Coluna

Denis R. Burgierman

Os reis do Brasil

04 de maio de 2017

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Mais uma república começou e terminou – foi pelo menos a terceira, nos últimos 60 anos. A monarquia, no entanto, continua a mesma

O príncipe das empreiteiras Marcelo Odebrecht disse numa entrevista que sua família nunca teve a coroa real no Brasil – no máximo ele exerceu o cargo de bobo da corte. Se é verdade isso, Marcelo era o bobo da corte mais bem pago do mundo – o único a figurar na lista de bilionários da “Forbes”.

Aliás, o único não: os donos da Camargo Corrêa, que realizavam serviços bem semelhantes para os generais da Ditadura, também são habitués da lista. Com os probleminhas de caixa que a família Odebrecht vem enfrentando (e a palavra “caixa” pode ser entendida de pelo menos dois jeitos diferentes), as irmãs Rossana, Renata e Regina Camargo, felizes herdeiras da construtora fundada pelo pai, Sebastião, ultrapassaram a família germânico-baiana na “Forbes”. Cada uma tem US$ 3,1 bilhões para chamar de seus. E eu aqui achando a passagem de ônibus cara.

A Ditadura Militar foi um período dourado para as grandes construtoras, em especial para a Camargo Corrêa e a Odebrecht. Era uma maravilha, naquele tempo que era bom: contratações governamentais sem licitação, nenhum órgão de controle, nenhuma agência fiscalizadora, transparência zero, autonomia zero para a Polícia Federal investigar, nacionalismo dos ditadores privilegiando “o empresário nacional”, grandes obras a rodo. Reinavam os compadrios entre os poderosos de dentro do governo e os donos das construtoras, trocando favores uns com os outros.

O esquema básico é simples de entender: as construtoras dão um pouco de dinheiro aos poderosos, em troca os poderosos mandam um caminhão de dinheiro público para as construtoras. Dinheiro público, no caso, significa o meu e o seu dinheiro. O que me faz pensar que bobos da corte mesmo somos nós. E ainda por cima ganhamos mal pela função.

Esse esquema floresceu na Ditadura, como eu disse, mas já vigorava antes dela, nos tempos de JK. O cara gostava de uma obrinha, você sabe. Foi com a construção de Brasília, no final dos anos 1950, que as mega-obras viraram rotina no Brasil. Foi aí que pela primeira vez as grandes construtoras se reuniram e montaram o cartel que mordeu grande parte do PIB brasileiro nos últimos 60 anos (história bem contada na excelente reportagem As Quatro Irmãs , da Agência Pública).

Denis R. Burgiermané jornalista e escreveu livros como “O Fim da Guerra”, sobre políticas de drogas, e “Piratas no Fim do Mundo”, sobre a caça às baleias na Antártica. É roteirista do “Greg News”, foi diretor de redação de revistas como “Superinteressante” e “Vida Simples”, e comandou a curadoria do TEDxAmazônia, em 2010.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.

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