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Em nações nas quais a história não pode ser entendida sem considerarmos a violência como aspecto fundante de tais sociedades, é muito frequente que o passado seja tratado de forma bastante dúbia e seletiva.
Nos discursos oficiais elitistas e patriarcais, a memória das instituições e das grandes famílias, das monarquias, e sobretudo dos seus representante do sexo masculino, são ainda os principais temas dos conteúdos escolares. Além das escolas, esses conteúdos são imortalizados nas estátuas das praças públicas, nos nomes de ruas e das escolas, e também nas versões romantizadas e fantasiosas de quem se associa a determinada versão da história.
O outro extremo é como nos relacionamos com o caráter violento da nossa história, elegendo quais partes dela devem ser esquecidas ou revistas, de forma que seja feita uma “romantização” dos fatos, que a depender da audácia de quem fala ou escreve, podem até deixar de existir.
No Brasil, por exemplo, já escutamos de tudo: que o tráfico-transatlântico foi método de extração de trabalho e desumanização inventado pelos povos africanos contra eles próprios, sem envolvimento dos portugueses.
Volta e meia, a violência sexual e a exploração do trabalho sofrida por mulheres negras e indígenas escravizadas também são realidades relativizadas por quem faz uma leitura da sociedade brasileira patriarcal como uma grande plantation sexual, sobre a qual nasceu o povo brasileiro e onde senhores de escravos e mulheres escravizadas estavam em condições equivalentes.
Luciana Britoé historiadora, doutora em história pela USP e especialista nos estudos sobre escravidão, abolição e relações raciais no Brasil e EUA. É professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia e autora dos livros “O avesso da raça: escravidão, racismo e abolicionismo entre os Estados Unidos e o Brasil” (Barzar do Tempo, 2023) e “Temores da África: segurança, legislação e população africana na Bahia oitocentista” (Edufba, 2016), ganhador do prêmio Thomas Skidmore em 2018. É também autora de vários artigos. Luciana mora em Salvador, tem os pés no Recôncavo baiano, mas sua cabeça está no mundo. Escreve mensalmente às terças-feiras.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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