Explicado

TV brasileira: da hegemonia à disputa com novas plataformas

Juliana Domingos

17 de setembro de 2020(atualizado 28/12/2023 às 22h49)

Meio de comunicação mais popular do país completa 70 anos de história entre transformações intensas e reafirmação de seu papel informativo durante a pandemia

O Nexo depende de você para financiar seu trabalho e seguir produzindo um jornalismo de qualidade, no qual se pode confiar.Conheça nossos planos de assinatura.Junte-se ao Nexo! Seu apoio é fundamental.

Neste texto:

  • O QUE é a concessão de TV aberta no Brasil
  • QUEM inaugurou a TV aberta no Brasil
  • QUANDO a TV brasileira virou uma potência
  • QUAL o papel da Globo na relevância da TV
  • COMO as novelas viraram referência cultural
  • ONDE a TV brasileira vai buscar referências
  • POR QUE as novas tecnologias mudam o jogo
  • POR QUE a TV aberta ainda é relevante no Brasil
  • NO MUNDO: o futuro da TV
  • EM ASPAS: a TV falada
  • NA ARTE: obras sobre a TV
  • Vá ainda mais fundo

Temas

Compartilhe

FOTO: THIAGO QUADROS/NEXO

Foto-montagem mostrando diversos aparelhos de televisão antigos em prateleira de loja. Em suas telas, grandes momentos e personagens da televisão brasileira: Hebe Camargo, debate presidencial com Fernando Collor, Pedro Bial apresentando o BBB, Carminha da novela Avenida Brasil, Chico Anysio na Escolinha do Professor Raymundo, Odete Roitman da novela Vale Tudo, Silvio Santos, Pelé na Copa do Mundo de 1970, Roberto Carlos, Juma da novela Pantanal, Chacrinha, Jornal Nacional com Willian Bonner, Chico Buarque no Festival da Canção, e os Trapalhões.

TV completa 70 anos de história

A primeira transmissão de TV realizada no Brasil ocorreu em 18 de setembro de 1950, com a inauguração da TV Tupi em São Paulo. Dali em diante, a televisão conquistou um lugar de destaque na cultura brasileira e se consolidou como uma das principais formas de acesso à informação e de entretenimento da população.

Seu protagonismo é hoje disputado pelas novas tecnologias: a massificação da internet e a competição de plataformas como redes sociais e serviços de vídeo sob demanda. Abaixo, o Nexo explica como a televisão brasileira se desenvolveu, quais suas particularidades e sua força, e para onde seu futuro aponta.

O QUE é a concessão de TV aberta no Brasil

Os canais de televisão aberta assim como as emissoras de rádio no Brasil são bens públicos, temporariamente concedidos pelo Estado a entes privados. Esse modelo de concessão pública tem sido adotado em diferentes países desde a origem desses veículos de comunicação.

Uma vez que os sinais de transmissão se propagam em ondas pelo espectro eletromagnético, o Estado cumpre a função de ordenar e distribuir as diferentes faixas de frequência a empresas que exploram comercialmente os serviços de telerradiodifusão.

Emissoras comerciais são submetidas a um processo de licitação, seguindo as normas de uma lei federal , e precisam ser validadas pelo Congresso Nacional. A partir da assinatura do contrato, as emissoras pagam pelo direito de uso de radiofrequências . O prazo de concessão a emissoras de TV no país é de 15 anos.

127

era o número concessões de TV em vigor no Brasil em 2019, segundo a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações)

O objetivo das concessões é evitar a exploração desordenada – que poderia levar a interferências nas transmissões – e garantir uma regulação do serviço, exigindo o cumprimento de determinados requisitos , como:

  • pelo menos 70% do capital da empresa deve pertencer a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos;
  • nenhum dos dirigentes e sócios da emissora pode ter sido condenado em decisão transitada em julgado;
  • um mesmo indivíduo não pode fazer parte da administração ou gerência de mais de uma concessionária do mesmo tipo de radiodifusão (TV ou rádio) numa mesma localidade;
  • destinar um mínimo de 5% do tempo de transmissão a programas noticiosos para cumprir a finalidade informativa.

Na prática, apesar da promessa de concorrência, a história das concessões de rádio e TV no Brasil é marcada por uma forte influência política. E suas renovações são praticamente automáticas.

A política não se resume à relação entre grandes empresários e governos. Os próprios políticos têm, regionalmente, controle de emissoras , num fenômeno batizado por pesquisadores de coronelismo eletrônico .

Na legislatura de 2019 a 2023, segundo um levantamento do coletivo Intervozes, 20 deputados federais, seis senadores e um governador eleitos estão nominalmente vinculados a veículos de comunicação.

A prática é, em tese, ilegal: o artigo 54 da Constituição estabelece que deputados e senadores não podem ser “proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público”, como as concessões de TV.

Alguns políticos tentam burlar a lei repassando as concessões a parentes e aliados. E há um impasse jurídico em torno da questão, em ações que ainda precisam ser julgadas pelo Supremo Tribunal Federal.

A presença de igrejas católicas e evangélicas entre as emissoras de maior audiência também vem crescendo. De acordo com a pesquisa Monitoramento da Propriedade da Mídia, realizada em 2017 pelo Intervozes em parceria com a ONG Repórteres Sem Fronteiras, entre as 11 redes de TV de maior audiência, 3 são de propriedade de lideranças evangélicas (Record TV, Record News e Gospel TV) e uma de liderança católica (Rede Vida).

Com relação à concentração econômica, a mesma pesquisa aponta uma elevada concentração de audiência e de propriedade dos veículos brasileiros. No caso da TV aberta, os quatro grupos de mídia principais do país( Globo, SBT, RecordTV e Band ) respondem por mais de 70% da audiência. O estudo considera o cenário brasileiro muito preocupante em relação ao pluralismo e à democracia.

Essa situação de oligopólio se relaciona com o fato de as emissoras de TV no Brasil se estruturarem em redes nacionais formadas por “cabeças” instaladas nos grandes centros, que centralizam a produção, e suas afiliadas locais. A primeira emissora a se organizar dessa forma no Brasil foi a Rede Globo, entre o final da década de 1960 e o início da década de 1970.

QUEM inaugurou a TV aberta no Brasil

A TV Tupi, primeiro canal de televisão do Brasil (e da América do Sul), foi fundada pelo jornalista e empresário Assis Chateaubriand (1892-1968).

Ele era o proprietário de um conglomerado midiático formado por jornais e emissoras de rádio, o grupo Diários Associados, e comprou dos Estados Unidos a tecnologia para implantar no Brasil o “rádio com imagens”, uma das expressões que designavam a TV na época.

FOTO: FUNDO DOCUMENTAL AGÊNCIA NACIONAL/WIKIMEDIA COMMONS

Retrato em branco e preto de homem de meia idade trajando terno e gravata

Em 1957, o empresário, político e jornalista Assis Chateaubriand

Nascido na Paraíba e formado em direito, Chateaubriand exerceu a profissão de advogado em paralelo à função de jornalista até os anos 1920, quando adquiriu seus primeiros jornais. Exerceu grande influência política por meio deles e foi eleito senador na década de 1950. Foi também o fundador do Museu de Arte de São Paulo, em 1947, instalado a princípio na sede dos Diários Associados.

A emissora realizou sua primeira transmissão em 18 de setembro de 1950 ao vivo. Às 17 horas, foram feitas as primeiras imagens nos estúdios do Sumaré, em São Paulo. Foram veiculados discursos de inauguração do empresário americano David Sarnoff (pioneiro do rádio e da TV em seu país, de quem Chateaubriand comprou os equipamentos) e do dono da emissora.

Em seguida, foi apresentado um especial chamado “TV na Taba”, com números musicais, humorísticos e infantis, que se encerrou com a atriz e cantora Lolita Rodrigues interpretando o “Hino da TV”.

Chateaubriand adquiriu e distribuiu 200 televisores – para alguns indivíduos e em pontos estratégicos da cidade – para que fosse possível acompanhar o programa, já que a população ainda não tinha acesso ao aparelho. A TV Tupi inaugurou sua filial no Rio de Janeiro alguns meses depois, em 20 de janeiro de 1951.

Várias outras emissoras foram fundadas ao longo da década de 1950, ainda concentradas no sudeste do país:

  • a TV Paulista , em 1952;
  • a RecordTV , iniciada em São Paulo, em 1953;
  • a TV Rio e a TV Itacolomi, de Minas Gerais, em 1955;
  • a TV Santos, afiliada à TV Paulista, primeira emissora regional do país, em 1957;
  • a TV Continental , sediada no Rio de Janeiro, em 1959.

Esses canais foram criados por entes privados, via de regra empresários ligados ao rádio.

Inicialmente, todos os programas eram transmitidos ao vivo. Não havia videotape – tecnologia que viria a permitir a gravação das atrações e que só chegaria ao Brasil na virada da década – nem transmissão direta entre cidades. Com isso, muitos dos primeiros programas eram marcados pelo improviso, com falhas e gafes frequentes.

O início da TV no Brasil foi marcado por uma forte influência do rádio no formato de programação e na linguagem, com muitos artistas e técnicos migrando de um meio para o outro. Comparativamente, nos Estados Unidos, a TV se desenvolveu se apoiando muito mais na indústria cinematográfica do país, já consolidada à época.

FOTO: DIVULGAÇÃO

Fotografia em preto branco de pessoas aglomeradas em frente a um pequeno televisor

Pessoas reunidas para assistir à primeira transmissão de TV do Brasil, em 1950

Poucos receptores foram vendidos nos primeiros anos da televisão no Brasil. A princípio, os aparelhos ficaram restritos às famílias de altíssima renda e só viriam a se tornar mais acessíveis e se popularizar anos mais tarde, principalmente a partir da década de 1960.

A programação das emissoras nos primeiros anos se dirigia a esse público e era composta principalmente de teleteatros (encenações teatrais voltadas para a TV), seriados nacionais e internacionais, programas de variedades, telejornais e programas de entrevistas. As atrações da TV Tupi eram as mais assistidas e comentadas na década de 1950.

Programas da TV Tupi

Imagens do dia (1950-1951)

Primeiro telejornal brasileiro, foi ao ar no dia seguinte à inauguração do canal. Teve um ano de duração e seu formato ainda era bem próximo ao dos noticiários de rádio. As notas eram redigidas pelo jornalista Rui Resende e apresentadas pelo locutor Ribeiro Filho. Algumas contavam com imagens feitas em filme preto e branco, sem som.

Rancho alegre (1950-1954)

Programa humorístico pioneiro da TV brasileira, estrelado pelo ator e humorista Mazzaropi, que contracenava com Geny Prado, João Restiffe e Abelardo Barbosa, o Chacrinha.

Sua vida me pertence (1951-1952)

Primeira telenovela da TV brasileira, protagonizada por Walter Foster e Vida Alves. Teve apenas 20 episódios, com duração média de quinze minutos cada, exibidos ao vivo duas vezes por semana. Nela ocorreu o primeiro beijo da TV brasileira, entre Vida Alves e Walter Forster.

Repórter Esso (1952-1970)

Vindo do rádio, foi o primeiro jornal de sucesso da TV brasileira. Foi apresentado por Kalil Filho e, depois, Gontijo Teodoro – ambos eram locutores de rádio conhecidos. A vinheta de abertura “aqui fala o seu Repórter Esso, testemunha ocular da história”, se tornou sua marca registrada.

O mundo é das mulheres (1955)

Comandado por Hebe Camargo, é considerado o primeiro programa da TV brasileira voltado a uma audiência feminina.

O fato de a televisão brasileira ter nascido e se estruturado primeiramente através de emissoras comerciais privadas fez com que esse modelo prevalecesse, logo de saída, em relação à televisão pública – em que o serviço prestado não visa ao lucro, mas à educação e ao fortalecimento da cidadania do espectador.

FOTO: REPRODUÇÃO

Imagem em preto e branco de homem sério sentado à mesa e mulher de pé ao lado dele rindo

Walter Forster e Vida Alves em ‘Sua vida me pertence’, primeira telenovela brasileira

O primeiro canal público do país, a TV Universitária de Pernambuco, só foi inaugurado em 1968, quando o sistema comercial de televisão já estava consolidado. O efeito disso, do ponto de vista da programação, foi um privilégio histórico do entretenimento, de conteúdos mais atrativos e rentáveis pelas emissoras brasileiras, em detrimento de programas informativos e educativos.

QUANDO a TV brasileira virou uma potência

Se na década de 1950 a televisão no Brasil operava quase como uma extensão da programação radiofônica, nos anos 1960 ela se consolidou, adquiriu processos próprios e se expandiu no território nacional.

Também foi a partir desse momento que sua influência aumentou e ela se converteu em um poderoso veículo de massa, capaz de moldar a opinião pública e comportamentosinclusive de consumo da população.

Contribuiu para isso a introdução do videotape, o VT, um recurso que possibilitou a criação de novas estratégias de programação para ampliar a audiência. Isso tornou a televisão mais rentável, atraindo mais anúncios e aumentando o lucro das emissoras.

Foi uma das estratégias adotadas a veiculação de um mesmo programa em vários dias da semana. As novelas, por exemplo, se tornaram diárias – isso só se tornou viável porque o VT permitia a gravação antecipada de vários capítulos. Antes, eram exibidos programas diferentes a cada dia.

Essa mudança foi importante porque criou o hábito de assistir televisão, tornando-a parte da rotina da população e prendendo a atenção dos telespectadores. Foi também com o VT que a programação televisiva passou a ser nacionalmente integrada.

Outro acontecimento fundamental para a consolidação da TV no Brasil foi a aprovação de legislações para o setor no início da década de 1960.

Após anos de negociações, o Congresso Nacional aprovou em 1962 o Código Brasileiro de Telecomunicações e, em 1963, o Regulamento dos Serviços de Radiodifusão . Essas normas estruturaram o funcionamento da indústria da TV. Com alterações, ambos permanecem em vigor até os dias de hoje.

A partir do golpe de 1964, que deu início à ditadura militar, a TV passou a desempenhar um papel estratégico na política de integração nacional defendida pelos governos militares. Houve um impulso à atividade por meio de decretos, leis e medidas econômicas que favoreceram o mercado da TV e, notadamente, o acesso aos televisores.

Políticas de crédito provocaram um salto na aquisição desses aparelhos e, consequentemente, no número de domicílios com TVs no país entre o final da década de 1960 e o início dos anos 1970, no período do chamado milagre econômico.

Em seu livro A TV no Brasil do século 20 , o professor da Universidade Federal da Bahia Othon Jambeiro afirma que o Brasil passou de cerca de dois milhões de aparelhos de TV em 1964 para aproximadamente nove milhões em 1974, quando ela já estava presente em 43% dos lares brasileiros.

Uma das ressalvas feitas à aceleração do crescimento econômico e a ampliação do acesso a bens de consumo “modernos” pela população alcançados nessa época é que a política econômica do regime também aumentou a concentração de renda e as desigualdades.

Além do incentivo à TV promovido pelo regime, novas emissoras surgiram nos anos 1960, com destaque para a fundação da TV Globo em 1965 pelo jornalista e empresário Roberto Marinho (1904-2003).

QUAL o papel da Globo na relevância da TV

Embora a emissora só tenha sido inaugurada anos mais tarde, a concessão para dar início a um serviço de transmissão de TV foi outorgada à Rádio Globo pelo então presidente Juscelino Kubitschek, em 1957. Roberto Marinho, que comandava a rádio, havia herdado o jornal O Globo, fundado em 1925 por seu pai, Irineu Marinho, e vinha expandindo os negócios da família nas décadas de 1940 e 1950.

No início da década de 1960, a empresa começou a construir sua sede no bairro do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, e assinou um acordo com o grupo multinacional americano Time-Life, que forneceria capital e apoio técnico para a implantação da nova emissora.

A parceria era irregular – a constituição de 1946 proibia grupos estrangeiros de interferir e auferir lucro com empresas de comunicação nacionais – e foi denunciada pelo jornalista e político Carlos Lacerda dois meses depois da fundação da emissora, em 1965.

A questão foi investigada pelo Conselho Nacional de Telecomunicações e por uma Comissão Parlamentar de Inquérito que se encerrou em 1966 com um parecer desfavorável à Globo. O acordo foi encerrado em 1971, mas a essa altura já havia garantido uma vantagem significativa à emissora sobre as concorrentes com o equipamento de última geração e o “know-how” fornecidos pela multinacional americana.

Assim, a emissora passaria a se destacar por seu planejamento administrativo, sua gestão do público e da publicidade. Ela capturou parte da audiência em crescimento com o “boom da televisão” no fim da década de 1960 através de programas populares – como novelas e atrações que misturavam concursos de calouros e brincadeiras, comandados por figuras como Chacrinha, Silvio Santos e Dercy Gonçalves. Com isso assumiria a liderança antes ocupada pela TV Tupi, que começava a entrar em crise.

No final dos anos 1960, a Globo também começou a adquirir emissoras em outras capitais, ampliando seu poder e formando paulatinamente a estrutura em rede que a caracteriza até hoje.

Contribuiu ainda para que a emissora alcançasse a liderança na criação do que é conhecido como “padrão Globo de qualidade”, conjunto de regras desenvolvido por Walter Clark (1936-1997) e José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni (nascido em 1935), que norteia a operação da emissora em relação a aspectos técnicos, estéticos, comerciais e jornalísticos.

Em 1969, a emissora colocou no ar o Jornal Nacional, primeiro telejornal diário a atingir praticamente todo o território do país. Isso se tornou possível porque a TV Globo foi pioneira na instalação de microondas (importadas dos EUA) que ligaram em rede as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, onde ela já possuía filiais. Antes disso, era preciso recorrer ao envio de videotapes para essas cidades.

Pouco depois, a emissora passou a contratar os serviços da Embratel (Empresa Brasileira de Telecomunicações), que começava a operar via satélite no fim da década de 1960 e, em 1970, já havia interligado as principais cidades brasileiras por uma rede nacional de microondas, como parte do projeto militar de integração nacional.

FOTO: DIVULGAÇÃO/MEMÓRIA GLOBO

Imagem em preto e branco de dois homens sentados atrás de bancada de telejornal, com equipamento em primeiro plano

Cid Moreira (à esq.) e Hilton Gomes, primeira dupla de apresentadores do Jornal Nacional

O telejornal desempenhou um papel relevante nesse projeto e na expansão da emissora. Desde o início, foi estrategicamente posicionado entre duas novelas. Introduziu uma série de inovações tecnológicas no telejornalismo brasileiro, com imagens diretas de diferentes capitais, câmeras portáteis que permitiam maior agilidade e um formato inspirado no telejornalismo americano.

Em termos de conteúdo, porém, o Jornal Nacional já nasceu sob o jogo da censura – institucionalizada pelo AI-5, de 1968 –, que controlava o que ia ao ar e como, principalmente com relação aos assuntos nacionais. Mais do que não desafiar a censura, a emissora procurava agradar o regime militar com a transmissão de eventos e a divulgação de projetos do governo, além de reportagens sobre o Brasil em tom grandioso e ufanista.

A proximidade de Roberto Marinho com os militares e o apoio editorial de seu grupo midiático à ditadura foram tratados em mea culpa publicado pelo jornal O Globo em 2013.

Na década de 1970, quando a emissora já reinava absoluta como campeã de audiência, algumas novidades importantes foram introduzidas e contribuíram para reforçar sua posição hegemônica.

FOTO: DIVULGAÇÃO/HOMEM DE TERNO VERDE E CHAPÉU SORRINDO CERCADO DE TRÊS MULHERES

Homem de terno verde e chapéu sorrindo cercado de três mulheres

Cena de ‘O bem-amado’, primeira novela a cores da TV brasileira, de 1973

Uma foi a criação do primeiro departamento de pesquisa e análise voltado a investigar hábitos e tendências do telespectador brasileiro, aplicando esses conhecimentos na produção dos programas da Globo, com destaque para as novelas. Outra foi a inauguração da tecnologia da TV em cores no país em 1972, implantada primeiro pela Globo devido ao alto investimento requerido e à importância dada à TV colorida pelo regime militar.

COMO as novelas viraram referência cultural

A introdução do videotape no início da década de 1960 possibilitou a instauração de uma das principais marcas da televisão brasileira até os dias hoje: a telenovela diária. O Brasil (e, atualmente, em particular a TV Globo) se firmou como uma potência no gênero, com nosso produto audiovisual mais popular sendo exportado e exibido em vários países do mundo.

A primeira novela da TV brasileira a ser exibida diariamente foi “2-5499 Ocupado”, da TV Excelsior, em 1963. A trama também reuniu pela primeira vez o par romântico Glória Menezes e Tarcísio Meira – os atores se tornaram um dos casais mais famosos da teledramaturgia nacional.

No ano seguinte, já nesse novo modo de exibição, teve início o primeiro grande sucesso da teledramaturgia nacional: “O direito de nascer”. Produzida em uma parceria da TV Tupi de São Paulo com a TV Rio, a novela foi exibida entre 1964 e 1965 e costuma ser apontada por inaugurar a febre das novelas no país. Sua popularidade foi tão grande que o país “parou” em 13 de agosto de 1965 para assistir ao último capítulo da novela.

As telenovelas brasileiras do início da década de 1960 ainda estavam carregadas de um estilo teatral de interpretação e consistiam em melodramas escritos ou adaptados de autores latino-americanos consagrados no gênero.

Foi principalmente a partir da novela “Beto Rockfeller”, exibida entre 1968 e 1969 pela TV Tupi, que as novelas passaram a contar com as características que distinguem a teledramaturgia brasileira em termos de linguagem, técnica, temáticas e tramas.

Ela introduziu um estilo mais natural de interpretação, diálogos coloquiais, ambientação urbana e um anti-herói no papel principal. Além de sucesso de público, teve forte impacto na teledramaturgia nacional. A partir daí, as novelas passaram a tratar de temas do cotidiano brasileiro, fornecendo ao público uma fantasia com gosto de realidade .

A novidade não foi capaz de salvar a Tupi, que ficaria na vice-liderança até sua extinção em 1980. Mas foi absorvida pela TV Globo, que se inspirou em “Beto Rockfeller” para modernizar e abrasileirar suas novelas.

A emissora demitiu a cubana Glória Magadan, autora de produções exibidas em seus primeiros anos, e colocou no ar, em 1969, “Véu de noiva”, da novelista Janete Clair (1925-1983), que deu início a uma nova fase para a teledramaturgia da TV Globo.

Como um produto cultural de massa, amplamente consumido pelos brasileiros, as novelas influenciaram comportamentos e opiniões da população ao longo das décadas.

Dois estudos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) divulgados em 2009 estabeleceram relação entre a expansão do sinal da TV Globo, a queda nas taxas de fertilidade no país e o aumento no número de mulheres que se separaram ou divorciaram a partir, respectivamente, das décadas de 1970 e 1980.

ONDE a TV brasileira vai buscar referências

Para além dos equipamentos importados dos Estados Unidos, vários formatos de programas dos primórdios da televisão brasileira já se inspiravam em atrações americanas.

Além disso, emissoras nacionais se apoiaram sobretudo a partir da década de 1960 na exibição de filmes e séries “enlatadas”, importadas da TV americana. O telejornalismo do país também foi a base para as inovações introduzidas pelo Jornal Nacional da TV Globo no final da década de 1960.

A influência americana se estende a outras áreas da cultura e o Brasil não é o único país a ser alvo dela, que se tornou um fenômeno praticamente global com a hegemonia alcançada pelos EUA no pós-guerra.

Nas últimas décadas, porém, ummercado transnacional de formatos televisivos se formou e eles deixaram de ser importados somente dos EUA. Segundo o sociólogo Jean Chalaby, professor da City University de Londres, trata-se do paradigma da transnacionalização , no qual as comunicações globais se encontram no século 21.

FOTO: REPRODUÇÃO

Homem negro sorrindo usando coroa

O ator Babu Santana na 20ª edição do Big Brother Brasil, reality show da TV Globo

Hoje essa adaptação de formatos de sucesso mundial ao público brasileiro vem sendo feita por várias emissoras, na TV aberta e fechada. “Big Brother”, “The Voice”, “A fazenda”, “De férias com o ex”, “Quem quer ser um milionário”, exibidos pela TV brasileira, são todos sucessos globais importados por emissoras nacionais. É uma aposta segura naquilo que já obteve sucesso comercial em vários países.

POR QUE as novas tecnologias mudam o jogo

A partir da década de 1990, iniciou-se a chamada “fase da multiplicidade da oferta” na televisão brasileira, caracterizada por uma quantidade maior de canais disponíveis ao consumidor.

Isso se deu com o surgimento de mais emissoras de sinal aberto (incluindo canais segmentados, voltados a públicos específicos) e à chegada de tecnologias de TV por assinatura ao Brasil. O cenário levou a um acirramento da competição entre as principais emissoras da TV aberta, que viram seu público diminuir, e à migração das classes mais altas para a TV paga.

TVs por assinatura estão submetidas a processos próprios de concessão, distintos das licitações para a TV aberta. Elas também respondem à Agência Nacional de Telecomunicações e devem obedecer à lei nº 12.485/2011 , a lei da TV paga, e às normas da resolução nº 581/2012 .

A legislação de 2011 proibiu o controle de operadoras (empresas como Sky, Net e outras que fornecem o serviço) e canais por um mesmo grupo, limitando a participação cruzada a 30%. O Grupo Globo, que estava no controle da Net, foi forçado a sair em 2012. A lei da TV paga também criou cotas de programação nacional para os canais por assinatura.

A audiência da TV aberta seguiu em queda a partir dos anos 2000, quando a internet se expandiu e popularizou no país. De 2001 a 2020, todas as emissoras de sinal aberto, com exceção da Record, caíram em audiência e share . A Globo, que ainda lidera, perdeu 20% de seus telespectadores nessas duas décadas.

O declínio é atribuído a uma mudança de comportamento dos espectadores quanto ao consumo de informação e entretenimento, motivada pelo surgimento de novas mídias e por um desgaste com relação à estrutura de programação da TV tradicional.

A TV passou a disputar sua hegemonia no espaço doméstico com as telas de outros dispositivos, como smartphones e tablets, e com plataformas diversas que colocam em xeque a ideia de uma programação fixa e linear imposta aos espectadores.

A face mais recente dessas transformações é representada pelos serviços de vídeo sob demanda. O primeiro streaming de vídeo a chegar no país, em 2011, foi a Netflix, atual líder do mercado mundial.

Hoje, há uma proliferação na oferta de serviços do tipo a nível internacional e nacional. As bases de assinantes vêm crescendo e foram impulsionadas, nos últimos meses, pela pandemia do novo coronavírus.

Com base em dados da Kantar Ibope Media, o streaming não só superou pela primeira vez em maio de 2020 a audiência de TV paga no Brasil como deve deixar para trás, em breve, a TV aberta. Em junho de 2020, a única emissora de sinal aberto com maior audiência que o streaming foi a TV Globo .

Nos anos 2010, as principais emissoras lançaram seus próprios aplicativos e plataformas.

Em alguns casos, como do SBT App, trata-se apenas de uma “segunda tela” com a programação do canal disponível online. Em outros, como do Globoplay, há um investimento significativo da rede no streaming e o serviço não só disponibiliza a programação da emissora como produz conteúdos originais e compra séries e filmes, em um modelo mais próximo a serviços como a Netflix.

As emissoras também têm procurado ampliar sua presença nas redes sociais, seja com a criação de programas transmitidos somente nas redes ou explorando as possibilidades de interação com o público que elas oferecem.

Já decretada diversas vezes, a morte da TV é desacreditada por especialistas no tema. Eles admitem, no entanto, que o público televisivo pode ficar mais restrito, como ocorreu com diferentes formas de expressão e comunicação ao longo da história a partir do surgimento de alguma inovação técnica.

Uma série de conceitos surgidos na Academia em décadas recentes buscam apontar um futuro para a TV na era digital, como hiperTV, pós-TV e TV em expansão. Eles abrem espaço para a conectividade da TV, para a integração dela com outras mídias e para uma participação maior de quem assiste na construção dos conteúdos.

POR QUE a TV aberta ainda é relevante no Brasil

Segundo dados de 2018 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a televisão segue presente em quase todos os domicílios do país, mesmo com uma pequena retração no percentual de lares com TV em relação ao ano anterior e o crescimento de outras mídias.

96,4%

dos domicílios participantes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE em 2018 tinham televisão

Além disso, com pouco ou nenhum acesso a equipamentos culturais como cinemas, teatros e museus, a televisão segue sendo o principal – e, com frequência, o único – bem cultural consumido por muitos brasileiros.

Foi o que apontou um levantamento do Sistema de Informações e Indicadores Culturais, que cruza dados de diversas pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgado em dezembro de 2019.

Segundo a pesquisa, a crise econômica levou a uma queda generalizada na capilaridade dos equipamentos culturais e meios de comunicação entre 2014 e 2018 no país. Em contraste, como indica o percentual destacado acima, a TV ainda chega a quase todos os lares e municípios, sem distinção de raça, gênero, escolaridade ou renda.

FOTO: WIKIMEDIA COMMONS

Homem e mulher sentados em bancada de telejornal diante de câmera

Em 2010, o jornalista William Bonner entrevista a então candidata à presidência da república, Dilma Rousseff

Embora sua influência já não seja forte o suficiente para explicar sozinha os abalos sísmicos ocorridos na política brasileira dos últimos anos, há o argumento de que a televisão teve um papel decisivo no encaminhamento da crise política que levou ao impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016.

Houve uma ampla cobertura das manifestações pró-impeachment ocorridas entre 2015 e 2016, caracterizadas como positivas , pacíficas e familiares, enquanto manifestações favoráveis ao governo tiveram pouco espaço na televisão.

Já no governo atual, mesmo com o destaque dado à comunicação direta de Jair Bolsonaro com seus apoiadores via redes sociais, as televisões não perderam seu papel político. Canais como o SBT de Silvio Santos e a Record de Edir Macedo se alinham ao governo e fazem, desde o início do mandato do presidente em 2018, uma cobertura mais branda das crises enfrentadas por ele.

Outro indício da relevância da TV aberta para os brasileiros foi o reforço de sua função informativa durante a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus.

No início da pandemia, a audiência de TV teve um crescimento significativo no país, motivado pelo isolamento social – mais pessoas em casa por mais tempo – e pela busca de informações sobre a covid-19. O jornalismo ampliou seu espaço na programação da TV aberta e a intensificação do consumo também se refletiu em mais comentários sobre programas de TV nas redes sociais.

Em um levantamento realizado pelo Datafolha em março de 2020, os programas jornalísticos da TV foram apontados como a fonte de informações sobre o novo coronavírus em que as pessoas mais confiavam , à frente da mídia escrita, do rádio e das redes sociais.

Os noticiários não foram os únicos a registrar uma audiência mais expressiva no início da crise sanitária. A vigésima edição do reality show Big Brother Brasil, exibido pela Globo, se encerrou em abril com sua maior audiência desde 2010 , um desempenho alimentado em grande medida pelas redes sociais .

Essa união entre a TV e as mídias sociais é definida por pesquisadores como TV Social (“social television”, em inglês) e tem sido capaz de renovar e dar novo fôlego à audiência de alguns programas da TV aberta brasileira, como realities, novelas e programas de entrevista , além de pautar o debate nas redes.

NO MUNDO: o futuro da TV

As transformações na forma de ver televisão provocadas por novas tecnologias são globais e estão sendo sentidas pela indústria tradicional de televisão em todo o mundo.

Com base em informações do site de estatísticas Statista, o número de domicílios com televisores no mundo cresceu (de 1,47 para 1,67 bilhão) entre 2010 e 2018, e os rendimentos da TV tradicional no mundo em 2018 ainda superavam grandemente o faturamento das TVs online.

Apesar de projetar que a TV continuará a fazer parte do cotidiano das pessoas de uma forma ou de outra, o relatório divulgado em 2019 pela Statista projetou uma estagnação da indústria tradicional de televisão nos anos seguintes, a nível global, com as novas tecnologias de TV rapidamente assumindo seu lugar.

Essa tendência já se confirma no crescimento contínuo do número de usuários dos serviços de vídeo sob demanda em anos recentes e no declínio observado na audiência dos principais canais de TV em diferentes países.

Uma pesquisa encomendada pelo jornal britânico Financial Times aponta que a Netflix, que lidera o mercado global de streaming, deve superar os investimentos de todas as suas principais concorrentes (como os conglomerados ViacomCBS e NBCUniversal) no ramo do entretenimento em 2020, excluindo a compra de direitos esportivos.

Segundo o Financial Times, a pandemia do novo coronavírus aumentou o fosso entre o “poder de fogo” dos serviços de streaming e das emissoras cujo modelo de negócio se apoia em publicidade, que estão em desvantagem crescente.

Grandes grupos tradicionais de mídia têm tentado reagir às mudanças, entrando no mercado do streaming e buscando se manter relevantes dentro dos novos arranjos de consumo.

EM ASPAS: a TV falada

“[Temos agora] um sinal da mais subversiva máquina de influenciar a opinião pública – uma máquina que dará asas à fantasia mais caprichosa e poderá juntar os grupos humanos mais afastados”

Assis Chateaubriand

em seu discurso de inauguração da TV Tupi, em 18 de setembro de 1950

“Sinto-me feliz, todas as noites, quando ligo a televisão para assistir ao Jornal [Nacional]. Enquanto as notícias dão conta de greves, agitações, atentados e conflitos em várias partes do mundo, o Brasil marcha em paz, rumo ao desenvolvimento. É como tomar um calmante após um dia de trabalho”

Emílio Garrastazu Médici

general e presidente do Brasil entre 1969 e 1974, período de maior repressão da ditadura militar

“O teatro é a arte do ator, o cinema é a arte do diretor, e a televisão é a arte do patrocinador”

Paulo Autran

ator, em entrevista ao programaRoda Viva

“Se existe um poder soberano neste país, é a Rede Globo de Televisão. E o mais importante é que ela exerce esse poder graças ao Governo Federal, e sem ter sido eleita por pessoa alguma. Só em uma ditadura poderia existir semelhante poder sem controle social”

Betinho

sociólogo e ativista, no livroRevoluções da minha geração

“Há muita produção de alta qualidade na televisão, como em qualquer outro meio. Venho praticando uma luta árdua de mostrar quanta inteligência tem na TV, desde 1950 até hoje”

Arlindo Machado

professor e pesquisador, em entrevista à SonharTV em 2012

NA ARTE: obras sobre a TV

“Absolutamente certo!” (1957) , longa de ficção de Anselmo Duarte que expõe, em um dos núcleos de seu enredo, os bastidores de um programa televisivo de perguntas e respostas. É provavelmente a primeira obra do cinema nacional a se voltar para o novo meio de comunicação

“Tropicália” (1967) , instalação de Hélio Oiticica composta, entre outros elementos, por um aparelho de televisão

Adote um satélite (1989) , vídeo-instalação do cineasta Marcelo Masagão que fez a um só tempo uma homenagem e uma sátira à televisão

Transmissões da 3 Antena , TV pirata que atuou no Rio de Janeiro entre 1987 e 1990, que usavam sequências capturadas das emissoras legais para debochar da imagem do país projetada por elas no período logo após a redemocratização. A emissora clandestina venceu do Prêmio júri popular do 8˚ Festival Internacional de Vídeo Fotoptica, atual Videobrasil, em 1990

“Um dia na vida” (2010) , filme de Eduardo Coutinho que registra um dia de programação da TV aberta brasileira, entre comerciais e programas de vários canais

Vá ainda mais fundo

  • “101 atrações de TV que sintonizaram o Brasil”, Patrícia Kogut
  • “Almanaque da telenovela brasileira”, Nilson Xavier
  • “A televisão levada a sério”, Arlindo Machado
  • “A televisão na era digital: Interatividade, convergência e novos modelos de negócio”, Newton Cannito
  • Estratégias de Transmidiação na Ficção Televisiva Brasileira”, Maria Immacolata Vassallo de Lopes (org.)
  • “Hebe: A biografia”, Artur Xexéo
  • “Herói mutilado: Roque Santeiro e os bastidores da censura à TV na ditadura”, Laura Mattos
  • “História da televisão brasileira: Uma visão econômica, social e política”, Sérgio Mattos
  • Sistemas públicos de comunicação no mundo: Experiências de doze países e o caso brasileiro”, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
  • “Sobre a televisão”, Pierre Bourdieu

NEWSLETTER GRATUITA

Nexo | Hoje

Enviada à noite de segunda a sexta-feira com os fatos mais importantes do dia

Este site é protegido por reCAPTCHA e a Política de Privacidade e os Termos de Serviço Google se aplicam.

Gráficos

nos eixos

O melhor em dados e gráficos selecionados por nosso time de infografia para você

Este site é protegido por reCAPTCHA e a Política de Privacidade e os Termos de Serviço Google se aplicam.

Navegue por temas