Tribuna

Áurea Carolina

Sem tempo para Bolsonaro

09 de agosto de 2019

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Não devemos perder energia com reclamação desprovida de ação. A crítica ao governo deve vir acompanhada de compromisso prático

Eu tinha a intenção neste texto de fazer um balanço sobre o meu primeiro semestre na Câmara dos Deputados, mas mudei de ideia. Sinto que é mais urgente falar de outro assunto, uma questão que não pode esperar: o que fazer com a desolação política que anda solta pelo mundo e que pegou o Brasil de jeito?

Parece que o portal do inferno se abriu e as criaturas mais bestiais escaparam em debandada para tomar de assalto as instituições – da família ao Estado, sem poupar ninguém. De forma perturbadora, esses incontáveis replicantes são, ao mesmo tempo, repudiados e adorados por toda parte, assim como o triste exemplar plantado na Presidência do nosso país.

A figura de Bolsonaro causa repulsa por combinar tirania com extraordinária burrice e uma estética vexatória, e ainda assim consegue ser inacreditavelmente sedutora. Muita gente não só acha graça do seu estilo inconsequente e “autêntico” de ser, como se sente desforrada por sua performance apocalíptica. Como é possível que os grunhidos desses seres das trevas ainda recebam tanta adesão? Não somos melhores do que isso?

O Bolsonaro mitificado é perfeito na sua síntese ignóbil, mas seus semelhantes humanizados costumam ser mais complexos e contraditórios. Nem mesmo o senhor Jair Messias, a pessoa física, está à altura da sua versão icônica. O problema é que, na vida real, todo mundo pode ter um pouco de Bolsonaro. Como lidar?

Tenho insistido que desumanizar Bolsonaro e sintetizá-lo exclusivamente na sua projeção simbólica é um equívoco que alimenta a abominável criatura. Isso é válido para os ídolos e salvadores da pátria, até para aqueles que amamos de coração, sobretudo em uma sociedade de culto personalista e raízes autoritárias como a nossa.

Áurea Carolina

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