Expresso

Um esforço para pôr as energias renováveis na agenda parlamentar

Mariana Vick

20 de março de 2021(atualizado 28/12/2023 às 23h31)

Mais de 200 deputados criam frente parlamentar para propor mudanças legislativas e estimular o setor. Fontes não poluentes são vistas como oportunidade para retomada econômica 

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FOTO: BRUNO DOMINGOS/REUTERS

Em foto de baixo para cima, homem negro maneja ferramentas em meio a uma plantação com culturas de maior estatura que ele

Trabalhador agrícola corta cana de açúcar em plantação

Mais de 200 deputados federais pediram à Câmara na quarta-feira (17) a criação da Frente Parlamentar de Energia Renovável . O grupo afirma que irá atuar para ampliar a participação de fontes de energia sustentáveis e sem emissão de gases de efeito estufa na matriz energética brasileira.

A FPE, como vem sendo chamada pelos deputados, busca concentrar no Congresso os principais pleitos do setor de renováveis, debatendo e propondo mudanças legislativas que possam impulsionar segmentos como o de energia eólica, solar, hidrelétrica e de biomassa, entre outros.

Considerado relevante para a economia do país, que é rico em recursos naturais que podem ser transformados em fonte de energia, o setor de renováveis vem despertando interesse à medida que cresce a percepção dos riscos ligados à mudança climática , causada em parte pelo uso de combustíveis fósseis.

46,1%

foi a participação das energias renováveis na matriz energética nacional em 2019

O grupo reúne parlamentares de diferentes partes do espectro político, a maioria dos quais não são tradicionalmente alinhados a grupos ambientalistas. Eles dizem que o setor pode impulsionar o desenvolvimento econômico do país e uma retomada após a pandemia do novo coronavírus , responsável pela atual crise econômica.

A criação da frente foi oficializada em evento em área cedida pela Frente Parlamentar da Agropecuária no Congresso. Estiveram presentes os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente), Tereza Cristina (Agricultura) e Bento Albuquerque (Minas e Energia).

As frentes parlamentares são associações de congressistas de diferentes partidos para “debater sobre determinado tema de interesse da sociedade”, segundo definição da Câmara dos Deputados. Existem mais de 300 frentes registradas no site da casa nesta legislatura — incluindo algumas mais conhecidas, como a Evangélica, a Agropecuária e a da Segurança Pública.

A FPE não é a primeira frente a tratar do tema das energias renováveis. Desde janeiro de 2019, o Congresso registrou a criação de pelo menos outras quatro que fazem referência ao assunto. Em ascensão desde 2003, as frentes parlamentares bateram recorde nesta legislatura. Para deputados, a sinalização de que o governo federal dialogaria com as bancadas, e não com partidos, impulsionou o aumento.

Quais são as propostas da frente

A frente parlamentar afirma em seu estatuto que busca trabalhar pela retomada do “crescimento econômico sustentável” com a ampliação do uso de renováveis, favorecer um ambiente de negócios “amigável” a investimentos na área e propor ações de universalização da energia elétrica, entre outros.

A agenda inicial da frente inclui a criação de um novo marco regulatório para a instalação de painéis solares em residências e empresas, segundo o grupo. Outras prioridades são as chamadas PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) e a geração de energia por meio da exploração de hidrogênio.

FOTO: PAULO WHITAKER/REUTERS – 26.ABR.2017

Turbina eólica com três lâminas em uma praia. Atrás, vê-se o céu azul, o mar, árvores e a cidade.

Turbina eólica em Fortaleza, no Ceará

Em seu estatuto, a FPE fala também em ações como ampliar a participação do uso de biomassa (como a cana-de-açúcar, que produz o etanol) na matriz energética no país, eletrificar o setor de transportes e debater tecnologias que aumentem a eficiência de geração energética, com destaque para a agropecuária.

Embora se trate também de energia considerada limpa, a energia nuclear não está entre as prioridades da frente parlamentar. “A geração nuclear é uma energia cara, em que o preço depende de dinheiro público”, disse o presidente da FPE, o deputado Danilo Forte, ao jornal O Estado de S.Paulo.

Com a aproximação da COP-26, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que será realizada em novembro, na Escócia, o interesse pelas renováveis cresceu dentro do governo, segundo o parlamentar. “O mundo pede uma resposta do Brasil”, ele disse ao Estado de S.Paulo.

Desde o início do governo de Jair Bolsonaro, cresceram as pressões sobre a política ambiental do país, por conta do aumento do desmatamento e de queimadas em biomas como a Amazônia, além da descontinuação de políticas públicas de conservação. Com o governo Bolsonaro, cresceram também os ataques a órgãos ambientais no país.

Quais são as principais renováveis

Energia solar

É a energia elétrica ou térmica gerada por meio do uso do sol como fonte primária, explica texto doNexo Políticas Públicas. A produção de energia solar mais comum se dá via painéis fotovoltaicos, que utilizam a luz do sol para gerar eletricidade, e via aquecedores solares, que geram calor por meio de placas que absorvem a radiação solar.

Energia eólica

É a energia elétrica produzida a partir do ar em movimento, segundo o Nexo Políticas Públicas . Nesse processo, a energia cinética criada pelo ar em movimento se transforma em energia elétrica por meio de turbinas eólicas, também chamadas de aerogeradores.

Energia hidrelétrica

É a energia derivada dos recursos hídricos, que acionam turbinas que convertem energia potencial (queda d’água) ou energia cinética (movimento da água) em energia elétrica, segundo o Nexo Políticas Públicas . Para produzir energia, as usinas hidrelétricas devem estar integradas a vazões de rios e a áreas com desníveis de relevo. Embora seja considerada renovável, a energia hidrelétrica vem sendo apontada como responsável por conflitos socioambientais no país.

Bioenergia

É a energia derivada de qualquer forma de biomassa , como madeira, resíduos agrícolas e florestais, resíduos sólidos de origem animal e resíduos sólidos urbanos, segundo o Nexo Políticas Públicas . A bioenergia pode ser tradicional ou moderna — com a conversão da biomassa em calor, eletricidade ou biocombustíveis por meio do uso de tecnologias mais avançadas. Entre esses exemplos, está a conversão da cana-de-açúcar para produção de etanol.

Quem são os deputados

A frente é presidida pelo deputado Danilo Forte (PSDB-CE), que está na Câmara desde 2011 e defende projetos relacionados à energia renovável, ao agronegócio e à industrialização no Ceará. Ele foi presidente da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

O documento que requer a criação da frente parlamentar à Câmara conta com a assinatura de 202 deputados de 23 partidos e todos os estados brasileiros.

A composição inclui nomes como Aécio Neves (PSDB-MG), Alessandro Molon (PSB-RJ), Baleia Rossi (MDB-SP), Bia Kicis (PSL-DF), Celso Russomanno (Republicanos-SP), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Joenia Wapichana (Rede-RR), Luiza Erundina (PSOL-SP), Tabata Amaral (PDT-SP) e Tiago Mitraud (Novo-MG).

Entre os deputados da frente parlamentar, porém, há mais representantes de partidos de centro-direita — como PSDB, PP, MDB e DEM. Os partidos de esquerda mais representados no grupo são PSB e PT. As siglas estão também entre as maiores bancadas da Câmara.

Quais as siglas

Gráfico mostra partidos com mais frequência na frente parlamentar: PSDB, PP, MDB, PSB, PT, DEM, PL, Republicanos, PSD, PDT, PSL. O partido mais frequente, o PSDB, conta com 25 deputados na frente. O PDT e o PSL têm, cada um, 9 deputados.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o presidente da FPE, Danilo Forte, disse acreditar que a frente atrai deputados de diferentes campos do espectro político porque “há uma convicção” geral de que é preciso combater a mudança climática e de que a “menor geração de gases de efeito estufa passa pela produção de energia limpa”.

Em artigo no site Poder360, Forte afirmou também que “o Brasil tem de escolher se ficará na berlinda das cobranças ambientais ou se tomará a dianteira nas propostas de solução” para a crise climática. Embora cite a persistência do desmatamento ilegal — principal fonte de emissões de gases-estufa no país —, ele não fez críticas ao governo federal e elogiou o histórico do Brasil no campo energético, que considera“mais crucial.

Qual o quadro das energias renováveis no país

A energia é uma peça-chave da economia brasileira, e a abundância de recursos naturais no país traz uma série de possibilidades para a sua geração, especialmente quando se trata das fontes de energia renováveis, segundo texto do Nexo Políticas Públicas , plataforma acadêmico-jornalística do Nexo .

A participação de fontes renováveis na matriz energética nacional chegou a 46,1% em 2019, patamar significativamente superior ao do restante do mundo, que é menor que 20%. A cana-de-açúcar e seus derivados são a fonte de maior participação entre as renováveis (18%), seguidos pelas hidrelétricas (12,4%).

FOTO: BRUNO KELLY/REUTERS – 07.10.2015

Homem limpa placas solares em comunidade no Estado do Amazonas

A eólica é a segunda fonte de geração de energia elétrica no país, que hoje ocupa o 7º lugar mundial em capacidade instalada desse tipo de energia — com 18 GW (gigawatts) em 695 parques de geração, segundo a Abeeólica (Associação Brasileira de Energia Eólica). O parque de geração solar, por sua vez, corresponde a 8% da potência nacional.

Embora o país tenha demonstrado interesse em investir na produção de energia de forma limpa nas últimas décadas, o petróleo e seus derivados — cujo uso está entre os principais responsáveis pela mudança do clima — ainda hoje exercem importante papel na matriz energética nacional, com 34,4% de participação, segundo texto do Nexo Políticas Públicas .

Estudos de pesquisadores da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) mostram que, com a crise climática, o Brasil pode se tornar fornecedor de combustíveis limpos para outros países. O cenário, porém, deve depender de uma eventual transição energética nacional e mais investimentos em educação, pesquisa e tecnologia, segundo os cientistas.

Outro estudo, conduzido pelo WRI Brasil, mostrou que adotar um modelo de “ economia verde ” na recuperação da crise causada pela pandemia do novo coronavírus pode adicionar R$ 2,8 trilhões ao PIB brasileiro e gerar 2 milhões de empregos em uma década. Nesse contexto, tecnologias nas áreas de energias renováveis e veículos elétricos podem crescer em escala.

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