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Claudio Ferraz

Coronavírus: como aliviar o grande choque econômico que se aproxima?

18 de março de 2020

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As consequências da pandemia são difíceis de prever, mas é possível imaginar uma crise como nenhuma outra

O Brasil está prestes a sofrer um dos maiores choques econômicos de sua história. Será um choque como nenhum outro já que, além dos efeitos diretos da pandemia de covid-19 na saúde de milhares de indivíduos, a produção e vendas em diversos setores da economia terão quedas enormes e de forma muito rápida. Teremos não só um choque de oferta causado pela indisponibilidade de trabalhadores e/ou falta de insumos (muitos vindos da China), mas também um choque de demanda como consequência da queda de renda, das políticas de distanciamento social e de mudanças nos padrões de consumo. Como bem descrito por um grupo de economistas portugueses que inclui Cátia Batista, José Tavares e muitos outros, “empresas não conseguirão pagar seus provedores e empregados, suas dívidas, seus impostos. Se empresas não produzem, não há geração de renda. Domicílios não conseguirão pagar aluguéis, cartões de crédito, escolas e outros serviços. Tudo isso acontecerá com uma grande proporção da economia e em muito pouco tempo, questão de semanas”.

Como devem responder os governos a uma crise como esta? Economistas de diversos espectros políticos concordam que políticas fiscais são fundamentais para amenizar o grande choque que virá. O economista conservador Greg Mankiw escreveu em seu blog que “há momentos para preocupar-nos com o crescimento da dívida do governo. Este não é um deles”. Porém, ele sugere políticas fiscais que tenham como foco a seguridade social, não a demanda agregada. Uma redução de impostos da folha de pagamentos, por exemplo, não terá efeito se muita gente não puder nem chegar até o trabalho. Sua sugestão é uma transferência de renda temporária e universal que amenize os efeitos na renda familiar. Algo semelhante em termos de transferências foi proposto por Bill Dupor do St. Louis Fed e pela economista Claudia Sahm do Washington Center for Equitable Growth, entre outros.

Um segundo ponto, enfatizado por economistas como Pierre Olivier Gourichas , Ricardo Reis , e Cátia Batista e co-autores , é fazer com que as empresas, especialmente as pequenas e médias que serão mais afetadas, consigam sobreviver ao furacão econômico. Isso requer a intervenção do governo para prover liquidez ajudando empresas a pagar seus funcionários e suas obrigações de curto prazo, como sugerido. Os economistas Emmanuel Saez e Gabriel Zucman propõem que o governo atue como um garantidor de fluxo de caixa para trabalhadores e empresas. Funcionários sem a possibilidade de realizar seu trabalho continuariam empregados mas receberiam um seguro desemprego, facilitando que eles sejam empregados quando o ápice da crise passar. Trabalhadores autônomos poderiam qualificar para esse seguro também demonstrando a redução nas suas receitas. Empresas afetadas por políticas de redução de circulação reportariam seus custos de operação para o governo e seriam ressarcidas para que continuassem funcionando.

No Brasil, enquanto alguns economistas ainda insistem em querer usar os escassos recursos do governo para investir em infraestrutura — num contexto em que deveríamos incentivar, no curto prazo, que os trabalhadores fiquem em casa — a maioria já entendeu que o mais urgente são políticas que busquem a proteção de indivíduos e famílias mais afetadas e não reestimular a economia. Este ponto já foi feito recentemente por Armínio Fraga , Pedro Fernando Nery , Marcelo Medeiros , Monica de Bolle e Rodrigo Soares , entre outras pessoas.

O governo já mudou o discurso da semana passada e começou a se mexer. Foram anunciadas medidas emergenciais no valor de R$ 147 bilhões para socorrer setores e grupos de cidadãos mais vulneráveis. Porém, as medidas parecem longe de resolver o problema, já que deixam de fora aproximadamente 40% de trabalhadores no setor informal da economia, conforme notaram diversos economistas.

Claudio Ferrazé professor da Vancouver School of Economics, na University of British Columbia, Canadá, e do Departamento de Economia da PUC-Rio. Ele é diretor científico do JPAL (Poverty Action Lab) para a América Latina. É formado em economia pela Universidade da Costa Rica, tem mestrado pela Universidade de Boston, doutorado pela Universidade da Califórnia em Berkeley e foi professor visitante na Universidade de Stanford e no MIT.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.

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