Coluna

Marta Arretche

Da defesa para o ataque: a busca por uma bala de prata

01 de julho de 2021

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Programas de transferência de renda podem trazer retornos eleitorais, mas seus efeitos para candidatos não são uma aposta garantida

“Nós jogamos na defesa nos primeiros três anos, controlando despesas. Agora vem a eleição? Nós vamos para o ataque. Vai ter Bolsa Família melhorado, BIP [Bônus de Inclusão Produtiva] , o BIQ [Bônus de Incentivo à Qualificação], vai ter uma porção de coisa boa para vocês baterem palma. Tudo certinho, feito com seriedade, sem furar teto , sem confusão”, declarou o ministro Paulo Guedes em entrevista à Folha de S.Paulo em 24 de maio de 2021.

Por ataque, não se entenda um ataque à pobreza. Trata-se de um ataque aos demais competidores das eleições presidenciais de 2022. Estivesse o ataque à pobreza no centro das preocupações do governo Bolsonaro, a prioridade não teria sido jogar na defesa nos três primeiros anos. Ir para o ataque em um ano eleitoral significa reconhecer que a competição pelo voto dos mais pobres é uma condição de sobrevivência política em países altamente desiguais.

A estratégia pode dar certo? É possível. Em artigo publicado na Research and Politics, “ Do anti-poverty policies sway voters? Evidence from a meta-analysis of Conditional Cash Transfers ”, Victor Araujo examina os resultados de estudos empíricos sobre os retornos eleitorais de programas de transferência condicionada de renda em países da América Latina e da Ásia, onde estes estão concentrados. A resposta é inequívoca: governos que adotam programas de transferência de renda são recompensados com votos.

Não é por acaso que tais programas proliferaram no mundo. Trazem retornos eleitorais aos governantes que os implantam a um custo muito mais baixo que o de políticas de saúde pública, de oferta de serviços de água e esgoto, ou mesmo educacionais. Trazem aumento imediato de bem-estar, elevação do poder de compra e redução instantânea da extrema pobreza. São altamente visíveis, a um custo comparativamente mais baixo que outras alternativas.

Pragmático, o ministro Guedes sabe disso. Crítico da esquerda, declarou em entrevista no mesmo mês de maio a O Globo que “o PT ganhou quatro eleições ‘merecidamente’ porque ajudou os mais pobres”.

Marta Arretcheé professora titular do Departamento de Ciência Política da USP (Universidade de São Paulo) e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole. Foi editora da Brazilian Political Science Review (2012 a 2018) e pró-reitora adjunta de pesquisa da USP (2016 a 2017). É graduada em ciências sociais pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), fez mestrado em ciência política e doutorado em ciências sociais pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), e pós-doutorado no Departamento de Ciência Política do MIT (Massachussets Institute of Technology), nos EUA. Foi visiting fellow do Departament of Political and Social Sciences, do Instituto Universitário Europeu, em Florença. Escreve mensalmente às sextas-feiras.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.

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