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O ritmo e o estilo de diferentes obras literárias brasileiras

Rodolfo Almeida e Daniel Mariani

30 de janeiro de 2017(atualizado 28/12/2023 às 02h43)

Número de palavras por frase é um dos principais responsáveis por definir ritmo e musicalidade de um texto. Veja como diferentes autores equilibram frases em suas obras

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Aluisio Azevedo (1857-1913)

O Cortiço (1865)

até 2 palavras

de 3 a 5

de 6 a 10

de 11 a 15

de 16 a 20

+ 20

Era uma mulatinha magra, mal vestida, acompanhada por uma velha quase cega e mais um homem, inteiramente calvo, que sofria de asma e, de quando em quando, abalava a mesa com um frouxo de tosse, fazendo dançar os copos.
O Pataca bateu no ombro da rapariga.
— Como vais tu, Florinda?
Ela olhou para ele, rindo; disse que ia bem, e perguntou-lhe como passava.
— Rola-se, filha. Tu que fim levaste? Há um par de quinze dias que te não vejo!
— E mesmo. Desde que estou com seu Bento não tenho saído quase.
— Ah! disse o Pataca, estás amigada? Bom!...
— Sempre estive!

Clarice Lispector (1920-1977)

A Hora da Estrela (1977)

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Tudo isso, sim, a história é história. Mas sabendo antes para nunca esquecer que a palavra é fruto da palavra. A palavra tem que se parecer com a palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever para comigo. E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela. Bem, é verdade que também queria alcançar uma sensação fina e que esse finíssimo não se quebrasse em linha perpétua. Ao mesmo tempo que quero também alcançar o trombone mais grosso e baixo, grave e terra, tão a troco de nada que por nervosismo de escrever eu tivesse um acesso incontrolável de risovindo do peito. E quero aceitar minha liberdade sem pensar o que muito acham: que existir é coisa de doido, caso de loucura. Porque parece. Existir não é lógico.

Guimarães Rosa (1908-1967)

Grande Sertão: Veredas (1956)

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Me diga o senhor: por que, naquela extrema hora, eu não disse o nome de Deus? Ah, não sei. Não me lembrei do poder da cruz, não fiz esconjuro. Cumpri como se deu. Como o diabo obedece – vivo no momento. Diadorim encolheu o braço, com o punhal, se defastou e deitou de corpo, outra vez. Os olhos dele dançar produziam, de estar brilhando. E ele devia de estar mordendo o correiame de couro.

Jorge Amado (1912-2001)

Capitães da Areia (1937)

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Um rumor de conversas se aproxima. Vem um grupo de quatro entrando no silêncio que já reina na noite do trapiche. O Sem-Pernas se estremece, ri nas costas de Pirulito, que continua a rezar. Encolhe os ombros, decide deixar para a manhã do dia seguinte o acerto dos detalhes do furto dos chapéus. E como tem medo de dormir, vai ao encontro do grupo que chega, pede um cigarro, diz dichotes sobre a aventura de mulheres que os quatro contam:
— Uns franguinhos como vocês, quem é que vai acreditar que seja capaz de derrubar uma mulher? Isso devia ser algum xibungo vestido de menina.
Os outros se irritam:
— Tu também se faz de besta. Se quer é só vim com a gente amanhã. Assim tu pode conhecer a zinha, que é um peixão. O Sem-Pernas ri, sardônico:
— Não gosto de xibungo.
E sai andando pelo trapiche.

José de Alencar (1829-1877)

Iracema (1865)

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Só havia sol no bico da arara quando os caçadores desceram de Pacatuba ao tabuleiro. De longe viram Iracema, que viera esperá-los à margem de sua lagoa da Porangaba. Caminhava para eles com o passo altivo da garça que passeia à beira d’água: por cima da carioba trazia uma cintura das flores da maniva, que era o símbolo da fecundidade. Colar das mesmas cingia-lhe o colo e ornava os rijos seios palpitantes.
Travou da mão do esposo, e a impôs no regaço:
— Teu sangue já vive no seio de Iracema. Ela será mãe de teu filho!

Lygia Fagundes Telles (1923-)

As Meninas (1973)

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Lia sentou-se no tapete e começou a roer um biscoito. Está sombria como um náufrago comendo o último biscoito da ilha. Catou os farelos que se entranharam nas pregas da saia, mas por que essa saia hoje? Apesar do popô de baiana exorbitar, acho que ainda fica melhor de jeans.
— Problemas, Lena. Problemas, ô! Esqueça — disse tentando aplacar com as mãos a cabeleira crespa. Cravou em mim o olho objetivo:
— Não deixe de pedir, ouviu? Atiro-lhe uma maçã.
— Em sua honra botei na mesa uma toalha nova, não é linda?
— Diga que é você quem vai usar, entende.

Machado de Assis (1839-1908)

Dom Casmurro (1899)

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Tudo isto me era agora apresentado pela boca de José Dias, que me denunciara a mim mesmo, e a quem eu perdoava tudo, o mal que dissera, o mal que fizera, e o que pudesse vir de um e de outro. Naquele instante, a eterna Verdade não valeria mais que ele, nem a eterna Bondade, nem as demais Virtudes eternas. Eu amava Capitu! Capitu amava-me! E as minhas pernas andavam, desandavam, estacavam, trêmulas e crentes de abarcar o mundo. Esse primeiro palpitar da seiva, essa revelação da consciência a si própria, nunca mais me esqueceu, nem achei que lhe fosse comparável qualquer outra sensação da mesma espécie. Naturalmente por ser minha. Naturalmente também por ser a primeira.

Mário de Andrade (1893-1945)

Macunaíma (1928)

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Macunaíma apertou o passo e entrou correndo na caatinga porém o Currupira corria mais que ele e o menino isso vinha que vinha acochado pelo outro.
— Carne de minha perna! carne de minha perna! A carne secundava:
— Que foi?
O piá estava desesperado. Era dia do casamento da raposa e a velha Vei, a Sol, relampeava nas gotinhas de chuva debulhando luz feito milho. Macunaíma chegou perto duma poça, bebeu água de lama e vomitou a carne.

Nelson Rodrigues (1912-1980)

Vestido de Noiva (1943)

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ALAÍDE - Li o seu diário.
MADAME CLESSI (céptica) - Leu? Duvido! Onde?
ALAÍDE (afirmativa) - Li, sim. Quero morrer agora mesmo, se não é verdade!
MADAME CLESSI - Então diga como é que começa. (Clessi fala de costas para Alaíde)
ALAÍDE (recordando) - Quer ver? É assim... (ligeira pausa) "ontem, fui com Paulo a Paineiras"... (feliz) É assim que começa.

Paulo Coelho (1947-)

O Alquimista (1988)

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“Sou o Rei de Salém”, dissera o velho.
– Por que um rei conversa com um pastor? – perguntou o rapaz, envergonhado e admiradíssimo.
– Existem várias razões. Mas vamos dizer que a mais importante é que você tem sido capaz de cumprir sua Lenda Pessoal. O rapaz não sabia o que era Lenda Pessoal.
– É aquilo que você sempre desejou fazer. Todas as pessoas, no começo da juventude, sabem qual é sua Lenda Pessoal.
“Nesta altura da vida, tudo é claro, tudo é possível, e elas não têm medo de sonhar e desejar tudo aquilo que gostariam de ver fazer em suas vidas. Entretanto, à medida em que o tempo vai passando, uma misteriosa força começa a tentar provar que é impossível realizar a Lenda Pessoal.

Raduan Nassar (1935-)

Lavoura Arcaica (1975)

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Na modorra das tardes vadias na fazenda, era num sítio lá do bosque que eu escapava aos olhos apreensivos da família; amainava a febre dos meus pés na terra úmida, cobria meu corpo de folhas e, deitado à sombra, eu dormia na postura quieta de uma planta enferma vergada ao peso de um botão vermelho; não eram duendes aqueles troncos todos ao meu redor, velando em silêncio e cheios de paciência meu sono adolescente? Que urnas tão antigas eram essas liberando as vozes protetoras que me chamavam da varanda? De que adiantavam aqueles gritos, se mensageiros mais velozes, mais ativos, montavam melhor o vento, corrompendo os fios da atmosfera?

Rubem Braga (1913-1990)

Ai de ti, Copacabana (1961)

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E essas notícias de separação muito antes de sair nos jornais correm com uma velocidade espantosa. Alguém nos conta sob segredo de morte, e em três ou quatro dias percebemos que toda a cidade já sabe — e ninguém morre por causa disso.
Uns acham graça em um detalhe ou outro. Mas o que fica, no fim, é um ressaibo amargo — a ideia das aflições e melancolias desses casos.
Ah, os casais de antigamente! Como eram plácidos e sábios e felizes e serenos...
(Principalmente vistos de longe. E as angústias e renúncias, e as longas humilhações caladas? Conheci um casal de velhos bem velhinhos, que era doce ver — os dois sempre juntos, quietos, delicados. Ele a desprezava. Ela o odiava.)

Rubem Fonseca (1925-)

Agosto (1990)

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“Ouvindo o Lacerda, doutor? O mar de lama cada vez aumenta mais. Viu a palavra que o homem inventou? Kakistocracia — governo pelos piores elementos da sociedade. Os kakistocratas vão perder as eleições. Sarazate vai se eleger no Ceará, Meneghetti no Rio Grande do Sul, Pereira Pinto no Rio, Cordeiro de Farias em Pernambuco. O povo não confia mais em Getúlio. O senhor viu o esquema que o Etelvino armou para as eleições presidenciais? Uma chapa Juarez-Juscelino, uma barbada.”

Observações: Ponto final, ponto de exclamação, dois pontos e ponto de interrogação foram os sinais de pontuação utilizados para considerar o final de uma frase. Foram selecionadas obras cujos textos estavam disponíveis em arquivo PDF na internet.

Colaboraram: Ariel Tonglet (desenvolvimento) e Thiago Quadros (pesquisa)

ESTAVA ERRADO:Em uma versão anterior deste gráfico, as legendas de número de palavras estavam imprecisas. A informação foi corrigida às 16h do dia 1 de março de 2019.

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