Coluna

Denis R. Burgierman

Uma outra lógica

05 de janeiro de 2017

Compartilhe

Vou arriscar um exercício de imaginação: e se pudéssemos virar de ponta-cabeça nosso sistema de educação?

Quando se para pra pensar, o sistema de educação do Brasil meio que não faz muito sentido.

A educação pública básica é grátis, mas quase sempre fuleira, garantindo uma enorme massa de gente mal-formada, para começar. Aí, a educação superior pública é até que bem boa, mas acaba atendendo só aos ricos, que puderam pagar escola privada.

É um modelo perverso, porque acaba fazendo com que o país inteiro subsidie a educação dos mais ricos. A revista liberal britânica “The Economist” uma vez escreveu que é um exemplo de um fenômeno típico do capitalismo brasileiro: distribuição de renda, só que dos pobres para os ricos.

É também um enorme desperdício de potencial. O Brasil é um país jovem de 200 milhões de pessoas. É portanto riquíssimo no insumo mais valioso da economia mundial: gente. A cada ano, mais de 1 milhão de brasileirinhos de 6 anos entram no 1a ano do ensino fundamental – quantos deles não têm em si os talentos necessários para curar doenças, desenvolver tecnologias, criar obras-primas, gerir organizações, mudar o mundo? Infelizmente, quase todo esse potencial é tratado de maneira inadequada: os ricos recebem privilégios e acabam crescendo complacentes, enquanto a imensa maioria não tem quase nenhuma chance, diante da baixa qualidade do ensino. Assim reduzimos nosso enorme “pool de talentos” a quase nada, empobrecendo o país.

Não importa se se é de esquerda ou de direita, é difícil negar que haja algo errado nesse sistema. Hein, amigos esquerdistas, faz sentido que o governo invista tanto em subsidiar a educação dos mais ricos? E vocês, amigos direitistas, dá para defender um sistema que gera mão de obra desqualificada e pouco produtiva? Ainda assim, não muda nunca. Parece que estamos enroscados nesse sistema ilógico, imobilizados no novelo da disputa política, entre os esquerdistas que chamam qualquer tentativa de gestão mais aberta de “privatização”, e os direitistas, que rejeitam qualquer investimento em melhorar a qualidade como “assistencialismo”.

Denis R. Burgiermané jornalista e escreveu livros como “O Fim da Guerra”, sobre políticas de drogas, e “Piratas no Fim do Mundo”, sobre a caça às baleias na Antártica. É roteirista do “Greg News”, foi diretor de redação de revistas como “Superinteressante” e “Vida Simples”, e comandou a curadoria do TEDxAmazônia, em 2010.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.

Navegue por temas