Como as nomeações políticas de burocratas impactam a governança, a prestação de serviços públicos e o desenvolvimento?

Governos de todo o mundo usam indicações políticas para preencher pelo menos alguns cargos burocráticos. Normalmente, pensamos que as nomeações políticas colocam em risco a governança por meio de dois mecanismos: a seleção de candidatos menos qualificados e a redução do esforço dos funcionários (devido às conexões dos indicados com atores políticos). Essa é frequentemente a posição estabelecida sobre indicações políticas, tanto em debates acadêmicos quanto em discursos públicos sobre a burocracia.

Este estudo apresenta uma visão alternativa sobre as indicações políticas como uma instituição que muda não apenas quem entra na burocracia ou o quanto eles trabalham, mas também como eles trabalham. As indicações políticas (e as conexões sociais e políticas resultantes entre burocratas e políticos) facilitam o monitoramento dos burocratas pelos políticos, permitem a aplicação de sanções e recompensas, fornecem acesso a recursos materiais e imateriais, alinham prioridades e incentivos e aumentam a confiança mútua. Desse modo, as nomeações políticas podem facilitar a accountability (prestação de contas) e a eficácia dos burocratas, não apenas para fins de obtenção de favorecimento político, mas também, em certas condições, para a prestação de serviços públicos.

A teoria é testada utilizando dados administrativos sobre escolas, assim como surveys originais de burocratas e políticos no Brasil. A pesquisa se concentra no nível municipal, contexto em que as indicações políticas convivem com outros modos de seleção de burocratas. São utilizados desenhos empíricos de caráter experimental e quase-experimental, os quais nos permitem isolar o efeito do modo de seleção dos burocratas e suas conexões com os políticos de outras variáveis que são frequentemente relacionadas a eles. As análises quantitativas são complementadas com aprendizados qualitativos de entrevistas em profundidade conduzidas com 121 burocratas, políticos e atores anticorrupção em 45 municípios de sete estados brasileiros.

Os resultados empíricos demonstram que as indicações e conexões políticas fornecem recursos úteis de governança, que estes recursos podem fortalecer a eficácia burocrática e que os políticos responsabilizam os nomeados políticos por seu desempenho na prestação de serviços públicos. Estes benefícios frequentemente negligenciados das indicações políticas sugerem que a política pode ser uma fonte não apenas de corrupção e favoritismo, mas também de recursos de governança que podem ajudar a superar os desafios do desenvolvimento. As vantagens das nomeações podem ser particularmente úteis em contextos em que outras fontes mais imparciais de eficácia burocrática (por exemplo, altos níveis de capital humano e fortes normas burocráticas) não estão suficientemente desenvolvidas.

O artigo também ajuda a explicar por que as nomeações políticas são tão importantes para os políticos corruptos. Ao mudar a forma como os burocratas trabalham – por exemplo, tornando-os mais alinhados e mais facilmente monitorados e sancionados – as indicações políticas tornam mais fácil para os políticos corruptos usarem a burocracia a seu favor. Esta versatilidade das nomeações políticas ajuda a explicar por que elas se mostraram tão resilientes ao longo da história.

A alegação do artigo não é que as indicações sejam geralmente preferíveis, mas sim que elas oferecem algumas vantagens subestimadas que podem ser mobilizadas não apenas para a obtenção de vantagens indevidas, mas também para o fornecimento de serviços públicos com mais eficiência. O efeito líquido das nomeações políticas dependerá do equilíbrio entre benefícios e custos, em relação aos custos e benefícios das alternativas locais para a seleção de funcionários.

Gestores públicos, partidos políticos e líderes de organizações do terceiro setor interessados/as em melhorar a governança pública, particularmente nos municípios do interior onde as indicações políticas são mais comuns.

Guillermo Toral é professor na IE University (em Madri, Espanha) e Faculty Affiliate no MIT GOV/LAB (em Cambridge, nos EUA). Ele se doutorou em 2020 pelo MIT, com uma tese sobre os usos políticos do emprego público no Brasil. A tese recebeu o prêmio de melhor tese na área de políticas públicas da American Political Science Association.