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Randolfe Rodrigues

Iluminando os porões da pobreza brasileira

13 de março de 2020

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A atuação do governo federal junto às camadas sociais mais vulneráveis da população indica que Bolsonaro brinca com coisa séria

Causa revolta a indiferença e a maldade desse governo com os mais pobres. Podemos medi-la em várias situações, mas há casos exemplares como a falta de solução para uma fila de espera de 5 milhões de pessoas no Bolsa Família, a maioria crianças; de 1,5 milhões no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social); e de 420 mil, entre idosos e pessoas de baixa renda com deficiência, inclusive crianças pobres com microcefalia, na fila do BPC (Benefício de Prestação Continuada), uma espera de 8,5 meses, para quem já vive em situação de extrema vulnerabilidade social.

Recentemente, tive o desprazer de conviver com a indisposição do governo na minha tentativa de manter a vigência da medida provisória 898, de 2019, que autorizava a concessão do 13º benefício, em 2019, para quem ganha o Bolsa Família. No Projeto de Lei de Conversão nº. 3, de 2020, fruto da referida medida provisória, proponho a incorporação permanente do abono natalino a esse programa e, além disso, estendo ao BPC esse direito. A reação contrária do governo ao meu projeto parece piada de mau gosto quando lembramos que a pobreza e a extrema pobreza avançam no Brasil e que voltamos ao mapa da fome.

A esse quadro social dramático, o governo quer responder com cestas básicas, a velha prática dos coronéis para fidelizar os seus currais eleitorais. O que proponho são mais direitos sociais, oportunidades, qualidade de vida, dignidade e desenvolvimento. Para não aceitar as minhas proposições, Jair Bolsonaro alega não ter recursos, mas como aceitar tal justificativa se o Executivo pagou o 13º no ano passado? Nesse caso, há três alternativas: ou há má fé na avaliação de uma proposta que vai beneficiar cerca de 13 milhões de famílias e mais 4,6 milhões de pessoas dependentes do BPC, ou o governo cometeu uma pedalada fiscal no ano passado e realmente não tem disponibilidade orçamentária para arcar com a medida proposta, ou não vê a pobreza de milhões de brasileiros como um problema a ser resolvido.

De qualquer maneira, buscando contornar o argumento da falta de verbas, propusemos, como fonte orçamentária para essa despesa, o recolhimento semestral do Imposto de Renda sobre rendimentos de aplicações em fundos de investimentos fechados, que são instrumento de gestão patrimonial das famílias mais ricas do país. Conhecida como “come-cotas”, essa tributação foi realizada, em 2018, pelo ex-presidente Temer, apoiada em uma medida provisória que já perdeu a validade.

Estima-se que essa tributação proporcione uma arrecadação anual de, pelo menos, R$10,7 bilhões, o que é mais do que suficiente para cobrir os R$7,38 bilhões necessários para o 13º benefício do Bolsa Família e do BPC. Além da dimensão dos recursos arrecadados, essa medida faz a coisa certa, transfere renda dos mais ricos para os mais pobres. Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 10.638, de 2018, que retoma essa pauta fiscal. Entretanto, o ministro da Economia, tão ávido por retirar direitos dos mais pobres, não tem demonstrado nenhum interesse nesse projeto.

Randolfe Rodrigues

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