Expresso

Qual é o papel das províncias separatistas na crise da Ucrânia

Juliana Sayuri

21 de fevereiro de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h22)

Putin reconhece como independentes os territórios de Donetsk e Luhansk, elevando o temor de possível invasão da região por tropas russas

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FOTO: ALEXANDER ERMOCHENKO/REUTERS – 19.FEV.2022

Civis caminham pela cidade ucraniana de Donetsk, controlada por separatistas pró-Rússia

Civis caminham pela cidade ucraniana de Donetsk, controlada por separatistas pró-Rússia

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, reconheceu nesta segunda-feira (21) como independentes dois territórios separatistas do leste da Ucrânia , elevando a crise internacional do país com as potências ocidentais que alertam desde o fim de 2021 para o risco de invasão da ex-nação soviética por Moscou.

Desde 2014 , a Rússia municia e protege os separatistas ucranianos na região chamada Donbass . Os grupos agem internamente contra o governo ucraniano, a favor dos interesses políticos russos. Eles estão concentrados em duas áreas, Donetsk e Luhansk, os focos do anúncio televisionado de Putin nesta segunda.Considero necessário tomar uma decisão que deveria ter sido tomada há muito tempo — reconhecer imediatamente a independência e a soberania da República Popular de Donetsk e da República Popular de Luhansk, declarou.

No sábado (19), a Embaixada do Brasil na Ucrânia havia recomendado que os brasileiros presentes no país redobrem a atenção e evitem visitar as duas regiões dominadas por rebeldes pró-Rússia.

Neste texto, o Nexo contextualiza quem compõe os grupos separatistas e qual o papel deles na tensão entre Rússia e Ucrânia.

O histórico de Donetsk e Luhansk

No fim de 2013, a Ucrânia desistiu de assinar um tratado de livre-comércio com a União Europeia, preferindo estreitar relações com a Rússia. A decisão provocou protestos, manifestações e motins até fevereiro de 2014, levando à deposição do presidente ucraniano Viktor Yanukovych .

As tensões escalaram entre manifestantes pró-Kiev e pró-Moscou na península da Crimeia , território da Ucrânia que foi invadido e anexado pela Rússia.

Yanukovych fugiu para a Rússia e foi substituído temporariamente por Olexander Turchynov . Diante do Parlamento logo depois de assumir como presidente interino, Turchynov destacou que o novo governo já enfrentava resistência de regiões ucranianas onde vivem grupos étnicos russos – o que indicava, nas suas palavras, “uma séria ameaça de separatismo”.

Foi nesse contexto que duas províncias, dominadas por grupos separatistas, se declararam independentes da Ucrânia a partir de abril de 2014, passando a se denominar DNR (República Popular de Donetsk) e LPR (República Popular de Luhansk).

Mapa mostra a localização da Crimeia e do Donbass

As regiões realizaram referendos a fim de legitimar as respectivas declarações de independência em maio de 2014 – em Donetsk, 89% votaram a favor da emancipação do território frente à Ucrânia; em Luhansk, 96% foram favoráveis.

Os processos foram criticados, pois, segundo a imprensa internacional reportou à época, os líderes separatistas proibiram que jornalistas e observadores independentes acompanhassem a contagem dos votos, dificultando a comprovação dos resultados, que tampouco foram reconhecidos pela comunidade internacional até hoje.

O conflito entre rebeldes pró-russos e tropas ucranianas se acirrou, deixando milhares de mortos e feridos.

Em setembro de 2014 foi assinado um primeiro cessar-fogo, mas a trégua não durou muito tempo – um lado acusou o outro de violar as regras. Em fevereiro de 2015 foi firmado o segundo acordo de paz . Entretanto, desde a última quinta-feira (17), a região de Donbass tem registrado bombardeios e tiroteios, totalizando 591 violações do cessar-fogo ao longo de 24 horas , segundo a OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa).

Donetsk e Luhansk acusam a Ucrânia de tentar invadir territórios, responsabilizando-a por recentes bombardeios. Militares ucranianos, por sua vez, atribuíram as agressões aos rebeldes.

3.106

É o número de mortes civis no conflito no leste da Ucrânia entre 14 de abril de 2014 e 31 de dezembro de 2021, segundo as Nações Unidas

1,8 milhões

É o número estimado de indivíduos vulneráveis nas áreas de Donetsk e Luhansk afetadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia

168 milhões de euros

É o valor estimado pelas Nações Unidas para a ajuda humanitária necessária no leste da Ucrânia, como abrigo, acesso a água e proteção na área afetada

O papel estratégico de Donetsk e Luhansk

Atualmente, a autoproclamada DPR controla uma área de cerca de 7.853 km², que se estende desde a cidade de Novoazovsk, no sul, até a cidade de Debaltseve, no norte.

Quem lidera o território é o empresário e ex-militar Denis Pushilin , desde 2021 filiado ao partido Rússia Unida – o partido do presidente russo Vladimir Putin.

Pushilin assumiu o poder após a morte do líder rebelde Alexander Zakharchenko, morto num atentado a bomba em agosto de 2018.

Na sexta-feira (18), Pushilin anunciou a retirada de civis de Donetsk para a Rússia, argumentando temer uma invasão iminente da Ucrânia à área onde atualmente vivem cerca de 2,3 milhões de pessoas. No sábado (19), ele convocou“todos os homens com idade para pegar em armas” a se juntarem às forças rebeldes.

Putin, que vem se referindo à atuação de militares ucranianos no Donbass como “um genocídio” , sinalizou que a região chamada Rostov, na fronteira russa, deve receber ajuda para abrigar os refugiados.

Os Estados Unidos, porém, criticaram a retirada de civis como um pretexto para um ataque da Rússia à Ucrânia. Ou, nas palavras de um oficial do Departamento de Estado norte-americano, “um uso cínico e cruel de seres humanos como peões para distrair o mundo do fato de a Rússia estar organizando suas forças preparando-se para um ataque”.

Luhansk também anunciou a retirada de residentes civis com destino à Rússia. O líder da autoproclamada LPR Leonid Pasechnik, também filiado ao partido Rússia Unida desde fins de 2021, declarou “mobilização militar total” no território de 8.377 km², que concentra aproximadamente 1,5 milhão de pessoas.

Donetsk e Luhansk não são reconhecidos como repúblicas independentes pela comunidade internacional, inclusive pela Rússia. Nos últimos dias, a Duma , a Câmara Baixa do Parlamento da Rússia (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil), aprovou um projeto de lei do Partido Comunista que visa dar a Putin o poder de reconhecer a emancipação das duas regiões.

Com o reconhecimento de Putin da independência de Donetsk e Luhansk, a Rússia passa a tratá-las como Estados independentes da Ucrânia, o que poderia agravar as tensões na região de Donbass e as possibilidades de invasões e guerras.

Antes da decisão, a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) já havia declarado que independência de Donetsk e Luhansk seria uma “violação das leis internacionais e da integridade e autoridade territorial da Ucrânia”.

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