Expresso

As perguntas que movem estes 5 jovens cientistas brasileiros

Lucas Zacari

23 de julho de 2023(atualizado 28/12/2023 às 22h03)

Acadêmicos com projetos ‘ousados’ foram selecionados para receber bolsas do Instituto Serrapilheira e de fundações de amparo à pesquisa. Eles explicam ao ‘Nexo’ os estudos e suas aplicações práticas

O Nexo depende de você para financiar seu trabalho e seguir produzindo um jornalismo de qualidade, no qual se pode confiar.Conheça nossos planos de assinatura.Junte-se ao Nexo! Seu apoio é fundamental.

FOTO: REUTERS/NACHO DOCE/CALTECH-JPL/R. HURT/PIXABAY/GAB-RYSIA/UNSPLASH/STEPHEN PHILLIPS/WIKICOMMONS/WIKIMOL

Imagens representativas das pesquisas dos entrevistados. Montagem com imagens de árvores, de representação de ondas gravitacionais, joaninha em uma planta, e dois gráficos, todos coloridos com cores fortes.

Imagens representativas das pesquisas dos entrevistados

Em 28 de junho, o Instituto Serrapilheira, instituição privada sem fins lucrativos de fomento à ciência e à divulgação científica no Brasil, anunciou que irá financiar o trabalho de 32 jovens cientistas . Em parceria com fundações de amparo à pesquisa estaduais, as bolsas foram destinadas para “projetos de pesquisa ousados e arriscados”.

Ao todo, o grupo de pesquisadores receberá um financiamento de R$ 22 milhões para desenvolver suas pesquisas. Os projetos selecionados pela 6ª chamada pública do instituto, que é apoiador d a editoria Ponto Futuro , do Nexo , buscam responder questionamentos nas áreas de ciências naturais – física, química, geociências e ciências da vida –, matemática ou ciência da computação.

O Nexo conversou com cinco pesquisadores para entender, em cinco perguntas, quais as questões que eles pretendem responder nas pesquisas.

A Amazônia na era do gelo


  • Carlos D’Apolito é pesquisador do Centro de Ciências Biológicas e da Natureza da Universidade Federal do Acre

O que você quer responder com a sua pesquisa?

Carlos D’Apolito Queremos saber se, quando e por quanto tempo o sudoeste amazônico teve sua vegetação substituída por cerrado, florestas secas ou algum outro bioma não amazônico durante a última era do gelo.

Como você explica a sua pesquisa para alguém que não conhece nada dessa área de conhecimento?

Carlos D’Apolito Durante a última era do gelo, ou seja, 115 mil a 11 mil anos atrás, o clima do mundo mudou bastante. Na Amazônia, não houve gelo, mas pode ter havido momentos mais secos e frios. Será que então a floresta se retraiu e deu espaço a outras vegetações? Podemos responder a esta pergunta olhando fósseis de plantas e animais.

O que mais te fascina na pergunta que você quer responder?

Carlos D’Apolito Acho fascinante pensar que há 10 mil anos ou mais na nossa região havia uma fauna de animais enormes. Seria como um safari africano – parentes dos elefantes, preguiças-gigante, entre outros – e pensar que toda essa fauna deveria estar vivendo em uma paisagem diferente. Como era essa paisagem do ponto de vista da vegetação?

Qual seria um exemplo de uso dos resultados que você quer alcançar?

Carlos D’Apolito Vamos saber se a floresta amazônica foi resiliente às mudanças climáticas do passado, ou se ela respondeu alterando sua composição de alguma forma. Isso nos dá subsídios para entender como a diversidade surgiu e é mantida, além de apontar há quanto tempo a floresta existe, para assim planejarmos sua preservação.

Para você, qual a importância da pesquisa científica, no geral, para o desenvolvimento do país?

Carlos D’Apolito A pesquisa é o meio pelo qual construímos conhecimento. Novos problemas e questões surgem a todo tempo, portanto resolvê-los passa sempre por pesquisa científica. Algumas dessas questões são grandes e complexas e necessitam de financiamento para sua resolução.

Força atômica

  • Dyana Duarte é pesquisadora do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul

O que você quer responder com sua pesquisa?

Dyana Duarte Como descrever a matéria extremamente densa a partir de modelos efetivos capazes de satisfazer dados de ondas gravitacionais provenientes da fusão de estrelas de nêutrons que foram detectadas recentemente.

Como você explica sua pesquisa para alguém que não conhece nada dessa área de conhecimento?

Dyana Duarte Tudo na natureza é composto por átomos, cujos núcleos possuem prótons e nêutrons. Prótons tem carga positiva, logo, deveriam se repelir, mas se mantêm unidos por uma força muito intensa dentro desses núcleos. Entender essa força, como e por que ela funciona é uma das questões que buscamos entender.

O que mais te fascina na pergunta que você quer responder?

Dyana Duarte Nenhum dos vários modelos exitosos na descrição de experimentos como os de aceleradores de partículas foi capaz de explicar os dados observacionais obtidos da detecção de ondas gravitacionais. A teoria que descreve os dois processos é a mesma, a única diferença é a alta densidade no segundo caso.

Qual seria um exemplo de uso dos resultados que você quer alcançar?

Dyana Duarte Expandir nosso entendimento sobre a estrutura e a natureza da matéria que constitui o universo como um todo. Não buscamos especificamente a criação de novas tecnologias, apesar de ser comum nas ciências.

Para você, qual a importância da pesquisa científica, no geral, para o desenvolvimento do país?

Dyana Duarte A pesquisa em ciência de base gera ferramentas e conhecimento, e em ciências aplicadas resulta em progresso e novas tecnologias para saúde, educação, trabalho e lazer. Esses recursos são fundamentais para o desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida da sociedade, e devem ser prioridade no país.

A resistência das plantas


  • Marcelo Campos , pesquisador do Departamento de Botânica e Ecologia da Universidade Federal de Mato Grosso

O que você quer responder com a sua pesquisa?

Marcelo Campos Queremos entender como as plantas se tornaram resistentes à maioria dos insetos.

Como você explica a sua pesquisa para alguém que não conhece nada dessa área de conhecimento?

Marcelo Campos Existem mais de um milhão de espécies de insetos no planeta, e cerca de metade delas se alimenta de plantas. Porém, ao contrário do que podemos imaginar, a maioria das plantas é resistente à maioria dos insetos. Queremos entender as razões por trás dessa adaptação surpreendente.

O que mais te fascina na pergunta que você quer responder?

Marcelo Campos Devido à sua natureza séssil (imóvel), muitas vezes temos a falsa impressão de que as plantas são passivas e incapazes de se defender quando estão sendo atacadas por pragas e patógenos. A verdade é que o cenário é justamente o contrário: na batalha contra insetos são elas que estão vencendo!

Qual seria um exemplo de uso dos resultados que você quer alcançar?

Marcelo Campos Se conseguirmos identificar os mecanismos que conferem resistência de determinadas plantas a certos insetos poderemos transferi-los para espécies de uso agronômico. Isso reduziria o uso de agrotóxicos nas lavouras, aumentando a qualidade dos alimentos e reduzindo seu custo de produção.

Para você, qual a importância da pesquisa científica, no geral, para o desenvolvimento do país?

Marcelo Campos O Brasil possui uma economia sustentada por uma atividade que respira avanços científicos: o agronegócio. O país é um exemplo claro de que não há crescimento econômico e melhoria da qualidade de vida da população sem pesquisa científica. E essa realidade se tornou muito evidente durante a pandemia.

IA para prevenção de chuvas

  • Mariza Ferro é pesquisadora do Instituto de Computação da Universidade Federal Fluminense

O que você quer responder com a sua pesquisa?

Mariza Ferro Se é possível desenvolver modelos de inteligência artificial para prever chuvas intensas e evitar tragédias de grandes proporções em áreas urbanas.

Como você explica a sua pesquisa para alguém que não conhece nada dessa área de conhecimento?

Mariza Ferro Apesar de modelos de previsão metereológica já existirem, ainda é muito difícil prever eventos de chuva extrema. Vamos pesquisar esses modelos de previsão de chuvas intensas para áreas urbanas, usando IA com o objetivo de prever, com antecedência de até seis horas quanto, quando e onde vai chover.

O que mais te fascina na pergunta que você quer responder?

Mariza Ferro A possibilidade de aplicação direta da ciência para impactar positivamente a vida da sociedade, a ponto de salvar vidas e fazer isso sem esquecer da responsabilidade com o meio ambiente, pois serão priorizadas técnicas sustentáveis na pesquisa.

Qual seria um exemplo de uso dos resultados que você quer alcançar?

Mariza Ferro Prever com pelo menos seis horas de antecedência que uma chuva de grandes proporções vai atingir uma cidade, como aconteceu em Petrópolis em fevereiro e março de 2022 , permitindo que os meios operacionais tenham tempo de se prevenir e ajudar a tirar a população e animais de situações de risco.

Para você, qual a importância da pesquisa científica, no geral, para o desenvolvimento do país?

Mariza Ferro Pesquisa científica é fundamental para o desenvolvimento de um país soberano e justo. Pesquisa desenvolvida em nosso próprio território é o melhor caminho para atender aos interesses específicos da sociedade brasileira.

As propriedades do efeito borboleta

  • Mauricio Poletti é pesquisador do Departamento de Matemática da Universidade Federal do Ceará

O que você quer responder com a sua pesquisa?

Mauricio Poletti Em sistemas dinâmicos, estudamos sistemas que evoluem no tempo de acordo com uma regra (função). Desses sistemas, os caóticos têm propriedades muito ricas. Meu projeto quer responder quão típicos são esses sistemas.

Como você explica a sua pesquisa para alguém que não conhece nada dessa área de conhecimento?

Mauricio Poletti O efeito borboleta diz que uma pequena mudança nas condições iniciais do sistema pode gerar grandes consequências. Sistemas com essa propriedade são conhecidos como caóticos. Logo, para estudar os sistemas é fundamental entender que propriedades geram esse caos, e quão frequentes são.

O que mais te fascina na pergunta que você quer responder?

Mauricio Poletti Geralmente pensamos que sistemas definidos por regras simples têm que dar resultados simples, mas isso não acontece, até as funções lineares ou polinomiais podem gerar caos. Sistemas caóticos tem uma dinâmica muito interessante, mesmo sendo imprevisíveis do ponto de vista determinístico, eles podem ser bem comportados do ponto de vista estatístico.

Qual seria um exemplo de uso dos resultados que você quer alcançar?

Mauricio Poletti Problemas de física, biologia e finanças são modelados matematicamente. Esses modelos geram sistemas dinâmicos. Portanto, para entender certos problemas, temos que entender como se comportam os sistemas. Se compreendemos a maioria dos sistemas, podemos entender melhor esses modelos.

Para você, qual a importância da pesquisa científica, no geral, para o desenvolvimento do país?

Mauricio Poletti A pesquisa científica é fundamental para o desenvolvimento. Sem pesquisa, um país só consegue “importar” soluções geradas por outros, que muitas vezes não se adaptam ao contexto do país.

Numa pesquisa, o benefício não é só o resultado. O processo muitas vezes é mais importante pois nele se aprendem e desenvolvem técnicas, formam-se recursos e capacidades que podem ser usadas para outros problemas.

ESTAVA ERRADO :A primeira versão dizia que o financiamento de pesquisas do Instituto Serrapilheira foi anunciado em 26 de julho. Na verdade, a data de anúncio foi 28 de junho. A informação foi corrigida às 14h08 da segunda-feira, 24 de julho.

NEWSLETTER GRATUITA

Nexo | Hoje

Enviada à noite de segunda a sexta-feira com os fatos mais importantes do dia

Este site é protegido por reCAPTCHA e a Política de Privacidade e os Termos de Serviço Google se aplicam.

Gráficos

nos eixos

O melhor em dados e gráficos selecionados por nosso time de infografia para você

Este site é protegido por reCAPTCHA e a Política de Privacidade e os Termos de Serviço Google se aplicam.

Navegue por temas