Expresso

Por que cientistas ainda não acham que estamos no antropoceno

Pedro Bardini

08 de março de 2024(atualizado 08/03/2024 às 21h16)

Comitê da União Internacional determinou que, pelo menos por ora, indícios mostram que ainda estamos holoceno. Nada impede que interpretação seja alterada no futuro

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FOTO: Athit Perawongmetha/REUTERSCidade de Bangkok na Tailândia com extrema poluição no ar

Cidade de Bankok na Tailândia com altos níveis de poluição ao amanhecer

O comitê da União Internacional de Ciências Geológicas organizou uma votação para decidir se o antropoceno pode ser aceito como época geológica. O resultado foi divulgado na terça-feira (5) e concluiu, por 12 votos a 4, que ainda não.

O conceito se refere ao protagonismo da ação humana nas mudanças ambientais terrestres. Desde 2009, os cientistas avaliam as possibilidades de oficializar o antropoceno como a época atual. Ela daria fim ao holoceno, que marca o último período da era glacial, 11 mil anos atrás.

As bases do antropoceno

Épocas são as divisões dos períodos geológicos que, junto com as eras e os éons, dividem o tempo de formação do planeta. A época atual, do holoceno, é caracterizada principalmente pelo clima terrestre, que garantiu o desenvolvimento da raça humana.

A União Internacional de Ciências Geológicas é responsável por avaliar as épocas terrestres. Para o órgão, é necessário que a data de início de uma época, bem como suas características, apresentem padrões globais comuns para expressar a história de determinado tempo.

A ideia do antropoceno foi formulada nos anos 2000, pelo químico holandês e vencedor do Prêmio Nobel, Paul Crutzen. Desde então, cientistas do Grupo de Trabalho do Antropoceno vêm procurando por evidências que possam oficializar a época do antropoceno.

Em 2023, o coletivo escolheu o lago Crawford, em Ontário, para dar início à época marcada pela ação humana. Os sedimentos do lago preservaram registros detalhados das mudanças geoquímicas ao longo do tempo.

As análises do solo do lago apontaram o ano de 1952 como o início do antropoceno. O grupo concordou com a data, pois ela também representa o crescimento econômico, energético e urbano pós-guerra, além da ameaça nuclear em escala mundial decorrente da Guerra-Fria.

Segundo os cientistas, ações como erosões ocasionadas por processos de urbanização e da prática agressiva da agricultura, alterações na composição química da atmosfera, aquecimento global e extinção de animais por causa do ser humano são características do antropoceno.

FOTO: Pascal Rossignol/REUTERSErosão na Normandia

Comparação do penhasco de Cap Fagnet na Normandia antes e depois de erosões devido às mudanças climáticas

Por que as propostas foram recusadas

Para ser oficializado como época geológica, o antropoceno teria que ser aprovado por 60% de cada um dos três comitês dirigentes da União Internacional de Ciências Geológicas. A votação divulgada na terça-feira (5) impediu o avanço da oficialização.

Os membros do primeiro comitê dirigente concluíram que 1952 é um ano muito limitado e pouco objetivo para determinar um intervalo de tempo terrestre entre o holoceno e o antropoceno.

Segundo o comitê, os impactos da humanidade no planeta ocorrem há muito mais tempo e, por isso, é difícil apontar uma única data de início para o mundo todo.

Erle C. Ellis, cientista ambiental da Universidade de Maryland, comentou o resultado em entrevista ao jornal The New York Times. “Essa era uma questão restrita e técnica para os geólogos, em sua maior parte, não tem nada a ver com a evidência de que as pessoas estão mudando o planeta”.

Segundo Ellis, o antropoceno foi recusado como época pelo comitê porque, “ao vincular o início da ‘era humana’ a um evento tão recente e devastador — a precipitação nuclear —, essa proposta corria o risco de implantar confusão sobre a história profunda de como os seres humanos estão transformando a Terra, desde as mudanças climáticas e as perdas de biodiversidade até a poluição por plásticos e o desmatamento tropical”, que são práticas anteriores ao século 20.

As evidências científicas demonstram que os seres humanos vêm cada vez mais moldando o futuro do planeta. Por isso, alguns pesquisadores preferem chamar o antropoceno de evento — termo geológico mais vago que “época” — e seu uso não precisa ser aprovado pelos comitês.

O resultado divulgado na terça-feira (5) não impede que o antropoceno venha a ser aceito como época geológica em futuras votações. Jan A. Piotrowski, geólogo e membro do comitê da União Internacional, disse ao New York Times que “nosso impacto veio para ficar e para ser reconhecido no futuro do registro geológico”. Para Piotrowski, caberá aos próximos membros da União decidirem quando decretar o antropoceno.

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