7 pontos-chave para entender a política econômica de 2023
Marcelo Roubicek
26 de dezembro de 2023(atualizado 30/12/2023 às 22h48)Reforma tributária, arcabouço fiscal, crescimento acima do esperado, queda de juros. O ‘Nexo’ elenca as principais medidas e movimentos da economia no primeiro ano do terceiro mandato de Lula
Haddad (à esq.) e Lula (à dir.) durante a sessão de promulgação da reforma tributária.
Ao assumir a Presidência em 2023, Luiz Inácio Lula da Silva encontrou uma economia que dava sinais de perda de fôlego e ainda carregava fortes marcas da crise social da pandemia de covid-19. Para enfrentar esse quadro, o petista recorreu a fórmulas que marcaram seus mandatos anteriores (2003-2010), como a ampliação de políticas sociais e aumento do investimento público.
O presidente também deixou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, encarregado de articular medidas para melhorar as contas públicas e, ao mesmo tempo, reformar o sistema tributário brasileiro, considerado amplamente complexo e regressivo. Apesar de fechar o ano rodeado de ceticismo sobre o quadro fiscal, o ministro conseguiu avançar em pautas centrais (incluindo a reforma tributária) e ainda viu a economia apresentar desempenho acima do esperado.
Neste texto, o Nexo elenca e explica sete pontos-chave para entender a condução da economia pelo governo Lula em 2023.
Em 2023, o governo Lula articulou junto ao Congresso a aprovação da reforma tributária, um tema que ficou décadas empacado em Brasília. Trata-se da reformulação e simplificação do sistema de recolhimento de tributos sobre o consumo no Brasil.
A principal medida do texto é reduzir o número de impostos sobre o consumo de cinco para dois. Este gráfico do Nexo explica em mais detalhes as mudanças. A intenção da reforma é reduzir a complexidade do sistema brasileiro e, com isso, trazer ganhos de eficiência na economia, favorecendo o crescimento do país no longo prazo.
A reforma foi promulgada pelo Congresso em 20 de dezembro. Mas há ainda pontos em aberto, que deverão ser tratados por leis complementares que serão publicadas em 2024 — o principal deles é a alíquota do novo sistema tributário. Além disso, o governo planeja uma segunda fase da reforma, dessa vez ligada ao imposto de renda.
Uma das principais frentes da política econômica não cabe ao governo, e sim ao Banco Central, que é autônomo desde 2021. Trata-se da definição da taxa básica de juros, que serve como referência para os juros cobrados pelos bancos em empréstimos, o retorno de títulos do Tesouro e até o rendimento da caderneta de poupança.
Em 2023, Lula pressionou o presidente do BC, Roberto Campos Neto, para que o órgão baixasse os juros — que, descontando a inflação, estavam no maior patamar do mundo. O argumento era que o nível elevado da Selic (de 13,75% ao ano durante o primeiro semestre) iria atrapalhar o crescimento da economia. O presidente também citava preocupação com o nível de endividamento da população — para enfrentar isso, o governo lançou o Desenrola, programa de renegociação de dívidas.
Após meses de pressão e queda da inflação, o Banco Central iniciou em agosto um ciclo de corte da taxa básica, que chega ao final de 2023 em 11,75% ao ano. A expectativa de economistas para 2024 é que a Selic continue em queda, podendo chegar a 9% ao ano.
Durante a campanha presidencial de 2022, Lula prometeu acabar com o teto de gastos, regra que limitava a despesa pública a um nível pré-determinado e que havia sido driblada em diversas ocasiões por Jair Bolsonaro (2019-2022). No lugar dessa norma, propôs o novo arcabouço fiscal, aprovado pelo Congresso. O objetivo posto por Haddad é trazer as contas públicas para o azul já em 2025.
O novo marco, resumidamente, prevê que o gasto público cresça em termos reais em todos os anos, em uma faixa entre 0,6% e 2,5%. O tamanho do aumento é condicionado ao desempenho da arrecadação no ano anterior. Outro pilar do arcabouço é a perseguição de uma meta fiscal a cada ano — se a meta não for atingida, o governo sofre uma punição e tem que gastar menos.
O ano de 2024 será o primeiro em que o arcabouço vai valer. Um dos pontos mais importantes nesse primeiro momento será o cumprimento ou não da meta fiscal, tema que alimentou discussões entre economistas e entre políticos em 2023.
Para 2024, Haddad propôs uma meta fiscal de deficit zero — ou seja, que o cálculo de receitas menos despesas (sem considerar o pagamento de juros da dívida pública) resulte em zero. Para alcançar esse objetivo, o ministro da Fazenda apostou principalmente no aumento da arrecadação do governo. Entre as medidas aprovadas para isso no Congresso, estão:
Apesar da aprovação dessas medidas, ainda há ceticismo entre economistas e agentes do mercado financeiro — e mesmo dúvidas dentro do governo — sobre a viabilidade do deficit zero em 2024. Há diferentes motivos para isso: desde cálculos de que essas medidas são insuficientes para atingir a meta, até o desempenho ruim das contas públicas em 2023.
Na quinta-feira (28), Haddad anunciou novas medidas para perseguir o objetivo fiscal de 2024, incluindo a reoneração gradual da folha de setores da economia e a reformulação de um programa emergencial para os setores da aviação e do entretenimento lançado durante a pandemia.
Os resultados negativos das contas públicas em 2023 se devem a uma combinação entre frustração de receitas e ampliação de despesas. Os gastos expandidos podem ser atribuídos principalmente a montantes maiores destinados aos benefícios previdenciários e ao Bolsa Família.
No caso dos benefícios previdenciários, isso reflete a política de valorização do salário mínimo retomada por Lula em 2023. Isso porque o mínimo serve como referência para o reajuste dos benefícios. Já a expansão do Bolsa Família era uma bandeira central da campanha de Lula nas eleições de 2022. Ela foi possível por causa da aprovação da PEC da Transição em dezembro daquele ano, que permitiu gastos maiores em 2023.
Para 2024, o Bolsa Família deverá ter uma verba de cerca de R$ 170 bilhões, de acordo com o Orçamento aprovado pelo Congresso. O valor fica um pouco abaixo do montante de 2023. Já o salário mínimo deve ir de R$ 1.320 para R$ 1.412, com aumento real próximo de 3% — seguindo a nova regra de correção do piso articulada por Lula.
Outro objetivo colocado por Lula foi retomar os investimentos públicos, que em 2022 estavam em nível historicamente baixo em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). A ideia era resgatar o papel do governo enquanto indutor do crescimento econômico.
Para isso, a principal medida foi o lançamento do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O programa prevê R$ 1,7 trilhão em investimentos, com R$ 1,4 trilhão até 2026. O dinheiro deve vir de diferentes fontes, como o setor privado, o Orçamento da União, os bancos públicos e a Petrobras.
Os planos do governo para o PAC em 2024, no entanto, foram modificados pelo Congresso durante a tramitação do Orçamento. Os deputados e senadores reduziram em R$ 6,3 bilhões a verba do programa, que ficou em cerca de R$ 55 bilhões. Além disso, aprovaram valores recordes para emendas parlamentares e elevaram substancialmente os recursos destinados ao fundo eleitoral.
Na entrada de 2023, economistas e agentes do mercado financeiro projetavam que o Brasil teria um ano de baixo crescimento econômico. Nos três primeiros trimestres do ano, o PIB cresceu 1,9%, 0,9% e 0,1%, respectivamente. Apesar da tendência de desaceleração, os três resultados vieram acima do estimado por economistas, em boa medida por causa do bom desempenho do agronegócio.
O PIB deve fechar 2023 com alta total de cerca de 3%, acima do 0,8% projetado por agentes de mercado no início do ano. Para 2024, a projeção do mercado é que o crescimento seja próximo de 1,5% — o governo calcula um resultado superior, de cerca de 2,5%.
No final de 2022, os agentes de mercado também projetavam para 2023 uma inflação de 5,31%. Mas o resultado deve ficar próximo de 4,45% — abaixo das expectativas iniciais e dentro do intervalo da meta do Banco Central (entre 1,75% e 4,75%). Para 2024, os agentes calculam que os preços vão subir 3,91%, enquanto o governo estima uma alta de 3,55%.
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