p. 387-429, 2019.
Produzido por Lucas Gomes
Texto por Fredy Alexandrakis
Design e ilustrações por Lucas Gomes
Desenvolvimento por Caroline Souza
Edição por Gabriel Zanlorenssi
©2021 Nexo Jornal
Membro da realeza do Daomé, ela foi escravizada após uma disputa familiar. As hipóteses sobre sua trajetória do outro lado do Atlântico sugerem uma importante influência sobre a cultura brasileira
Dinâmicas do comércio de escravizados, disputas sucessórias de um extinto reino africano e o desenvolvimento de uma nova religião são elementos que se cruzam na história de Agontimé, figura pouco conhecida pelos brasileiros. Com origem na nobreza do Daomé, no atual Benin, ela teve um destino comum a mais de 12 milhões de africanos: acabou transportada contra a própria vontade às Américas no tráfico transatlântico de pessoas.
Pouco se sabe sobre sua trajetória a partir daí. Muito provavelmente, veio parar no Brasil, assim como a maior parte dos escravizados que partiram do golfo do Benin no século 18 — região que ficou conhecida como Costa dos Escravos. Segundo uma hipótese, aqui ela teria ganhado outro nome: Maria Jesuína. E continuando seu culto às divindades daomeanas, fundou no Maranhão um dos primeiros centros religiosos de matriz africana, que virou modelo para a região. Saiba quem foi Nã Agontimé:
PARTE 1
Agontimé em Daomé
Togo
Benin
Abomey
Nigéria
Gana
Reino de Daomé, atual Benin
Golfo
do Benin
A corte do rei Agongono
Agontimé era uma das oito esposas de Agongono, monarca do antigo Daomé, localizado no atual Benin
No século 18, o reino tinha uma economia baseada na conquista de outros povos e venda de escravizados aos europeus
Reino de Daomé
O reino foi fundado pelo povo fon por volta de 1600 e existiu até 1904, quando foi dominado pela França.
Estabeleceu-se como uma potência no tráfico de escravizados com a conquista de cidades costeiras. Lá se cultuavam divindades chamadas voduns, às quais eram feitos sacrifícios humanos em celebrações anuais.
Sucessão
Adandozan era filho do rei e herdeiro do trono de Daomé
Após consultar o oráculo de Ifá, no entanto, Agongono decidiu que seu sucessor seria o jovem Gapê, seu filho com Agontimé
Oráculo de ifá
O Ifá é um sistema divinatório com origem na etnia iorubá, da região da Nigéria.
As consultas são mediadas por um sacerdote, que seleciona aleatoriamente um conjunto de textos míticos e ajuda a interpretá-los.
Foi reconhecido como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela Unesco, em 2005.
Reino de terror
Quando Agongono morreu, em 1797, Adandozan contrariou os desejos do pai e tomou o poder
Ele ficou conhecido por sua crueldade como governante. Sob seu reinado, cidadãos do próprio Daomé passaram a ser vendidos ao tráfico de escravizados pela primeira vez
O TRONO DESTRUÍDO
O trono do rei Adandozan pertencia ao acervo do Museu Nacional e foi destruído no incêndio de 2018.
Acredita-se que o objeto tenha feito parte de uma coleção enviada pela embaixada do próprio Adandozan a Dom João 6º, de Portugal, em 1810.
PARTE 2
Isolada do reino
Costa
da Mina
Oceano
Atlântico
Rota
da Mina
tráfico de pessoas
Rumo ao Novo Mundo
Na disputa sucessória pelo poder, Adandozan enviou membros da família real às Américas como escravizados
Um deles foi Agontimé. Seu destino exato ainda é incerto
TRÁFICO DE ESCRAVIZADOS
De meados do século 16 até o século 19, o golfo do Benin ficou conhecido como Costa dos Escravos.
Daomé estabeleceu uma lucrativa relação comercial com os portos brasileiros, que se manteve forte por décadas, mesmo após acordos com o Império Britânico pela abolição do tráfico de escravizados.
Em busca da rainha-mãe
Gapê destronou Adandozan em 1818, coroando-se rei e adotando o nome Ghézo
Ele nomeou Agontimé como kpojito, rainha-mãe, e enviou uma comitiva em sua procura nas Américas
TRAFICANTE ALIADO
Um dos aliados de Ghézo na busca por Agontimé foi o mercador de escravizados brasileiro Francisco Félix de Souza. Enviado à África em 1788, tornou-se comandante do porto de Uidá, ainda sob o reinado de Agongono.
Félix chegou a ser preso por um conflito com Adandozan e fez um pacto de sangue com Ghézo, ajudando-o a derrubar o irmão. Ganhou o honorífico de chachá e monopólio da exportação de escravizados.
Sem rastros
Aqui a história da rainha-mãe passa a ter menos registros históricos e entra no campo da especulação
Há relatos de que Agontimé foi encontrada no Brasil e levada de volta ao Daomé, outros apontam que ela nunca foi achada
KPOJITO
Agontimé ficou conhecida como Nã Agontimé. Nã era um título honorífico. E a kpojito, rainha-mãe, era apontada pelo rei entre as esposas do monarco antecessor.
A escolha de Agontimé, quando ela já estava perdida nas Américas, pode simbolizar a rivalidade de Ghézo com Adandozan.
PARTE 3
Um ritual de fé
Oceano
Atlântico
Casa
das Minas
brasil
em são luís
Maranhão
Pará
Primeiros indícios
Historiadores encontraram pistas do paradeiro de Nã Agontimé na Casa das Minas-Jejê, templo em São Luís (MA)
As divindades cultuadas pela casa eram as mesmas da antiga realeza daomeana, e houve forte fluxo de escravizados do reino ao Maranhão no século 18
HISTÓRIA DA CASA
O nome Casa das Minas-Jejê é relacionado à origem dos africanos que fundaram o centro, por volta de 1840. “Minas” vem de Costa da Mina, ou Costa do Ouro; “jejê” é um grupo étnico presente no Daomé.
O centro tinha estrutura matriarcal e teve oito gerações de sacerdotisas (vodunsis), mas, por falta de sucessoras, não realiza ritos religiosos desde 2015.
Sob outro nome
Agontimé pode ter sido a mesma pessoa que Maria Jesuína, fundadora do centro, segundo teoria desenvolvida pelo antropólogo francês Pierre Verger
A rainha-mãe teria sido enviada ao país com dezenas de suas criadas, o que coincide com descrições do grupo que fundou o templo
VODUNS
O Maranhão é o único lugar das Américas onde se encontraram cultos às divindades ancestrais da realeza do Daomé.
O nome africano da Casa das Minas é Querebentã de Zomadonu, o que significa algo como “Casa grande de Zomadonu”, em referência ao vodum protetor da fundadora Maria Jesuína.
Influência na religião
A Casa das Minas é apontada como o primeiro templo de tambor de mina no Maranhão
Também foi um dos primeiros centros religiosos de matriz africana no Brasil. Embora não tenha casas filiadas, serviu de modelo para outras no Norte e Nordeste do país
TAMBOR DE MINA
Assim como outras religiões afro-brasileiras, o tambor de mina tem como característica o estado de transe ou possessão assumido pelas vodunsis, que incorporam divindades durante o culto.
Outro importante terreiro maranhense, contemporâneo da Casa de Minas, é a Casa de Nagô. Ambas foram tombadas pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Fonte: CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. A Casa das Minas de São Luís do Maranhão e a saga de Nã Agontimé. Sociologia & Antropologia, v. 9, n. 2, p. 387-429, 2019.
Produzido por Lucas Gomes
Texto por Fredy Alexandrakis
Design e ilustrações por Lucas Gomes
Desenvolvimento por Caroline Souza
Edição por Gabriel Zanlorenssi
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