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Os dados da nova pesquisa Pulso Empresa divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 16 de junho desnudaram o que pode ser considerado o segundo maior vácuo na resposta dada até aqui pelo governo federal ao colapso causado pela pandemia: a inadequação das medidas de apoio às micro e pequenas empresas do país só não perde para a atuação criminosa do governo na área da saúde pública. Mas se ao não combater o que deu origem à própria crise econômica — o vírus — adiamos nossas perspectivas de retomada, ao não conseguir evitar o fechamento definitivo de mais de 716 mil empresas até o final da primeira quinzena de junho detonamos nosso potencial de recuperação.
O cenário revelado pela pesquisa é devastador. Do total de empresas cujas portas já se fecharam, 99,8% têm menos de 49 empregados. Além disso, 93% das empresas fechadas estão enquadradas nos setores de serviços, comércio e construção civil (ante 7% na indústria). Esses números sugerem que a perda de empregos e de renda associada à quebra dessas empresas recairá desproporcionalmente sobre trabalhadores menos escolarizados — empregados de forma mais intensiva nessas atividades — ampliando nossas já elevadas disparidades salariais.
Do total das empresas de menos de 49 empregados, 64% declarou que a pandemia trouxe dificuldades para realizar pagamentos de rotina como tributos, fornecedores, salários, aluguéis, energia elétrica. Esse percentual cai para 54,8% entre as empresas de 50 a 499 empregados e para 35,6% entre as de mais de 500 funcionários. Tais números não surpreendem, mas é justamente por isso que países ao redor do mundo têm adotado medidas substantivas de crédito e outras formas de socorro para garantir a sobrevivência das empresas de menor porte e os vínculos empregatícios correspondentes.
Entre as empresas de até 49 empregados, a pesquisa revela que 44,2% adiaram o pagamento de impostos devido às dificuldades de arcar com seus compromissos, sendo mais da metade com a ajuda do governo, mas somente 12,7% conseguiram uma linha de crédito emergencial para pagamento da folha salarial, dos quais um terço nem contou com a ajuda do governo.
São muitas as razões para o fracasso do enfrentamento da crise nessa área. Primeiro, como destacou Manoel Pires , do Observatório de Política Fiscal do IBRE/FGV (Instituto Brasileiro de Economia), a partir da compilação de dados de 16 países, o Brasil é o quarto quando classificado pelo custo em relação ao PIB dos programas governamentais de enfrentamento à pandemia aprovados (incluindo recursos para a saúde, auxílio emergencial, postergações de impostos e outras medidas fiscais não creditícias), mas é somente o 11o em relação aos recursos públicos destinados para facilitar o crédito (garantias, subsídios de juros e fontes fiscais). Além disso, de 3,2% do PIB oferecidos pelo governo federal nessa área, somente 1,9% se destinou a linhas de financiamento para empresas, com o restante referindo-se aos empréstimos concedido a estados e municípios. Esse valor é irrisório quando comparado ao observado em países ricos: o apoio governamental ao crédito já soma 29,7% do PIB na Alemanha, 15,1% no Reino Unido, 13,1% na França, 10,2% no Japão, 10,1% na Espanha, 9% no Canadá e 6,1% nos EUA. O Brasil também perde nesse quesito para a Índia, Coréia do Sul e Singapura.
Laura Carvalhoé doutora em economia pela New School for Social Research, professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo e autora de “Valsa brasileira: Do boom ao caos econômico” (Todavia). Escreve quinzenalmente às sextas-feiras.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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