No início deste ano, o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, destacou a urgência de promover a participação plena e igualitária das mulheres em todos os setores da sociedade: no ritmo atual, a igualdade legal entre homens e mulheres pode levar até 300 anos para ser plenamente alcançada.
Apesar dos avanços consideráveis nos últimos anos, barreiras estruturais continuam a limitar as oportunidades econômicas das mulheres. Essas limitações se refletem em desvantagens salariais, poucas perspectivas de avanço na carreira e baixa representação em cargos de liderança. O relatório mais recente do Banco Mundial, “Mulheres, Empresas e o Direito 2024”, revela que a disparidade global de gênero no ambiente de trabalho é ainda maior do que se pensava. As mulheres têm apenas dois terços dos direitos legais concedidos aos homens, e nenhuma das 190 economias analisadas oferece oportunidades iguais para elas.
Atualmente, somente a metade das mulheres no mundo participa da força de trabalho, em contraste com três quartos dos homens. Esse número evidencia a necessidade urgente de focar nas áreas que requerem maior atenção e investimento para reduzir a desigualdade de gênero e impulsionar a participação socioeconômica das mulheres. Em muitos países, as mulheres são tidas como as principais cuidadoras de suas famílias e são mais propensas a ficar em casa, trabalhar meio período ou interromper a carreira para prestar cuidados – não apenas aos filhos, mas também a pais, familiares, idosos e pessoas com deficiências.
O acesso a cuidados infantis acessíveis é um componente chave para melhorar a inclusão feminina no mercado de trabalho. A falta de uma rede de apoio – familiar, social e institucional – é um dos grandes desafios para as mães trabalhadoras. A ausência de uma licença parental adequada e políticas públicas que incentivem os homens a compartilhar responsabilidades de cuidado com os filhos contribuem para um cenário em que as mulheres continuam sobrecarregadas tanto em casa quanto no trabalho.
Investir na redução da desigualdade de gênero não é apenas uma questão ética, mas também uma decisão inteligente do ponto de vista econômico
Reduzir a disparidade de gênero no emprego e no empreendedorismo, incluindo o aumento do acesso a serviços de cuidado infantil de qualidade, poderia aumentar o produto interno bruto global em mais de 20%. Fechar a brecha de gênero ao longo da próxima década praticamente dobraria a atual taxa de crescimento global. Isso demonstra que investir nessa temática não é apenas uma questão ética, mas também uma decisão inteligente do ponto de vista econômico.
A desigualdade de gênero no âmbito do trabalho vai além das questões frequentemente discutidas, e igualmente importantes, como a igualdade salarial, a proibição da discriminação com base no gênero e o assédio no ambiente de trabalho. Os desafios se apresentam antes mesmo de as mulheres estarem inseridas no mercado de trabalho. Especialistas destacam que a dependência econômica contribui para que as mulheres estejam mais vulneráveis à violência doméstica. Dados do Atlas da Violência apontam que, em 2022, a violência doméstica representou 65,2% dos casos registrados de violência contra mulheres no Brasil. Embora a Lei Maria da Penha seja um marco no combate à violência de gênero, o Brasil ainda enfrenta desafios nesta esfera, com lacunas na proteção contra o assédio sexual em locais públicos e o casamento infantil.
Para avançar rumo à igualdade de gênero e garantir a plena participação econômica das mulheres, é essencial superar barreiras legais e adotar um ambiente jurídico favorável. Isso envolve não apenas a criação de leis adequadas, mas também a implementação de políticas públicas eficazes, como planos de ação e orçamentos sensíveis ao gênero, além da coleta de dados desagregados por sexo. Além disso, promover a presença feminina em cargos de liderança e tomada de decisões, tanto no setor privado quanto na esfera pública, é crucial para melhorar a governança e implementar políticas mais inclusivas.
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Por fim, iniciativas de educação e sensibilização são essenciais para transformar as percepções e comportamentos que perpetuam a desigualdade de gênero, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.
É urgente que a melhoria das oportunidades econômicas para as mulheres – dentro e fora do mercado de trabalho – seja uma prioridade na agenda global para construir um futuro mais próspero e sustentável. Para acelerar esses esforços, é essencial que governo, setor privado, sociedade civil e todos os cidadãos atuem em conjunto para promover as mudanças necessárias. Quando mais mulheres trabalham e participam na economia, todos se beneficiam, especialmente em tempos de crescimento econômico lento.
Natalia Mazoni é advogada especialista em Gênero e Desenvolvimento do Banco Mundial.