Agricultura urbana faz a diferença em tempos de pandemia

Debate

Agricultura urbana faz a diferença em tempos de pandemia
Foto: Rahel Patrasso/Reuters

Jaqueline Ferreira, Marcela Alonso Ferreira e Vitória Leão


28 de maio de 2020

Na crise do novo coronavírus, os circuitos curtos de comercialização têm demonstrado sua importância na garantia da renda dos agricultores e no fornecimento de alimentos para as cidades

As mudanças no setor de alimentos em decorrência dos impactos das medidas de distanciamento social necessárias à contenção da pandemia do novo coronavírus têm sido assunto recorrente nos últimos dias. Se, no início da quarentena, os bairros centrais das cidades assistiram à corrida para os supermercados com filas e prateleiras esvaziadas, por outro lado, nas periferias o desafio tem sido garantir a manutenção das refeições diárias. De uma forma ou de outra, a quarentena nos convida a repensar o nosso consumo alimentar, de onde vem o que comemos, como é produzido e como o acessamos.

O Instituto Escolhas e Urbem desenvolvem um estudo sobre a agricultura na Região Metropolitana de São Paulo. Segundo análise da pesquisa ainda em desenvolvimento, 13% da população ocupada trabalha em atividades diretamente relacionadas à alimentação e, em média, 39% do gasto alimentar dos paulistanos é feito em refeições fora de casa. Diante do atual contexto, ainda que os sistemas de entrega estejam operando intensamente, os hábitos alimentares tiveram que ser modificados, forçando os paulistanos a comerem em casa.

Neste cenário complexo, um elo essencial da cadeia de alimentos, os agricultores, muitas vezes invisíveis ou desconhecidos para a maioria dos consumidores, também vivenciam mudanças causadas pela pandemia de coronavírus. O impacto para quem produz alimentos está associado a diversos fatores, mas as formas de escoamento da produção, isto é, as vias de acesso entre produtor e consumidor, têm especial peso para quem depende da produção no campo. Com o fechamento de restaurantes, a queda na procura por produtos frescos e perecíveis, a diminuição das compras públicas e a redução das feiras livres, muitos produtores que escoam sua produção para São Paulo têm enfrentado situações adversas como o desperdício de alimentos decorrente da queda nas vendas.

Por outro lado, para os agricultores urbanos, que acessam os chamados circuitos curtos de comercialização, o cenário é distinto: a demanda por seus produtos se intensificou. Caracterizados pela proximidade entre consumidor e produtor, reduzindo ao mínimo o número de intermediários no mercado de alimentos — como as feiras orgânicas e de produtores, os grupos de consumo responsável e algumas modalidades de compras públicas —, os circuitos curtos (re)valorizam a produção local e as relações de solidariedade.

Dona Terezinha Matos, moradora e agricultora do bairro de São Mateus, zona Leste da capital paulista, comenta que a demanda por seus produtos cresceu em 30% desde a notificação da pandemia no estado. Integrante da AAZL (Associação dos Agricultores da Zona Leste), Terezinha cultiva mais de 50 tipos de produtos orgânicos, entre verduras, legumes e algumas frutas debaixo dos linhões de energia na região leste da periferia paulista. E não está sozinha: quem percorre a cidade de São Paulo e seu vasto território poderá se surpreender com a produção de alimentos nos limites do município. Segundo dados do Censo Agropecuário de 2017 analisados pelo estudo, há 550 estabelecimentos agropecuários na cidade, sendo cerca de 250 deles localizados dentro da zona urbana do município.

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