Expresso

A ômicron tem uma nova versão: por que ela preocupa

Estêvão Bertoni

31 de janeiro de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h19)

Sublinhagem da variante já responde pela maioria dos novos casos de covid-19 em países como Dinamarca e Índia, mas sintomas não têm sido mais graves

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FOTO: ANUSHREE FADNAVIS/REUTERS – 14.JAN.2022

Imagem mostra uma mulher com a máscara no queixo e a cabeça curvada para trás, tendo um cotonete colocado no nariz por um funcionário de macacão azul, luva de borracha, máscara e touca, que está atrás de um vidro e passou o braço por um buraco.

Mulher faz teste de covid-19 em hospital de Nova Delhi, na Índia


A propagação da ômicron, acompanhada de uma explosão de casos de covid-19 pelo mundo em poucas semanas, tem sido classificada por cientistas como a mais rápida de um vírus na história. Em alguns países, o quadro tem sido mais preocupante por causa do avanço de uma sublinhagem da variante , a BA.2, ainda mais transmissível. Sua evolução tem sido monitorada pelos riscos de poder tornar a onda da doença mais duradoura do que o previsto inicialmente. Em países como Dinamarca e Índia, ela já responde pela maioria das novas infecções.

A ômicron é uma família do novo coronavírus que se divide em três ramos: BA.1, BA.2 e BA.3. Todas essas sublinhagens vêm de um ancestral comum e compartilham de algumas mutações, mas não de todas. Dados de pesquisas feitas na Dinamarca apontam que a BA.2 pode ser uma vez e meia mais contagiosa do que a BA.1, que predomina no mundo atualmente. A BA.3 é considerada mais rara. Apesar disso, cientistas vêm ressaltando que as vacinas funcionam contra a sublinhagem e que ela não causa sintomas mais graves.

A seguir, o Nexo mostra como o subtipo BA.2, chamado também de “ômicron furtiva” pelos cientistas, tem se espalhado por algumas regiões do mundo e o que já se sabe sobre suas características.

O crescimento do subtipo

A ômicron foi descoberta no final de novembro de 2021, na África do Sul, e causou preocupação imediata na comunidade científica por trazer mais de 50 mutações, a maioria delas na proteína que reveste o vírus (chamada de Spike ou S, devido ao formato de “espinhos”) e que é usada por ele para se agarrar às células humanas e invadi-las. Em 26 de novembro de 2021, a nova cepa foi classificada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como uma “variante preocupante”.

As mutações acontecem o tempo todo devido a erros que ocorrem durante a replicação do vírus no organismo. Quanto mais ele circula descontroladamente entre as pessoas, mais esses erros acontecem. Ocasionalmente, algumas dessas mutações podem trazer vantagens evolutivas que tornam o vírus mais competitivo. Foi o que aconteceu com a ômicron, mais transmissível do que o vírus original descoberto no final de 2019 na cidade de Wuhan, na China.

O surgimento de sublinhagens, grupos de variantes com o mesmo ancestral, também é comum. A delta, por exemplo, predominante até o aparecimento da ômicron, chegou a ter mais de 200 sublinhagens . Até o final de janeiro, três ramos da ômicron tinham sido identificados, mas cientistas acreditam que outros devam surgir com o tempo.

Até 25 de janeiro de 2022, a BA.1 respondia por 98,8% de todas as amostras sequenciadas do coronavírus no mundo. O que preocupa os especialistas é que muitos países vêm registrando um rápido aumento de casos da BA.2, que é mais difícil de ser identificada — por isso seu apelido de “ômicron furtiva”.

Isso acontece porque, ao contrário da BA.1, que tem uma mutação facilmente identificada nos testes RT-PCR, a BA.2 não possui a mesma alteração em sua estrutura. Assim, é preciso fazer o sequenciamento genético para identificá-la (o exame PCR, considerado padrão-ouro, consegue identificar a doença, mas não distingue a BA.2 das demais). Atualmente, a BA.2 já foi registrada em mais de 50 países .

Cientistas não sabem dizer onde ela surgiu, mas seu primeiro sequenciamento ocorreu ainda em novembro de 2021, nas Filipinas. Os países que mais registraram a variante até o final de janeiro foram Dinamarca, Índia, Suécia e Cingapura, o que pode estar relacionado à maior vigilância genômica realizada nesses lugares.

Apesar do predomínio da BA.1, pesquisas britânicas vêm apontando um crescimento mais rápido da BA.2 no Reino Unido em comparação com a sublinhagem anterior. Na quinta-feira (27), um relatório na Dinamarca apontou que 65% dos novos casos de infecção já eram causados pela BA.2. No mesmo dia, o Centro Nacional de Controle de Doenças da Índia divulgou que o novo subtipo já era predominante no país.

As características da linhagem

Autoridades do Instituto Statens Serum, ligado ao Ministério da Saúde da Dinamarca, estimaram que a BA.2 era uma vez e meia mais contagiosa que sua “irmã” BA.1 (que, por sua vez, já era muito mais transmissível que todas as outras variantes anteriores). Já outro estudo divulgado na segunda-feira (31), com base na análise dos dados de 8.500 casas na Dinamarca entre dezembro e janeiro, aponta que uma pessoa exposta ao subtipo BA.1 dentro de casa tem 29% de chances de ser infectado em até sete dias. No caso da BA.2, essa probabilidade sobe para 39%.

Além disso, a sublinhagem também consegue escapar da proteção das vacinas. A BA.2 tem cerca de 20 mutações na proteína S, que é o alvo da maioria dos imunizantes. O da Pfizer, por exemplo, contém em sua formulação o material genético (RNA mensageiro) do coronavírus que, uma vez no organismo, induz as células humanas a produzir a proteína Spike. Ao reconhecer a proteína, o sistema imune produz anticorpos para bloqueá-la (o que impediria a entrada do vírus nas células). Mas, como a Spike da BA.2 tem várias mutações, os anticorpos têm mais dificuldades para identificá-la.

Um relatório da Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido divulgado em 27 de janeiro mostrou que as vacinas continuam eficazes contra as sublinhagens da ômicron, mas, para isso, é necessária a terceira dose. Duas semanas depois da aplicação da dose de reforço, a eficácia foi de 63% contra a BA.1 e de 70% contra a BA.2.

Pesquisadores, porém, ainda não sabem responder se a infecção prévia causada pela BA.1 garante imunidade contra a BA.2. Muitas regiões da Dinamarca onde houve um aumento de casos pela primeira subvariante também estão registrando alta de casos pela segunda sublinhagem, o que intriga os cientistas.

Até o final de janeiro, não havia indícios de que a BA.2 cause quadros mais graves de infecção que a BA.1. A ômicron ataca principalmente as vias aéreas superiores (nariz e garganta) e leva a menos casos de pneumonia, motivo pelo qual o número de mortes pela variante não tem acompanhado o crescimento das infecções no mesmo ritmo.

Os riscos da BA.2

Para especialistas, existe o risco de a sublinhagem prolongar a onda da doença, por ser mais transmissível, como indicam os estudos. Em boa parte dos países, a ômicron tem levado a uma explosão de casos num período de quatro a seis semanas, até atingir um pico e começar a cair rapidamente. Com a sublinhagem mais contagiosa se tornando predominante, essa queda pode perder força, fazendo com que a onda se arraste por mais tempo.

Em entrevista ao jornal americano The New York Times , no domingo (30), o virologista Thomas Peacock, do Imperial College de Londres, afirmou que a consequência da BA.2 pode ser um pico ainda maior de casos onde o ápice da doença ainda não ocorreu. “E uma desaceleração na tendência decrescente [de casos] em lugares que já passaram pelo pico da ômicron”, disse.

Para os pesquisadores, o aparecimento de uma versão mais contagiosa não é surpresa — outras virão, dizem. “Eu ficaria muito surpresa, no atual estado de imunidade da população global, se não não víssemos novas variantes surgirem”, afirmou a virologista Angela Rasmussen, da Universidade de Saskatchewan, no Canadá, em entrevista à TV americana CNN na sexta-feira (28).

Dados do Our World in Data, ligado à Universidade de Oxford, mostram que até o final de janeiro 39% da população mundial ainda não havia recebido nenhuma dose da vacina. Apenas 10% da população dos países de baixa renda tomaram a primeira dose.

Ao jornal britânico The Guardian, o professor Seshadri Vasan, pesquisador de vacinas da Organização de Pesquisa Científica e Industrial da Commonwealth, na Austrália, ressaltou que a BA.2 não deve causar pânico por não haver evidências de maior severidade, embora os dados indiquem que ela se espalhe mais. “É importante manter a calma e continuar com medidas como se vacinar, inclusive com a dose de reforço, com o distanciamento social, máscaras e diretrizes locais”, afirmou na segunda-feira (31).

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