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Poupar vidas diante de um vírus desconhecido, cuidar dos vulneráveis e preparar a economia para a retomada constituem o gigantesco desafio enfrentado pelo Brasil e pelo o mundo. A ciência, comprovada pela experiência de vários países, indica que o isolamento social precoce continua sendo a única estratégia eficaz, no curto prazo, para reduzir o contágio do novo coronavírus e salvar vidas. Evita-se, dessa maneira, o colapso do sistema de saúde, aumentando a cura dos casos graves. Ao mesmo tempo, protocolos de atendimento aos pacientes e testes de imunidade são aprimorados, remédios e vacinas continuam a ser pesquisados, alimentando a esperança de que a partir de 2021 haverá vacinas para todos. Ainda assim, as taxas exponenciais de contágio e morte pelo vírus no mundo são traduzidas diariamente em números assustadores —mais de 2,6 milhões de casos e 187 mil mortes até 23/04 — deixando poucas dúvidas sobre o risco enfrentado por todos nós.
Ao manter em funcionamento apenas os serviços essenciais por um período incerto, o isolamento social, hoje generalizado em boa parte do mundo, desorganiza de tal maneira o sistema produtivo que é impossível calcular precisamente os custos econômicos decorrentes. Indicadores já disponíveis sugerem que a desaceleração da economia mundial pode vir a ser a maior desde a Grande Depressão, ocorrida há 90 anos. O FMI (Fundo Monetário Internacional), por exemplo, divulgou suas projeções recentemente, estimando que, depois de crescer 2,9% em 2019, o PIB mundial deve cair 3% neste ano, retomando o crescimento em 2021, quando avançaria 5,8%. Os PIBs da Itália e da Espanha podem cair 9% e 8%, respectivamente, enquanto o dos Estados Unidos pode ter queda de 5,9%, e o do Brasil, de 5,3%.
Como lidar com esse momento excepcional, que tende a tornar mais agudos os problemas e conflitos pré-existentes? Os custos da crise não são homogeneamente distribuídos nem entre os países, e menos ainda no interior de cada sociedade, cabendo aos Bancos Centrais e aos Tesouros Nacionais ações visando cuidar das pessoas mais afetadas, para que sobrevivam com dignidade, e das empresas, para que reabram rapidamente depois do período de isolamento. Esse plano de ação é consensual e mais fácil de ser enunciado do que de ser colocado em prática, tendo mais êxito quando existe liderança e capacidade técnica nos governos. Caso contrário, os conflitos se exacerbam.
Em primeiro lugar é preciso fazer o dinheiro chegar rapidamente às mãos de quem não pode trabalhar, o que é especialmente difícil em países menos desenvolvidos e/ou sem redes de proteção social em funcionamento. É preciso, também, fazer o crédito chegar às empresas em dificuldades, sobretudo as pequenas e médias, para que elas possam voltar a funcionar rapidamente, o que exige grande coordenação entre o Banco Central e o sistema financeiro.
A outra questão crucial refere-se ao financiamento desse programa de ajuda. Países mais pobres e frágeis terão dificuldades de se endividar para pagar a conta, o mesmo ocorrendo com países que já possuem dívidas muito elevadas. Num extremo está a África, com sistema de saúde pública precário e inúmeras doenças endêmicas, que vai precisar de cooperação internacional para alimentar sua população. Em outro extremo está a Europa, já severamente afetada pela pandemia, e que reagiu com rapidez e vigor em resposta aos custos do lockdown por meio das linhas de auxílio monetário e fiscal, mas não se livrou de difíceis escolhas.
Cristina Pinottié graduada em administração pública pela EAESP-FGV e cursou o doutorado em economia na FEA-USP. É sócia da A.C. Pastore & Associados desde 1993. Antes trabalhou nos departamentos econômicos do BIB-Unibanco, Divesp e MB Associados. Concentra seus trabalhos na análise da macroeconomia brasileira, com ênfase em temas da política monetária, relações do país com a economia internacional, e planos de estabilização. Nos últimos anos tem se dedicado ao estudo da teoria da corrupção e da história da operação Mãos Limpas, na Itália. É autora de diversos artigos e livros. Escreve mensalmente às sextas-feiras.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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