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Ao longo da nossa história a compra de votos em eleições municipais, estaduais e federais tem sido tratada com enorme leniência, como se fosse um daqueles traços culturais imutáveis com os quais somos obrigados a conviver. Embora seja considerado crime eleitoral punível com cassação e inelegibilidade , ocorre com frequência assombrosa, não obstante as campanhas de esclarecimento feitas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Em uma pesquisa feita pela Transparência Internacional no início de 2019, publicada na décima edição do GCB (Global Corruption Barometer Latin America & The Caribbean), 40% dos brasileiros entrevistados admitem haver recebido, nos cinco anos anteriores, ofertas frequentes de suborno ou favores para votar em um candidato. Quadro semelhante emerge de uma pesquisa feita pelo WVS (World Values Survey) entre 2010 e 2014. À pergunta sobre com qual frequência os eleitores costumariam receber propinas nas eleições, 42% dos brasileiros entrevistados responderam que isso ocorre “com muita frequência”, e 34% que ocorre “com frequência”. Ou seja, 76% dos entrevistados acreditam que os eleitores recebem suborno para votar, uma porcentagem tão elevada e anômala que nos deixa no antepenúltimo lugar na comparação com os 42 países onde a pesquisa foi feita, melhor apenas que Filipinas e Haiti. Os detalhes estão no gráfico abaixo, semelhante ao exibido na segunda edição do livro “Corruption and Government”, de Susan Rose-Ackerman e Bonnie Palifka.
Esse tipo de crime eleitoral não ocorre de maneira uniforme no país, o que explica o estupor de muitos e a indiferença de outros. Há fortes evidências de que a compra de votos é mais comum em regiões pobres e carentes de serviços públicos do que nas regiões mais desenvolvidas. Scott Desposato, por exemplo, mostra em “ How Informal Electoral Institutions Shape the Brazilian Legislative Arena ”, com base em entrevistas feitas em 1999, que embora muito frequente no Piauí, a compra de votos era rara no estado de São Paulo.
Cristina Pinottié graduada em administração pública pela EAESP-FGV e cursou o doutorado em economia na FEA-USP. É sócia da A.C. Pastore & Associados desde 1993. Antes trabalhou nos departamentos econômicos do BIB-Unibanco, Divesp e MB Associados. Concentra seus trabalhos na análise da macroeconomia brasileira, com ênfase em temas da política monetária, relações do país com a economia internacional, e planos de estabilização. Nos últimos anos tem se dedicado ao estudo da teoria da corrupção e da história da operação Mãos Limpas, na Itália. É autora de diversos artigos e livros. Escreve mensalmente às sextas-feiras.
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