A economia brasileira enfrenta um ambiente desafiador, marcado por persistência inflacionária, incertezas fiscais e juros elevados. Esses fatores, aliados à conjuntura internacional, têm impactado o crescimento econômico brasileiro e as perspectivas a respeito da sua estabilidade econômica. Neste cenário, torna-se essencial compreender os desafios e oportunidades que moldarão o crescimento ao longo dos próximos meses e a redução da pobreza no país.
A inflação segue persistente, sobretudo dos alimentos, que têm registrado variação de cerca de 1% ao mês. Além disso, o índice de difusão mostra uma alta disseminação dos reajustes de preços em quase todos os setores. A desvalorização do dólar e choques climáticos devem continuar pressionando a inflação de alimentos de atacado e varejo.
O Boletim Focus mais recente projeta encerrar 2025 com a taxa Selic em 15% ao ano. A atual gestão da autoridade monetária enfrenta o desafio de manter a credibilidade da política monetária que, ao que se prevê, será bastante restritiva, em um contexto de inflação acima da meta. Embora as expectativas inflacionárias continuem desancoradas, a curva de juros apresenta uma redução dos prêmios de risco, abaixo de 15%, refletindo uma menor percepção de incerteza em relação ao futuro da política monetária. No entanto, a curva de juros depende, ainda, do comportamento das treasuries americanas, que devem se manter nesse patamar até que o governo Trump defina de que forma fará seu ajuste fiscal.
Este ano tem se apresentado como um teste crucial para a capacidade do Brasil em equilibrar crescimento econômico, controle inflacionário e sustentabilidade fiscal
A atividade econômica tem mostrado desaceleração na indústria e nos serviços, mesmo com impulso dos gastos do governo. O PIB (Produto Interno Bruto)) enfrenta uma pressão negativa, com as projeções apontando para uma desaceleração ao longo do ano, principalmente devido à intensificação dos efeitos da política monetária restritiva.
Na área fiscal, o governo conseguiu cumprir a meta de resultado primário em 2024, registrando um déficit de R$ 11 bilhões, equivalente a 0,1% do PIB. No entanto, há grandes preocupações com o impacto da elevação das despesas com juros sobre a trajetória da relação dívida/PIB, que já está elevada. Ainda que em janeiro de 2025 a relação dívida bruta/PIB tenha alcançado 75,3%, um recuo de 0,8 pp em relação a dezembro de 2024 e que a relação dívida líquida/PIB tenha finalizado janeiro em 60,8% ante 61,17% de dezembro, falta a percepção de que há um compromisso fiscal mais sólido, o que gera desconfiança no mercado, elevando o risco país e pressionando a curva de juros. Além disso, mesmo com a manutenção do arcabouço fiscal implantado em 2023 e sem nenhum fato novo associado a ele, o real foi uma das moedas que mais se valorizou em janeiro de 2025.
A economia brasileira também sofre influência das incertezas globais, incluindo as políticas tarifárias do governo dos Estados Unidos e a volatilidade dos juros americanos. A imposição de políticas tarifárias protecionistas pelo governo Trump pressionam os custos de importação, afetando a indústria nacional e contribuindo para uma maior pressão inflacionária nos EUA. Essa situação — associada à política econômica do governo Trump de adicionar um novo vetor de incerteza global, com a imposição de tarifas e impactos geopolíticos — pode influenciar a diretriz da política monetária do Fed, o banco central americano.
Outro fator relevante é a supersafra de grãos que estamos transportando neste período, que impulsionou a demanda por transporte rodoviário e, consequentemente, resultou em um aumento significativo nos preços dos fretes, que chegaram a dobrar em algumas regiões. Esse evento adiciona pressão aos custos logísticos e pode impactar a formação de preços de diversos produtos.
Outro ponto de pressão é a implantação da reforma tributária que, embora seja essencial para simplificar o sistema tributário e para aumentar a competitividade do Brasil, ainda enfrenta resistências significativas de setores que se sentem prejudicados. Assim, há uma relevante pressão para que o Governo mantenha benefícios a algumas atividades econômicas que não, necessariamente, trazem resultados efetivos ao desenvolvimento do país. O equilíbrio entre os interesses do setor produtivo e a sustentabilidade das contas públicas será fundamental para o sucesso da reforma.
Além disso, a combinação de juros elevados com um cenário fiscal frágil levanta preocupações sobre um possível efeito de dominância fiscal, em que a política monetária perde eficácia devido à necessidade crescente de rolagem da dívida pública. Esse risco deve ser monitorado de perto, especialmente diante do aumento da percepção de incerteza dos investidores globais.
Do ponto de vista das empresas, a manutenção de juros elevados representa um desafio significativo, especialmente para aquelas mais alavancadas. O custo do capital elevado pode limitar investimentos em expansão e inovação, ao mesmo tempo em que reduz as margens de lucro e piora as condições de renegociações de dívidas. Já para os investidores, o cenário reforça a preferência por ativos de renda fixa e exige cautela nas decisões em mercados de renda variável, sobretudo em função das incertezas fiscais, volatilidade cambial e endividamento das empresas.
Os três aspectos domésticos brasileiros mencionados, inflação, taxa de juros e situação fiscal, devem ser afetados pela forma como os investidores globais se postarão em relação à percepção do risco, sobretudo por conta da estratégia da Casa Branca em relação à política econômica doméstica, à guerra comercial e aos desafios geopolíticos. O risco de uma recessão americana, impulsionado por taxas de juros mais elevadas e um menor dinamismo econômico global, pode ter efeitos indiretos na economia brasileira, reduzindo a demanda externa por exportações e impactando negativamente a balança comercial. Além disso, a volatilidade cambial pode dificultar ainda mais o cenário para países emergentes, incluindo o Brasil, ao elevar os custos de financiamento externo e pressionar a taxa de câmbio.
Este ano tem se apresentado como um teste crucial para a capacidade do Brasil em equilibrar crescimento econômico, controle inflacionário e sustentabilidade fiscal. A economia brasileira tem potencial para avançar, mas isso dependerá de medidas que fortaleçam a confiança dos agentes econômicos e promovam um ambiente favorável ao investimento. O compromisso com reformas estruturais, a previsibilidade na política econômica e a responsabilidade fiscal serão determinantes para garantir a estabilidade e o crescimento sustentável do Brasil nos próximos anos.
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Renata Moura Sena é economista, especialista em infraestrutura de transportes e logística. Atua como Especialista em Infraestrutura e professora na PUC-SP, lecionando disciplinas de economia. Pesquisa temas relacionados a transportes, economia comportamental e desenvolvimento sustentável.