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Sara Oliveira
Na atual crise econômica, é inevitável que as tarefas da casa sejam realizadas cada vez mais por crianças e adolescentes, um fenômeno que discrimina por gênero, raça e renda
Quando crianças e adolescentes não vão à escola, a probabilidade de fazerem mais trabalhos domésticos aumenta — especialmente entre as meninas. Como consequência da pandemia de covid-19, mais de 1,5 bilhão de estudantes ficaram sem aulas nas escolas em 184 países, segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Aqui no Brasil, as aulas presenciais continuam suspensas. Embora inevitável e necessário para conter o avanço da doença, o fechamento de escolas produz efeitos na vida das crianças que vão além da interrupção da aprendizagem.
Muito do trabalho infantil no mundo ocorre em ambientes domésticos. A OIT (Organização Internacional do Trabalho) estima que pelo menos 17,2 milhões de crianças entre 5 e 17 anos ao redor do mundo fazem trabalho doméstico, remunerado ou não, na casa de outra pessoa — em sua maioria, meninas. O trabalho infantil em casa é concentrado nelas: 94,2% fazem algum tipo de tarefa. Dessas, 73,4% são negras, segundo o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil.
É em casa que a mão de obra de meninas e meninos é explorada para inúmeras tarefas. Na prática, isso significa lavar e passar roupas, cozinhar, cuidar de crianças etc. Se realizadas por crianças e adolescentes, essas ocupações também são consideradas trabalho, impactando o desenvolvimento físico e psicológico.
É importante salientar que, em algumas famílias, independentemente da fase de quarentena, crianças e adolescentes ajudam com pequenas tarefas domésticas. É até muito legal e proveitoso para as crianças aprenderem desde cedo a arrumar a cama, organizar o quarto, contribuir com a arrumação da casa. Isso não é trabalho doméstico infantil. É uma demonstração de cooperação entre os membros da família.
Mas, durante o isolamento social, precisamos ter um olhar mais apurado e uma preocupação com a nova rotina imposta principalmente às meninas. A pesquisa “Por ser menina ”, realizada pela Plan International Brasil, aponta discrepâncias significativas entre o que meninas e meninos fazem dentro de casa. Entre as meninas, 81,4% arrumam a própria cama, 76,8% lavam louça e 65,6% limpam a casa. Entre os meninos, 11,6% ajeitam a cama, 12,5% são responsáveis pela louça e 11,4% arrumam a casa.
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