“A favela venceu?”: a interpretação da cidade do Rio de Janeiro a partir da Análise de Conteúdo nas letras das músicas Funk
Autoria
Verônica Rodrigues Azevedo Almeida de Lima
LattesÁrea e sub-área
Ciências Humanas/Geografia Urbana
Publicado em
03/03/2023
Como participar?
Derivado de um ritmo que veio dos EUA, o funk brasileiro se consolidou como gênero musical nas favelas do Rio de Janeiro a partir da década de 1980. Mais tarde ele se espalharia para todo o país, e ganharia prestígio como um estilo tipicamente brasileiro, com uma batida eletrônica dançante e temas que vão de encontro com as realidades, tópicos de importância e esperanças de lugares periféricos e geralmente negligenciados da sociedade.
Esta pesquisa analisa letras de músicas funk a fim de investigar como elas representam as experiências vividas por seus autores em favelas do Rio de Janeiro.
Como o funk expõe as experiências dos moradores das favelas cariocas?
Na contemporaneidade, compreender a cidade e seus conflitos requer mais do que análises puramente técnicas ou econômicas. A realidade urbana se constrói a partir das vivências de seus habitantes, especialmente daqueles que, historicamente, têm suas vozes marginalizadas.

Baile funk em favela
Esta pesquisa não apenas coloca em evidência uma forma de expressão cultural muitas vezes criminalizada, mas também proporciona uma importante reflexão sobre as desigualdades urbanas. As letras de funk são ferramentas poderosas de análise, pois revelam as experiências, reivindicações e o cotidiano dos funkeiros – majoritariamente jovens, negros e moradores de favelas. O funk, no contexto da pesquisa, não é apenas entretenimento, mas um movimento sociocultural e político.
Esta pesquisa teve como objetivo interpretar a cidade do Rio de Janeiro sob a ótica dos moradores das favelas, por meio da análise de letras de músicas funk. O trabalho explorou como o funk carioca, especialmente em canções de MCs como Poze do Rodo, Cabelinho e Tikão, revela as vivências, conflitos e reivindicações de um grupo social historicamente marginalizado.
A metodologia utilizada foi a análise de conteúdo, complementada por pesquisas bibliográficas e documentais. Foram examinadas letras de músicas de funk que tratam de temas como a relação dos funkeiros com a favela, os conflitos enfrentados na cidade e as perspectivas de futuro desses moradores.
Os resultados mostraram que o funk, além de expor as dificuldades enfrentadas por quem vive nas favelas, atua como uma forma de protesto e um canal de expressão política para as classes populares. Mostraram também que a pergunta “A favela venceu?” traz uma resposta complexa e multidimensional, refletindo tanto conquistas quanto desafios e dificuldades que os moradores das favelas continuam enfrentando.
Dentre as “vitórias” está o fato de que o funk se tornou um movimento de resistência que atravessa fronteiras sociais e midiáticas, ajudando a tornar mais visíveis realidades desafiadoras dos espaços onde o gênero nasceu, antes ignorados e estigmatizados por outras parcelas da sociedade. Dentre as lutas que persistem há aspectos como as desigualdades sociais e econômicas que continuam marcando a vida da maioria dos moradores e que fazem persistir problemas como violência policial, preconceito racial, exclusão social e falta de políticas públicas eficientes.
Além disso, observou-se que as letras de funk analisadas revelam não apenas a denúncia dos problemas, mas também uma forte esperança de transformação e o desejo de um futuro em que a favela seja respeitada e integrada como parte legítima da cidade.
Moradores de favelas e periferias, movimentos sociais e organizações de direitos humanos, pesquisadores da área de geografia urbana, cultura e música, profissionais da educação e formuladores de políticas públicas.
Verônica Rodrigues Azevedo Almeida de Lima é geógrafa e professora de geografia, formada pela UFF (Universidade Federal Fluminense), com mestrado em geografia e meio ambiente pela PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro). Atuou em grupos de pesquisa como o Geocon (Geografia e Contemporaneidade/UFF), o UFSM (Espacialidades Urbanas) e o LEMTO (Laboratório de Estudos de Movimentos Sociais e Territorialidades/UFF). Seu foco de pesquisa é geografia urbana, com ênfase em temas como espaço, movimentos sociais e culturais, produção e representação espacial, além das relações entre sociedade e natureza nas cidades.
Referências
- LEFEBVRE, H. (1991). A Produção do Espaço. São Paulo: Editora Cortez.
- SANTOS, M. (2014). A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Edusp.
- MASSEY, D. (2008). Pelo Espaço: Uma Nova Política da Espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
- SERPA, A. (2019). Por uma Geografia dos Espaços Vividos: Geografia e Fenomenologia. São Paulo: Contexto.
- ESSINGER, S. (2005). Batidão: Uma História do Funk. Rio de Janeiro: Record.