Por que o lugar de Lula e Bolsonaro está tão estável nas pesquisas
Isadora Rupp
28 de julho de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h43)Datafolha com entrevistas em 27 e 28 de julho mostra ex-presidente com 47% das intenções de voto e presidente com 29%. Índices seguem em patamares praticamente inalterados há mais de um ano
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Materiais de campanha de Lula e Bolsonaro na eleição 2022
Levantamento Datafolha divulgado nesta quinta-feira (28) mostra que o cenário da corrida presidencial segue inalterado: Luiz Inácio Lula da Silva tem 47% das intenções de voto. Jair Bolsonaro tem 29%. Os outros candidatos ao Palácio do Planalto nas eleições marcadas para 2 de outubro não chegam a dois dígitos.
A diferença entre os dois favoritos é de 18 pontos percentuais. Lula tem mais intenção de votos do que a soma de todos os seus adversários. Se a eleição fosse hoje, ele venceria no primeiro turno.
A pesquisa foi realizada com 2.566 pessoas entre os dias 27 e 28 de julho em 183 cidades do país. A margem de erro é de dois pontos percentuais. O instituto realiza as entrevistas de maneira presencial, com abordagem em fluxo, uma metodologia considerada vantajosa pelo contexto social do país, onde há uma parcela da população sem acesso a telefone fixo, celular e internet.
O Nexo mostra a evolução dos dados do Datafolha, traz outro exemplo de instituto que confirma a estabilidade e ouve cientistas políticos sobre o cenário que pouco muda.
Em julho de 2021, Jair Bolsonaro governava sob o desgaste da CPI da Covid , que expôs a inação da gestão federal no combate à pandemia no Brasil, além de suspeitas de corrupção na compra de vacinas para a população. Naquele mês, Lula registrou 46% e Bolsonaro ficou com 25%, segundo o Datafolha . Nenhum outro concorrente alcançou dois dígitos.
Dois meses depois, em setembro de 2021, após uma escalada de ataques golpistas por parte de Bolsonaro e seus apoiadores contra a democracia e as urnas eletrônicas, o cenário não mudou. Lula continuou na liderança com 44%, segundo o mesmo instituto. O atual presidente registrou 26% . As duas variações estavam dentro da margem de erro da pesquisa.
Montagem com as imagens de Lula e Bolsonaro, candidatos em 2022
Com a entrada do ex-juiz Sergio Moro, do Podemos, como possível candidato, o Datafolha voltou à rua em dezembro de 2021. Naquele momento, o quadro ficou embolado na chamada terceira via, que contava ainda com o tucano João Doria. Lula e Bolsonaro ficaram com percentuais parecidos. Nem Moro, nem João Doria, do PSDB, nem Ciro Gomes, do PDT, tiveram desempenho de dois dígitos.
O tucano retornou à iniciativa privada após seus planos políticos darem errado. O ex-juiz da Lava Jato trocou de partido e, depois de queimar pontes , agora concorre ao senado no Paraná pelo União Brasil. A terceira via ficou com Simone Tebet, do MDB. E nada mudou significativamente. O Datafolha de março de 2022 veio com Lula registrando 43% e Bolsonaro atingindo 26%.
No pelotão de trás, Ciro é quem vai melhor. Mas o investimento em marketing de conteúdo e esforço para se manter relevante nas redes sociais não refletiu nos números do ex-governador do Ceará.
O presidente seguiu com os seus ataques às urnas – o mais recente em uma reunião com embaixadores estrangeiros, o que desencadeou reações em série de instituições e entidades.
Escândalos vieram à tona, como o do gabinete paralelo do MEC , com suspeitas de corrupção e tráfico de influência por parte de pastores ligados ao presidente, que intermediaram o repasse de recursos e pediam propinas até em barras de ouro.
As mortes do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips no Vale do Javari foram mais um capítulo de desgaste, com a postura de desdém por parte do presidente, bem como o assassinato de um petista por um bolsonarista em Foz do Iguaçu.
Lula e a oposição se contrapuseram a Bolsonaro nos episódios e focam na crítica à economia que patina. Algumas declarações do petista, como a em um evento na CUT (Central Única dos Trabalhadores) em abril, em que incentivou as pessoas a irem às casas dos deputados para conversar com eles, mobilizou a oposição e críticos. Outra fala que causou rebuliço foi a defesa do candidato ao aborto como uma questão de saúde pública , algo que preocupou a campanha e parte da esquerda, mas não refletiu nos números.
Em 13 de julho de 2022, o Congresso concluiu a aprovação da PEC das Bondades , que ampliou benefícios sociais como o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 e criou outros benefícios. Essa é uma das apostas de Bolsonaro, que vai tentar a reeleição pelo PL, ao lado da redução de impostos para baratear o preço da gasolina .
Outras pesquisas como as da Quaest Consultoria também mostram que pouco mudou na disputa para presidente nos últimos meses. O cientista político Jairo Nicolau analisou os quatro últimos levantamentos com foco apenas em Lula e Bolsonaro. Nos recortes de gênero, renda, faixa etária, religião e região, os números estão estáveis. De acordo com Nicolau, alguns analistas costumam superestimar alterações, pois desconsideram a margem de erro. Ao excluir o índice, a conclusão é de que as mudanças aparentes em determinados segmentos seguem inalteradas.
Além da popularidade, os dois candidatos têm a vantagem de servirem como antagonistas perfeitos um ao outro. O que ajuda nessa estabilidade, segundo disseram ao Nexo os cientistas políticos:
Guilherme Russo A grande explicação para isso é simples: são dois nomes muito fortes, o presidente atual e um ex-presidente. Um ex-presidente que saiu do governo com uma popularidade altíssima e que, em 2018, mesmo na prisão, tinha mais de 30% das intenções de voto nas pesquisas. Lula é visto pelo eleitorado como um nome para trazer tempos melhores. Bolsonaro teve 55% dos votos no segundo turno em 2018 e mantém parte do eleitorado que o apoiou. Há um processo no eleitorado de antecipação do segundo turno, em 2022, da grande disputa.
Economia importa muito nas eleições e pauta o pleito de forma geral, mas o eleitorado processa a informação, olha a economia e atribui culpa ou crédito considerando suas preferências. Caiu o preço da gasolina. O eleitor de Lula não vai votar em Bolsonaro por causa disso. Assim como o eleitor de Bolsonaro, que vai atribuir culpa ao PT, ao governo Michel Temer.
Monalisa Torres As mudanças que ocorreram no cenário eleitoral deixaram os números sempre na margem de erro porque há uma consolidação do voto em Lula e Bolsonaro. As pesquisas espontâneas [quando o nome do candidato não é mostrado previamente ao eleitor] mostram isso. [No Datafolha , Lula tem 38% na espontânea. Bolsonaro marca 26%. Ciro Gomes, 3% e Simone Tebet 1%]. Também ocorreu uma certa antecipação das campanhas com os candidatos participando de diversos eventos.
São nomes conhecidíssimos. Lula foi presidente, participou de diversas eleições, tem recall. E Bolsonaro é presidente. Eles não precisam construir uma imagem do zero para uma candidatura. Além disso, um se coloca como antagonista do outro: Bolsonaro como antipetista e Lula como antibolsonarista. Ciro Gomes, por exemplo, tenta antagonizar aos dois, mas não consegue colar a imagem a ele, diferente dos outros dois. A menos que a gente tenha uma reviravolta absurda, é difícil que haja variação nesses números.
A despeito da crise sanitária e tensionamentos, Bolsonaro continua com um piso que não cresce, mas não cai. Ele tem um eleitorado fiel e tem conseguido mantê-lo para além da crise pela mobilização do discurso que atende aos interesses dessa bolha fiel. Seja nas motociatas ou nas participações nas marchas para Jesus . Nos momentos que ele se sente pressionado, ele aciona as bases nesses eventos e nos discursos como na reunião com os embaixadores que gera apelo permanente na base. Isso é o que mantém o piso de Bolsonaro, independente de escândalos ou economia. É por isso que ele não cai.
Guilherme Russo Existe uma probabilidade considerável. A gente sabe que entre os eleitores de Ciro Gomes, a segunda opção para a maioria deles é votar em Lula. Se Lula está em um teto, em algum momento, mais perto da eleição, esse eleitor cirista pode migrar esse voto para decidir no primeiro turno. De resto, Lula precisaria mobilizar eleitores que hoje não estão indo votar.
Monalisa Torres Na medida em que a eleição ficar mais próxima, acredito que pode ter voto útil sendo mobilizado. Essa campanha será fortemente ligada à rejeição, ao que eu não quero. Em razão disso, esse voto pode ser mobilizado a uma outra candidatura. Por exemplo: uma pessoa que vota no Ciro mas, por receio, ativa o voto útil para um ou outro candidato no último momento. Os índices mostram que os números de Lula e Bolsonaro estão consolidados, com índices muito favoráveis que os levam ao segundo turno. Podemos ter migração de votos de indecisos e, acredite: ainda há pessoas que não pensaram nisso, e que podem ir para um ou outro candidato. E isso é decisivo para que se vá ao segundo turno ou não.
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