Foto: Bruno Kelly/Reuters
ESPECIAL
Política mortal:
o Brasil em aflição após um ano de pandemia
Da Redação em 11 de mar de 2021
País chega a 11 de março de 2021 vivendo seu pior momento, enquanto outras partes do mundo registram arrefecimento de casos de covid-19. Bolsonaro apostou em negacionismo e sabotagem de medidas de prevenção. Leia especial
Acontecimentos históricos
do Brasil, por total de mortos
quantidade
de mortes
Ano com mais
mortes por
dengue (2015)
1.088
epidemia
de H1N1 (2009)
2.232
Pandemia
de H1N1 (1918)
(gripe espanhola)
cerca de 35.000
guerra do
paraguai (1864-1870)
cerca de 50.000
ano com mais
homicídios (2017)
65.602
doenças
respiratórias
infecciosas (2019)
94.264
Covid-19 no
primeiro ano
da pandemia
270.656
mortos em um ano
Tragédias brasileiras por número
de mortos em único dia ou evento
Acidente
aéreo em
Congonhas
Incêndio
da boate
Kiss
Rompimento
de barragem
em Brumadinho
Massacre
do Carandiru
(2007)
(2013)
(2019)
(1992)
270
111
199
242
Incêndio do
Gran Circus
em Niterói
Deslizamentos
no estado do
rio de Janeiro
Dia com maior
número de mortes
por covid-19
(2011)
(1961)
(2021)
503
1.262
2.286
mortos em
um único dia
Observações: Nas tragédias mencionadas, os desaparecidos foram contabilizados como mortos.
Fonte: GBD (Global Burden of Disease), FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), Ministério da Saúde e notícias da imprensa.
Acontecimentos históricos
do Brasil, por total de mortos
quantidade de mortes
Ano com mais
mortes por
dengue (2015)
1.088
epidemia
de H1N1
(2009)
2.232
Pandemia
de H1N1 (1918)
(gripe espanhola)
cerca de 35.000
guerra do
paraguai
(1864-1870)
cerca de 50.000
ano com mais
homicídios (2017)
65.602
doenças
respiratórias
infecciosas
(2019)
94.264
Covid-19 no
primeiro ano
da pandemia
270.656
mortos em um ano
Tragédias brasileiras por
número de mortos em único
dia ou evento
Massacre
do Carandiru
Acidente aéreo
em Congonhas
(1992)
111
(2007)
199
Incêndio da
boate Kiss
Rompimento
de barragem
em Brumadinho
(2013)
242
(2019)
270
Incêndio do
Gran Circus
em Niterói
(1961)
Deslizamentos
no estado do
rio de Janeiro
503
(2011)
1.262
Dia com maior
número de mortes
por covid-19
(2021)
2.286
mortos em
um único dia
Observações: Nas tragédias mencionadas, os desaparecidos foram contabilizados como mortos.
Fonte: GBD (Global Burden of Disease), FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), Ministério da Saúde e notícias da imprensa.
Foto: Ivan Alvarado/Reuters
Saúde colapsada, brasileiros sem atendimento
Incapaz de controlar a transmissão do novo coronavírus ao longo de um ano da pandemia decretada em 11 de março de 2020 pela OMS (Organização Mundial da Saúde), o Brasil vive um cenário de caos na saúde. Entre janeiro e março de 2021, o país teve de lidar com:
pessoas morrendo asfixiadas por falta de oxigênio hospitalar
pessoas morrendo na fila de UTIs de hospitais lotados
ambulâncias sendo usadas como leitos hospitalares
hospitais fechando portas para não receber mais doentes
pessoas entrando na Justiça para obter um leito
corpos de vítimas armazenados em contêineres
A tragédia na saúde brasileira está espalhada por todo o país. Mas uma cidade em particular, Manaus, capital do estado do Amazonas, foi devastada por duas fortes ondas de covid-19:
Sufocamento
primeiro colapso
Entre abril e junho de 2020, câmaras frigoríficas receberam corpos por falta de espaço nos hospitais, e caixões foram empilhados em valas coletivas nos cemitérios. Pela cidade, as mortes dentro de casa chegaram a atingir o dobro da média dos anos anteriores por causa da dificuldade das pessoas de encontrarem atendimento e pelo medo de irem aos hospitais e se infectarem.
segundo colapso
Em janeiro de 2021, familiares de pacientes tiveram de providenciar por conta própria cilindros de oxigênio. A explosão de internações fez o insumo se esgotar, e pessoas morreram sem conseguir respirar. A tragédia ocorreu dias após a visita à cidade do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para divulgar um aplicativo que incentivava médicos a receitar remédios ineficazes.
Diferentemente da Europa, onde as curvas de contaminação caíram de forma significativa entre as ondas, no Brasil a pandemia nunca deu trégua, tendo apenas um período de menor intensidade no segundo semestre de 2020.
Em 2021, a tragédia atingiu todo o país de maneira sincronizada, diante de aglomerações ocorridas na virada do ano e do surgimento de novas variantes do coronavírus, que vêm sendo mapeadas e estudadas pela ciência, mas cuja transmissão já é considerada mais agressiva.
Nos dois primeiros meses do ano, o Brasil teve um crescimento de 71% nas mortes por covid-19 em comparação com o último bimestre de 2020, e a pandemia atingiu seu pior momento.
20
das 27 unidades da federação superaram 80% de ocupação dos leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) no início de março
No lugar de uma política preventiva, calcada na testagem, rastreamento de contatos, isolamento de doentes e lockdowns rigorosos, tal como sugerem a OMS e as experiências de países que estão conseguindo controlar a doença, o Brasil permitiu que o vírus circulasse e lidou com a covid-19 tentando expandir leitos. Mas até nisso teve dificuldades.
Dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde mostraram que o total de leitos pelo país financiados com recursos federais caiu de 12.003 em dezembro para 7.717 em janeiro e 6.830 em fevereiro. A previsão é que cheguem a 3.187 até o final do mês. O Amazonas, por exemplo, havia desativado 85% dos leitos entre julho e outubro.
A queda no número de leitos foi impactada pela falta de planejamento do Ministério da Saúde para o orçamento de 2021. No ano anterior, os recursos para as UTIs tiveram origem no Orçamento de Guerra aprovado pelo Congresso, que fugia do teto de gastos. Mas nem tudo que foi reservado para o combate à covid-19 foi usado.
R$ 80 bilhões
é o valor reservado para o combate à pandemia que ficou represado pelo governo, que alegou ter planejado gastos além do necessário
O mecanismo especial do Orçamento expirou em 31 de dezembro, e a pasta se viu sem recursos para o ano seguinte. A situação foi revertida por São Paulo, Maranhão, Piauí e Bahia, que recorreram ao Supremo. No final de fevereiro, a ministra do tribunal Rosa Weber determinou que o Ministério da Saúde voltasse a custear os leitos nesses estados, mas eles acusam o governo federal de não cumprir a decisão.
O país também tem de conviver com escândalos na gestão local de recursos. A Polícia Federal apontou esquemas criminosos em contratos para o combate à covid-19. Pelo menos 19 estados foram alvo de operações. No Rio, o governador Wilson Witzel (PSC) foi afastado e denunciado sob acusação de desvios na saúde.
Foto: Ricardo Moraes/Reuters
População na pobreza, assistência inconstante
A pandemia derrubou a economia do Brasil, mesmo sem lockdowns rigorosos. O desemprego subiu a níveis recordes e fechou 2020 com taxa média de 13,5%, a maior da série do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), iniciada em 2012.
Historicamente, o mercado de trabalho brasileiro registra uma forte desigualdade racial. Na série histórica do IBGE iniciada em 2012, o desemprego sempre foi maior entre pretos e pardos que entre brancos.
Na pandemia, essa distância se aprofundou: no segundo trimestre de 2020, a taxa de desemprego entre pretos era mais de 70% maior que entre brancos, maior diferença registrada na série histórica.
A informalidade é maior nas populações preta e parda que na população branca. E o trabalho informal – normalmente associado a um nível mais baixo de renda – foi o mais atingido pela pandemia.
Das mais de 8 milhões de vagas perdidas nos nove primeiros meses de pandemia, 4,6 milhões (56,5%) eram informais. A taxa de informalidade antes da crise era de cerca de 40%. Portanto, os trabalhadores informais arcaram com a maior parte das demissões, mesmo tendo menor participação no mercado de trabalho antes da pandemia.
No início da pandemia, diante da vulnerabilidade exposta dos empregos informais, o Congresso articulou o auxílio emergencial, que foi a mais importante política pública adotada para combater a crise.
67,9 milhões
foi o número de brasileiros atendidos pelo auxílio emergencial em 2020
Em 2020, o auxílio deu sustento à população de baixa renda impactada pela pandemia e foi além: ajudou a reduzir a pobreza no país de forma geral.
Mas o efeito do auxílio de R$ 600 sobre a pobreza foi temporário. O programa foi reduzido em setembro de 2020 – o valor caiu para R$ 300 – e encerrado na virada para 2021. Segundo cálculo do economista Marcelo Neri, do FGV Social, 17,8 milhões de pessoas voltaram à pobreza (renda menor que R$ 246 mensais) entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021.
Em paralelo, a desigualdade de renda do trabalho – que não conta o auxílio emergencial e já vinha em alta desde 2015 – bateu recorde no Brasil em 2020. Segundo estudo do FGV Social, houve uma perda generalizada da renda do trabalho durante os primeiros meses da crise sanitária, mas muito mais forte entre os 50% mais pobres que entre os 10% mais ricos.
Em coluna publicada no Nexo, a economista Laura Carvalho, professora da FEA-USP, apontou que há relação entre a desigualdade e o crescimento econômico. Segundo a economista, um esforço para reduzir a desigualdade no país pode também pode significar um impulso positivo para a atividade econômica.
“Os potenciais benefícios para o crescimento econômico de se reduzir desigualdades já têm alto respaldo na literatura econômica empírica internacional”
Laura Carvalho,
professora de economia da FEA-USP
e colunista
do Nexo
Em 2020, a economia brasileira teve sua maior queda em 30 anos, com retração de 4,1% do PIB (Produto Interno Bruto). Em março de 2021, governo e Congresso preparam a retomada do auxílio emergencial, em valores mais baixos, a fim de lidar com o impacto de novas medidas de restrição de circulação, agora mais rigorosas, decretadas por governos locais diante dos números alarmantes de casos de contaminação e mortes.
O governo articula um benefício com parcelas mensais entre R$ 175 e R$ 375, pagas por quatro meses. Organizações da sociedade civil – como a Coalizão Negra Por Direitos e a Rede Brasileira de Renda Básica – se mobilizam para elevar esse valor, argumentando que o montante proposto pelo governo é insuficiente para atender às necessidades da população.
Foto: Bruno Kelly/Reuters
Pouco empenho federal, vacinas escassas
Com larga experiência em campanhas de vacinação em massa, o Brasil não conseguiu executar um plano de imunização da população contra a covid-19 de forma ampla e rápida, devido, principalmente, à falta de vacinas. O país aplica as doses disponíveis em ritmo lento.
4,26%
da população brasileira havia sido vacinada com uma dose até 10 de março de 2021, em uma campanha iniciada em 17 de janeiro
Durante a corrida global pelo produto em 2020, países como o Canadá garantiram seis doses para cada habitante em contratos envolvendo sete diferentes laboratórios, firmados mesmo sem a garantia de que as vacinas ficariam prontas. O Brasil ficou longe de adquirir duas doses para cada um de seus 210 milhões de habitantes.
Por meses, o presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), adversários políticos com pretensões de concorrer à Presidência em 2022, travaram uma disputa em torno do tema. Bolsonaro, inclusive, adotou um discurso de desestímulo à vacinação, reforçando sua atitude anticientífica na pandemia.
O Ministério da Saúde apostou tudo numa única vacina: a do laboratório anglo-sueco AstraZeneca, desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford. Um contrato de encomenda tecnológica prevê que a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) produza mais de 210 milhões de doses até o final de 2021.
De outro lado, o Instituto Butantan, ligado ao governo paulista, fechou um acordo com o laboratório chinês Sinovac, para a produção da Coronavac no país. E foi ela que saiu na frente.
Quando a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou o uso emergencial dos dois imunizantes, em 17 de janeiro de 2021, apenas as doses do Butantan estavam disponíveis em território brasileiro. Doria iniciou a vacinação no mesmo dia. O imunizante de Oxford só chegaria aos estados oito dias depois.
50
era o número de países que já tinham começado a vacinação contra a doença quando a primeira dose foi aplicada no Brasil
A campanha brasileira sofreu com a falta de critérios claros para a definição de grupos prioritários, o que possibilitou que pessoas furassem a fila. Houve ainda suspeitas de vacinas de vento, em que pessoas não recebiam a dose de fato. A distribuição também pulverizou as doses pelas cidades, enquanto deveriam ter sido concentradas nas áreas mais afetadas pela covid-19, segundo sanitaristas.
A estratégia de contar com apenas duas vacinas se mostrou um erro. A campanha foi interrompida em fevereiro em capitais como Rio de Janeiro e Salvador, porque as doses, que eram poucas logo, se esgotaram. Problemas na importação dos insumos da China necessários para a fabricação das vacinas emperraram a distribuição.
Para apressar o processo, parlamentares, governadores e empresários passaram a pressionar o governo a adquirir outros produtos, como a russa Sputnik V e a vacina da Pfizer, oferecida pela empresa ao país em 2020, mas recusada pelo governo devido a cláusulas do contrato.
A falta de coordenação do Ministério da Saúde no combate à covid-19 tem feito governadores e empresas privadas trabalharem pela compra de vacinas para o SUS (Sistema Único de Saúde). Essa descentralização não ocorreu nos países que estão mais avançados na imunização. Um avanço que encontra resultados no número de contaminações e mortes pela covid-19. Enquanto os casos caem no mundo, no Brasil a curva é ainda ascendente.
Em Israel, onde metade da população deve ser vacinada com duas doses até o final de março, a pandemia começa a perder força. Em fevereiro, o número de infectados entre maiores de 60 anos havia caído 41% nas seis primeiras semanas de imunização, em relação às três semanas anteriores ao início da campanha. Houve ainda redução de 31% nas hospitalizações e 24% nos casos graves.
No Reino Unido, o jornal britânico The Guardian mostrou em fevereiro que as mortes por covid-19 entre pessoas com 80 anos ou mais caíram 62% desde janeiro. Tanto no Reino Unido como em Israel, a queda nos indicadores é um reflexo da vacinação combinada ao lockdown. Embora sejam países muito menores que o Brasil, a política de combate à pandemia adotada por eles ilustra como a junção entre medidas restritivas e de imunização em massa impactam na doença.
Foto: Clauber Cleber Caetano/PR
Sabotagens reiteradas, responsabilização barrada
Depois de um ano de apostas e incertezas, a comunidade científica já chegou a uma série de consensos sobre medidas necessárias para se enfrentar a pandemia. Na vida política brasileira, porém, esse conhecimento não é reconhecido. O presidente Jair Bolsonaro fez o seguinte no período:
minimizou e desdenhou a gravidade da pandemia
aglomerou pessoas em eventos oficiais pelo Brasil
sabotou o isolamento social em prol da economia
questionou sem base científica o uso de máscaras
defendeu e financiou medicamentos sem eficácia
desestimulou e atrasou a vacinação da população
Ao mesmo tempo, Bolsonaro incita a população contra governadores e prefeitos que decretam medidas de restrição de circulação, mesmo num momento de esgotamento dos leitos hospitalares.
O presidente culpa gestores locais pelo resultado da pandemia e, a partir de uma interpretação distorcida de uma decisão do Supremo, diz que faz o que está a seu alcance. O tribunal apenas reconheceu o poder de estados e municípios para adotarem medidas sanitárias, mas não eximiu o governo federal de sua responsabilidade.
Para tentar responsabilizar Bolsonaro na pandemia, há pedidos de impeachment na Câmara dos Deputados por crime de responsabilidade, representações na Procuradoria-Geral da República por crimes contra a saúde pública, comunicações ao Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade e genocídio, apurações no TCU (Tribunal de Contas da União) e assinaturas por uma CPI no Senado.
Situação
IMPEACHMENT
Arthur Lira (PP-AL), eleito à presidência da Câmara como candidato governista e líder do centrão, diz que a abertura de um processo de impeachment “não é sua prioridade”. A popularidade do presidente, cuja aprovação caiu, mas permanece em torno dos 30% junto à população, também é apontada por parlamentares como um empecilho para a abertura de um processo.
INQUÉRITO CRIMINAL
O procurador-geral da República, Augusto Aras, escolhido por Bolsonaro para o cargo sem integrar a lista tríplice dos procuradores, pouco avançou em relação aos pedidos contra o presidente. Já abriu um inquérito para apurar a conduta do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, no caso de Manaus. O presidente é alvo apenas de apurações preliminares.
INVESTIGAÇÃO PARLAMENTAR
No Senado, a oposição tenta abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a atuação do governo Bolsonaro na pandemia. A instalação depende de Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente da Casa. Também eleito ao cargo com o apoio de Bolsonaro, Pacheco diz que uma CPI neste momento seria “contraproducente”.
CONTAS PÚBLICAS
Uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) de janeiro apontou ilegalidades no uso de verba do SUS para o fornecimento de cloroquina, ineficaz contra a covid-19. Os gastos públicos com aquisição e propaganda de tratamentos não reconhecidos por autoridades sanitárias podem ter impacto na aprovação das contas do governo federal.
APURAÇÃO INTERNACIONAL
O TPI (Tribunal PenaI Internacional) recebeu representações de ativistas e partidos de oposição contra Bolsonaro, mas já arquivou parte delas – os casos ainda podem ser reabertos se novas evidências de crimes contra a humanidade e genocídio surgirem. Os resultados das apurações do TPI costumam levar anos para sair.
GOVERNADORES E PREFEITOS
A responsabilização na pandemia vem recaindo sobre governadores suspeitos de desviar verbas da saúde. Até janeiro de 2021, oito eram alvo de inquéritos. Prefeitos também estão na mira. David Almeida (Avante), de Manaus, foi denunciado pelo Ministério Público, que o acusa de participar de um esquema fura-fila na campanha de vacinação.
Foto: Bruna Prado/Getty Images
Futuro ainda incerto, mas com o vírus presente
Diante de uma tragédia mundial, agravada no Brasil por decisões políticas, a incerteza com o futuro permanece na sociedade. Vamos vencer o vírus? Segundo os cientistas, tudo indica que não.
Descendentes do vírus que causou a gripe espanhola, em 1918, por exemplo, ainda circulam entre nós. O futuro mais provável é que o Sars-CoV-2 (nome dado ao novo coronavírus) se torne endêmico, como aconteceu com os coronavírus anteriores.
Segundo Mike Ryan, que chefia o combate à covid-19 na OMS (Organização Mundial da Saúde), quando chegarmos nesse ponto, o novo coronavírus “terá um nível muito baixo de ameaça no contexto de um programa mundial de vacinação”.
A pandemia como conhecemos hoje, porém, pode ser superada com a vacinação, apesar de ela ocorrer de maneira desigual pelo mundo. Países que avançam na imunização podem chegar ainda em 2021 à cobertura de 70% de suas populações, índice necessário para atingir a imunidade coletiva. O presidente norte-americano Joe Biden, por exemplo, afirmou que até o final de maio de 2021 o país terá vacina para todos os adultos americanos.
No outro extremo, há um grande bloco de países mais pobres com acesso limitado a vacinas. Uma estimativa da revista The Economist calculou em 85 o número de países que não conseguirão vacinar de forma ampla antes de 2023, incluindo a maior parte das nações africanas e vizinhos do Brasil como Paraguai e Bolívia.
Segundo a projeção, o Brasil é um dos países que ficam no meio do caminho. Aqui, a imunização segue em ritmo muito abaixo do desejável, com o agravante do país ter um presidente que trabalha contra o procedimento e combate medidas de contenção da doença.
“É possível, embora ainda num horizonte distante, que a OMS (Organização Mundial da Saúde) declare o fim da pandemia, mas o Brasil continue tendo que lidar com níveis inaceitáveis de transmissão”
Guilherme Werneck,
epidemiologista, vice-presidente da Abrasco (Associação Brasileira
de Saúde Coletiva) e professor do IMS/Uerj, em entrevista à BBC
Brasil
A duração do efeito das vacinas e o comportamento de novas variantes do vírus estão entre as questões que ainda desafiam especialistas quando se tenta projetar cenários futuros da pandemia. Assim, não é possível saber ainda se a vacinação contra a covid-19 terá de ser um procedimento anual.
Além disso, a ausência de medidas rígidas de isolamento e distanciamento social, especialmente em um momento de transmissão acelerada da covid-19, pode fazer do país um “celeiro” de variantes do Sars-CoV-2, muitas das quais podem potencialmente driblar as vacinas existentes.
Dessa forma, o Brasil permanece em aflição diante da maior crise sanitária mundial vivida em um século. Em 10 de março de 2021, na vésperas de a pandemia completar um ano, 2.286 brasileiros morreram de covid-19, segundo dados oficiais, um novo recorde diário de óbitos.
Segundo uma projeção do jornal O Globo, a partir de dados do cronograma de vacinação do Ministério da Saúde, o país chegará a abril de 2022 com apenas 65% da população imunizada. A perspectiva pode melhorar se mais contratos com fabricantes forem fechados. Enquanto isso, diante da omissão e falta de planejamento do Executivo federal, governadores articulam com o Congresso a criação de uma frente de combate à crise sanitária. À população resta seguir as recomendações da ciência: proteger a si mesmo e, principalmente, proteger os outros dessa tragédia cuja dimensão ainda está longe de ser medida.
Produzido por Camilo Rocha, Estevão Bertoni, Isabela Cruz e Marcelo Roubicek
Gráficos por Lucas Gomes, Gabriel Maia e Gabriel Zanlorenssi
Arte e Desenvolvimento por Thiago Quadros
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