Como presidentes agiram na economia em ano de reeleição
Marcelo Roubicek
20 de março de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h43)Bolsonaro anunciou pacote com medidas de estímulo, mas analistas apontam que efeitos devem ser pouco expressivos. Presidente é o quarto a tentar reeleição desde a redemocratização
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Jair Bolsonaro em evento no Palácio do Planalto
O presidente Jair Bolsonaro anunciou na quinta-feira (17) um pacote de medidas de estímulo econômico para 2022, ano em que vai tentar a reeleição. As ações incluem liberação de saques do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e antecipação do pagamento do 13° do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
As medidas de Bolsonaro buscam impulsionar a economia brasileira em um momento de crise, com inflação alta , juros elevados , renda em baixa e pouca tração da atividade econômica. Horas antes do anúncio do pacote, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia piorou suas projeções oficiais para a atividade econômica e a inflação no Brasil em 2022 – a expectativa do governo é de crescimento de 1,5% no ano. Entre agentes do mercado financeiro, a projeção é ainda menor, em torno de 0,5% .
Bolsonaro não é o primeiro presidente a tentar impulsionar a economia no ano em que tenta a reeleição. Neste texto, o Nexo detalha o pacote apresentado na quinta-feira (17) e relembra como Dilma Rousseff (2010 a 2016), Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2010) e Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) lidaram com a economia no final do primeiro mandato.
O pacote lançado por Bolsonaro foi batizado de Programa de Renda e Oportunidade. Entre as medidas anunciadas estão:
O governo divulgou o pacote como uma injeção de R$ 160 bilhões na economia brasileira. Embora as medidas possam ajudar os beneficiários – como quem irá sacar dinheiro do FGTS – analistas apontam que elas devem ter impacto reduzido . A avaliação é de que os estímulos não terão efeitos muito duradouros, e tendem a se dissipar em pouco tempo.
Além disso, boa parte do pacote não é composta por dinheiro “novo” ou medidas de transferências de renda. A antecipação do 13° do INSS, por exemplo, apenas significa que um dinheiro que entraria na economia no final do ano será injetado alguns meses antes, a partir de abril . Já os recursos de crédito, por mais que possam aliviar a situação num primeiro momento, terão de ser devolvidos no futuro.
O pacote se soma a outras medidas tomadas pelo governo Bolsonaro em 2022, como a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para a maioria dos bens manufaturados, assinada no final de fevereiro. No final de 2021, o governo também criou o auxílio-gás , voltado para ajudar na compra de botijões em meio à alta do preço.
A principal política adotada pelo governo federal para o ano eleitoral foi o Auxílio Brasil , que começou a ser pago em novembro de 2021. O programa, que é uma das bandeiras de Bolsonaro na busca pela reeleição, atende 17,2 milhões de famílias de baixa renda, pagando um valor mensal mínimo de R$ 400 . Para emplacar o Auxílio Brasil, o governo elaborou e articulou a aprovação da PEC dos Precatórios , que driblou regras fiscais para abrir espaço orçamentário de mais de R$ 100 bilhões em 2022.
Há ainda a possibilidade de que o governo federal intervenha sobre a Petrobras em meio à crise dos preços de combustíveis , que é impulsionada pela alta do petróleo no mercado internacional e pela guerra na Ucrânia. O presidente Jair Bolsonaro critica a política de preços da estatal (que acompanha o preço internacional do barril), mas tenta se distanciar de seus efeitos , dizendo nada ter a fazer. Enquanto isso, integrantes do governo põem pressão nos bastidores sobre o presidente da empresa de petróleo, o general da reserva Joaquim Silva e Luna.
As políticas adotadas por Bolsonaro são frequentemente apontadas por analistas como eleitoreiras – principalmente as que passam por cima de regras fiscais. Abaixo, o Nexo relembra como a economia foi tratada por presidentes no ano da reeleição – os três venceram o pleito.
CONTEXTO ECONÔMICO
O primeiro mandato de Dilma Rousseff foi marcado pela desaceleração do crescimento econômico brasileiro após o ritmo forte de alta registrado na década de 2000. Em 2014, ano da campanha de reeleição de Dilma, o ciclo de commodities que havia ajudado a impulsionar a economia brasileira entre o início da década de 2000 e o início da década de 2010 havia perdido força. Alguns economistas dizem que a Lava Jato, que investigou escândalos de corrupção na gestão pública e em estatais brasileiras, afetou a atividade econômica ao atingir a construção civil e a indústria. Além disso, as contas públicas estavam em deterioração – algo atribuído por boa parte dos economistas a erros de política econômica de Dilma. Ainda em 2014, o Brasil entrou em recessão .
PRINCIPAIS MEDIDAS
O governo expandiu gastos ao longo de todo o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Em 2014, ano da reeleição, a presidente manteve essa política expansionista como forma de encarar a desaceleração econômica. Um exemplo foi a extensão da política de desoneração da folha de pagamentos – algo de que Dilma depois disse ter se arrependido . Ela também reajustou os valores do Bolsa Família e prometeu corrigir a tabela do Imposto de Renda. Além disso, o governo implementou um represamento de preços de combustíveis e da energia elétrica . A ideia era segurar preços como forma de impedir um avanço inflacionário significativo no ano eleitoral. Na campanha presidencial, Dilma sustentou o discurso de que manteria no segundo mandato o gasto público orientado para o crescimento e desenvolvimento do país.
RESULTADOS
Após a reeleição, Dilma mudou o discurso e alterou a rota de políticas adotadas no final do primeiro mandato. Em 2015, ela liberou reajustes de combustíveis e da energia elétrica, o que levou a uma aceleração da inflação para 10,67% no ano – maior número em 13 anos. Além disso, na virada de 2014 para 2015, Dilma trocou o ministro da Fazenda: saiu Guido Mantega, que ocupara a pasta desde 2006, e entrou Joaquim Levy , defensor de uma política mais austera. No ano de estreia do segundo mandato de Dilma, Levy tentou, sem sucesso, emplacar um ajuste fiscal. Ao mesmo tempo que via a crise econômica se aprofundar e a situação fiscal piorar, Dilma perdeu apoio político no Congresso. A resistência de agentes do mercado financeiro ajudou a elevar a percepção de baixa credibilidade da política econômica. Ela sofreu impeachment em 2016 acusada de manobras fiscais, sendo sucedida pelo vice Michel Temer.
CONTEXTO ECONÔMICO
Lula assumiu o poder em 2003 sob desconfiança dos agentes do mercado. Investidores brasileiros e estrangeiros temiam que a política de um presidente alinhado à esquerda comprometesse a estabilidade econômica alcançada após o Plano Real . O momento foi de especulação e volatilidade. Em junho de 2002, Lula publicou a “ Carta ao Povo Brasileiro ”, se comprometendo a manter as bases econômicas do governo de Fernando Henrique Cardoso. Já no poder, Lula adotou políticas econômicas ortodoxas, como aumento de juros e redução da dívida pública . O país também se aproveitou do boom de commodities , aumentando as exportações. Entrando no ano eleitoral de 2006, o país tinha bons números de crescimento do PIB, inflação baixa e pobreza em queda, refletindo o avanço de políticas sociais, especialmente a partir do programa Bolsa Família e da expansão do valor do salário mínimo.
PRINCIPAIS MEDIDAS
Em 2005, um ano antes da disputa da reeleição, o governo do petista foi abalado pelo mensalão , um esquema de compra de apoio parlamentar. Mas a popularidade de Lula foi pouco afetada, e ele chegou em 2006 com forte aprovação. Sua principal medida na área econômica econômica no ano da reeleição foi a troca do ministro da Fazenda. Saiu Antonio Palocci – nome associado à gestão mais ortodoxa sob Lula – e entrou Guido Mantega . Num primeiro momento, Mantega não fez mudanças tão significativas na política econômica, apesar de já apontar para uma rota mais expansionista no segundo mandato, em caso de reeleição. Nesse ano, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) começou a ampliação de crédito a grandes empresas , sinalizando o início da política das “ campeãs nacionais ”.
RESULTADOS
Lula foi reeleito no segundo turno contra o tucano Geraldo Alckmin – que deve ser seu vice de chapa pelo PSB em 2022. De forma geral, o crescimento econômico foi mantido no segundo mandato, agora sob uma gestão menos austera e com maior participação do Estado. Nesse período, houve a descoberta do pré-sal , grandes reservas de petróleo no fundo do mar. Alguns economistas criticam a política econômica adotada por Lula no segundo mandato , considerada por eles excessivamente intervencionista. Houve expansão dos investimentos públicos , ampliação do papel do BNDES e aumento dos gastos sociais . Nesse período, o país também atravessou a crise mundial de 2008 . Para lidar com a grande recessão global, o governo de Lula apostou em incentivar a economia, com medidas como a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para automóveis e estímulo ao consumo das famílias . O país teve uma leve retração do PIB em 2009 , mas cresceu 7,5% em 2010.
CONTEXTO ECONÔMICO
Em 1994, foi implementado no Brasil o Plano Real , que controlou a hiperinflação que marcava o país desde a década anterior. Naquele mesmo ano, Fernando Henrique Cardoso, ministro da Fazenda creditado pelo sucesso do plano, foi eleito presidente. A política econômica de seu primeiro mandato teve como foco a manutenção dos pilares do Plano Real, e obteve sucesso em conter a inflação a níveis baixos. Além disso, o primeiro governo FHC foi marcado pela maior abertura econômica do país, pelas privatizações (como no setor de telecomunicações ) e pela quebra do monopólio da Petrobras sobre a exploração e o refino do petróleo. Em 1997, ano pré-eleitoral, foi revelado um esquema de compra de votos para aprovação na Câmara dos Deputados da emenda da reeleição. O texto, posteriormente aprovado no Senado, foi o que permitiu que FHC pudesse tentar se reeleger. O tucano sempre negou participação no esquema. Sob a gestão do então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, o Ministério Público não apresentou denúncia sobre o caso, e partidos de oposição não conseguiram avançar com uma CPI no Congresso.
PRINCIPAIS MEDIDAS
Um dos pilares do Plano Real era o uso do dólar como âncora. Com a preocupação de que choques no câmbio poderiam trazer de volta a inflação, o governo decidiu que R$ 1 valeria perto de US$ 1. Para evitar a perda do valor do real, o Banco Central agia no mercado oferecendo dólares ao preço definido, usando suas reservas internacionais nas vendas. Em 1998, ano da tentativa de reeleição de Fernando Henrique, crises na Ásia e na Rússia fizeram crescer a desconfiança de agentes sobre países em desenvolvimento, levando a fuga de mercados como o Brasil. Um dos resultados disso foi uma pressão pela desvalorização do real. Mas FHC decidiu adiar essa desvalorização até depois da eleição – para isso, promoveu corte de gastos e viu o Banco Central manter juros altos. Em setembro de 1998, pouco antes da eleição, os juros básicos foram a 49,75% ao ano .
RESULTADOS
Pouco após vencer as eleições contra Lula no primeiro turno, o governo de FHC promoveu a mudança na política cambial. No começo de 1999, depois de vender quase todas as suas reservas internacionais tentando controlar o valor do dólar, o Banco Central desistiu do regime de câmbio fixo. O país passou a adotar o chamado tripé macroeconômico , com as seguintes bases: câmbio flutuante, metas de superávit fiscal (saldo positivo na diferença entre arrecadação e gastos do governo) e regime de metas de inflação. Com o dólar livre para flutuar, o Banco Central passou a ter como principal instrumento de controle de inflação a taxa básica de juros. O governo Fernando Henrique Cardoso também recorreu a empréstimos do FMI (Fundo Monetário Internacional), sendo o primeiro deles semanas após a vitória eleitoral. O PIB acabou tendo baixo crescimento em 1998 e 1999, período de recessão no Brasil. Em meio à forte crise, o desemprego também subiu no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso – recuou depois, já sob Lula.
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