Como o desmatamento de florestas afeta o regime de chuvas
Lucas Zacari
12 de março de 2023(atualizado 28/12/2023 às 17h19)Estudo quantificou a relação entre a redução da área florestal da Amazônia, do Congo e do sudeste asiático e a diminuição da pluviosidade
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Imagem de drone mostra desmatamento em Uruará, no Pará
Pesquisadores da Universidade de Leeds, no Reino Unido, quantificaram a relação entre áreas de desmatamento em florestas tropicais e a redução de chuvas. O estudo, publicado em 1º de março na revista Nature , foi o primeiro a analisar essa relação em larga escala, sendo que outras pesquisas sobre o tema focaram apenas casos específicos.
A análise das chuvas em relação à cobertura florestal foi feita a partir de dados da Amazônia , do Congo e do sudeste asiático. Por característica, as florestas tropicais têm uma alta precipitação, regulando e influenciando o ciclo hidrológico local e regional. O estudo mostra, contudo, que a rápida diminuição da cobertura vegetal interfere no índice pluviométrico e gera prejuízos para a fauna e flora.
Neste texto, o Nexo mostra como o estudo foi feito e quais as conclusões apresentadas, além de explicar os efeitos da diminuição da pluviosidade em florestas tropicais.
A partir de dados de satélite sobre o desmatamento na Amazônia, no Congo e no sudeste asiático entre 2003 e 2017, os pesquisadores levantaram a quantidade de chuva nas áreas desmatadas, mensuradas por satélites, estações meteorológicas e de reanálise (conjunto de informações obtidas a partir de modelos globais).
Além disso, o estudo comparou a taxa de precipitação da região desmatada com áreas vizinhas de mesmo clima e com maior cobertura vegetal. Essa escolha foi feita, segundo os autores, para que a única variável em relação à precipitação fosse a região desmatada.
A influência do desmatamento no índice pluviométrico médio anual também foi analisada em diferentes escalas espaciais. Foram estudadas regiões desmatadas com área aproximada entre 25 km² e 40 mil km².
De acordo com os dados de satélite, todas as áreas desmatadas tiveram diminuição na taxa de precipitação anual. A partir de áreas maiores que 2.500 km², no entanto, o desmatamento tem uma influência maior.
O sudeste asiático apresentou a maior redução no acumulado de chuva: entre 0,48mm e 0,36mm mensal por ponto percentual de perda florestal. Segundo o estudo, os dados contrariam a sugestão apresentada por outros cientistas de que a proximidade com o oceano e a substituição da floresta tropical por plantações não teria gerado um impacto tão elevado na precipitação dessa região.
Os pesquisadores também analisaram as estações de seca, chuva e de transição nas florestas tropicais. Com exceção do período de seca da Amazônia, que registrou aumento da precipitação, todas as outras estações em todos os locais analisados registraram redução no volume de chuva.
Além de analisar o presente das florestas tropicais, a pesquisa também apresentou previsões pluviométricas. Com base no prognóstico de um grande desmatamento até 2100, a pesquisa estima que a Floresta do Congo será a mais afetada entre as florestas tropicais. Com risco de perder cerca de 40% da cobertura florestal atual, a precipitação média pode cair, por mês, entre 6,2mm e 16,5mm, o que resultaria em uma redução de 8% a 10% da taxa de precipitação local.
A falta de chuvas nas florestas tropicais por conta do desmatamento cria um ciclo vicioso: ela promove mais perda florestal, interferindo no processo de evapotranspiração. Realizado pelas árvores, este processo é responsável por retirar a água do solo e devolvê-la para a atmosfera em forma de vapor, por meio da transpiração das folhas.
Cientistas apontam que a evapotranspiração é responsável por até 41% da precipitação média na Amazônia e até 50% no Congo. Quanto maior a derrubada da floresta, menos árvores fazendo transpiração e, consequentemente, menos chuvas acontecem na região.
“As florestas tropicais desempenham um papel crítico no ciclo hidrológico, ajudando a manter os padrões de chuva locais e regionais. (…) As próprias florestas tropicais dependem da umidade para sobreviver e as áreas remanescentes serão afetadas por um clima mais seco”, afirmou Callum Smith, principal autor do estudo, em comunicado da Universidade de Leeds .
Smith também reforça a necessidade de impedir o desmatamento e manter os índices pluviométricos para que a fauna, a flora e os moradores locais não sofram as consequências desse processo. “A redução das chuvas causada pelo desmatamento tropical afetará as pessoas que vivem nas proximidades por meio do aumento da escassez de água e da diminuição do rendimento das colheitas”, disse o pesquisador.
Com o desmate acelerado das florestas tropicais e a consequente diminuição das taxas de precipitação, o rendimento das colheitas teria uma queda de 1,25% a cada 10 pontos percentuais perdidos de cobertura florestal. Segundo o estudo, a falta de chuvas na área remanescente também geraria impactos e ameaças à vivência das espécies locais, diminuição da captura de carbono da atmosfera e aumento no número de incêndios na região .
O desmatamento afetaria a própria sazonalidade: os pesquisadores apontam que a alteração na precipitação poderia trazer mais chuvas durante o período de seca — o que já está acontecendo na Amazônia, segundo o próprio estudo —, alargando a estação com menor índice pluviométrico.
Para que as consequências não cheguem a níveis extremos, o professor e supervisor da pesquisa, Dominick Spracklen, ressaltou à Universidade de Leeds algumas formas de mitigar a queda nos índices pluviométricos: “embora existam esforços para deter o desmatamento, a perda de cobertura florestal nos trópicos continua. É preciso renovar os esforços para impedir a perda de florestas e regenerar áreas perdidas e degradadas”.
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