5 anos: os resultados das promessas da reforma trabalhista

Ensaio

5 anos: os resultados das promessas da reforma trabalhista
Foto: Arquivo/Agência Brasil

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Nasser Ahmad Allan


27 de novembro de 2022

Indicadores econômicos do mercado de trabalho no Brasil persistem em desmentir os defensores da redução de direitos dos empregados

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Em 11 de novembro de 2017, entrou em vigência a reforma trabalhista, como ficou conhecida a Lei 13.467, sob promessa de modernizar as relações de trabalho, eufemismo adotado para camuflar a redução de direitos de uma parte da classe que vive da venda da força de trabalho. Decorridos cinco anos, parece ser pertinente um rápido balanço entre os propósitos assumidos publicamente e as consequências alcançadas.

A maior reforma na história da legislação trabalhista foi promovida sem propiciar maior debate a respeito das sequelas econômicas e sociais que produziria. Um projeto de iniciativa do Poder Executivo prevendo oito modificações – importantes, verdade, mas não mais do que oito – depois de poucos meses, era enviado à sanção presidencial com cerca de 200 alterações na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Na Câmara dos Deputados, o relator do projeto, Rogério Marinho, sustentava que a reforma seria necessária para conferir maior liberdade de negociação às empresas e sindicatos, retirando-lhes as amarras da legislação estatal, compreendida como protetiva em excesso e, portanto, inibidora do desenvolvimento econômico. De igual modo, urgia conceder maior segurança jurídica para as negociações diretas entre empregadores e empregados.

Com corroboração do Senado Federal, os direitos trabalhistas foram considerados entrave ao crescimento da economia brasileira e, por isso, culpados pelas altas taxas de desocupação e de informalidade no mercado de trabalho. Parece correto afirmar que para aqueles legisladores, os direitos de quem estava inserido no mercado formal seriam os responsáveis pelo desemprego dos demais.

Assim, foi produzida uma nova legislação para atender, dentre outras, as premissas de: (i) facilitar o emprego de mão de obra mediante contratos precários, entendendo-os como aqueles em que os trabalhadores são submetidos às condições menos benéficas do que as relativas aos contratos convencionais; (ii) reduzir direitos em relação à jornada e à remuneração dos empregados; (iii) privilegiar o acordo individual entre empregado e empregador, inclusive, para minorar ou suprimir direitos trabalhistas, afastando a obrigatoriedade de mediação sindical; (iv) prevalecer o negociado coletivamente sobre o legislado mesmo para supressão ou redução de direitos dos trabalhadores e (v) enfraquecer as entidades sindicais profissionais com asfixia financeira, mediante a impossibilidade de cobrança de contribuição sindical de não-sócios, combinada com o fim da ultratividade de acordos e convenções coletivas de trabalho (a persistência das regras negociadas coletivamente mesmo após a vigência do instrumento que as instituiu até que sobrevenha outro que as renove ou revogue expressamente).

É evidente que tal reforma mostrou-se muito mais abrangente, importando também na alteração de outras diversas regras de direito material, processual do trabalho e direito sindical. No entanto, assumindo o risco do reducionismo, as premissas mencionadas podem ser compreendidas como alguns dos eixos mais relevantes das modificações produzidas.

É de se notar que a reforma brasileira não difere na essência de mudanças na legislação do trabalho promovidas em outros países do Ocidente, onde a crise do capitalismo foi enfrentada com programas de austeridade, o que, invariavelmente, representou reduzir direitos sociais, incluindo os trabalhistas, e atacar os sindicatos de trabalhadores.

No Brasil, o discurso difundido em prol da reforma também não se distinguiu daquele adotado em outros lugares do mundo. Para seus propagandistas, as relações de trabalho deveriam se adequar à nova realidade do mercado brasileiro e, assim, conformarem-se aos anseios das forças produtivas e com isso estimularem a criação de empregos formais. Nesta equação, parece clara a relação diretamente proporcional entre reduzir direitos e gerar empregos.

Passados cinco anos, porém, os indicadores econômicos do mercado de trabalho no Brasil persistem em desmentir os defensores de tais modificações. Neste período, de acordo com os critérios adotados na PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, o percentual de informalidade da população ocupada apresenta-se praticamente estável na casa dos 40%, à exceção do ano de 2020, em que a diminuição da atividade econômica causada pela pandemia de covid-19, provavelmente, tenha afetado inclusive o trabalho informal.

A interpretação conjunta das taxas permite refutar a relação direta, propagada pelos defensores da reforma trabalhista, entre a redução do custo da mão de obra e a geração de empregos formais

Em igual sentido, os percentuais de pessoas desocupadas até o início da pandemia não melhoraram significativamente, subindo de forma abrupta em 2020 e 2021, e diminuindo de modo gradual em 2022, com a retomada de alguns setores da economia.

A taxa de subutilização da força de trabalho – considerada assim a relação entre pessoas desocupadas ou subocupadas por insuficiência de horas laboradas e a força de trabalho potencial – também acompanhou os índices de ocupação. Isto é, nos dois anos posteriores à reforma manteve-se em patamar similar ao de 2017, oscilando 0,5% para cima em 2018 e para baixo em 2019. Com a retração econômica, em 2020, apresentou o maior índice histórico, recuando em 2021 para os níveis de 2017 e apresentando uma boa queda no terceiro trimestre de 2022.

A interpretação conjunta das taxas de informalidade, de pessoas desocupadas e de subutilização da força de trabalho permite refutar a relação direta, propagada pelos defensores da reforma trabalhista, entre a redução do custo da mão de obra e a geração de empregos formais. Bastaria mencionar que os níveis de informalidade recuaram somente no período de maior retração da economia, ainda assim acompanhando o aumento de desocupação e subutilização da força de trabalho.

De outra parte, as modificações produzidas na legislação trabalhista, ao retirarem direitos que possuem representação econômica e ao ampliarem as possibilidades de contratos de trabalho precários, produziram uma queda no rendimento médio dos trabalhadores. Para ilustrar, no segundo trimestre de 2022, a renda média equiparava-se à de 2012. Essa perda de renda é mais significativa no contingente de trabalhadores formado pelos 10% de menor renda per capita, para quem entre 2018 e 2021, a queda real foi de 9,7% (PNAD).

Cinco anos depois, pode-se afirmar que a reforma trabalhista não cumpriu as promessas públicas assumidas por seus ideólogos. Não gerou empregos formais, diminuiu a informalidade, tampouco estimulou crescimento econômico. No entanto, parece oportuno apontar que os efeitos realmente pretendidos, mas não assumidos, com tais modificações legislativas foram alcançados, o aumento da lucratividade dos empregadores, ocasionando maior concentração de renda e acentuando a abissal desigualdade econômica e social no país.

Nasser Ahmad Allan é doutor em d ireito pela Universidade Federal do Paraná, advogado trabalhista e sindical em Curitiba.

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