Tribuna
Tiago Mitraud
Supersalários e cultura do privilégio na elite do funcionalismo
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O ano que vem será o sétimo seguido de déficits no orçamento primário da União . Contingenciamentos e cortes em todos os ministérios evidenciam a caótica situação financeira do governo federal, resultado de políticas econômicas desastrosas e da escalada desenfreada dos gastos públicos. Em muitos estados, a situação está ainda mais grave, como é o caso de Minas Gerais. O atual governador está lutando para regularizar as finanças do estado, que desde 2016 está pagando os servidores com atraso.
Apesar desta situação calamitosa, constantemente vemos notícias sobre os supersalários pagos no setor público, especialmente no Judiciário e no Ministério Público. Recentemente, um procurador mineiro ganhou fama por reclamar que seu salário, de R$ 24 mil líquidos, seria um “miserê”. Salário que, quando comparado à média dos demais brasileiros, já o colocaria no 1% mais rico da população. Detalhe: a média de rendimentos do procurador em 2019, com todos os adicionais pagos pelo Ministério Público, foi de mais de R$ 80 mil por mês.
Para verificar o nível e frequência com que os supersalários são pagos no setor público, a Diretoria de Fiscalização do Partido Novo na Câmara dos Deputados realizou recentemente um estudo sobre o padrão remuneratório das principais carreiras de servidores públicos do Executivo e Judiciário. Foram analisados mais de 200 mil contracheques de auditores, diplomatas, advogados da União, procuradores fazendários, juízes e desembargadores, dentre outros cargos.
O resultado é assustador. E os maiores absurdos estão, justamente, onde esperávamos: no salário do Judiciário. 71% das folhas de pagamento da magistratura analisadas no estudo apresentavam vencimentos totais acima do teto constitucional, hoje estipulados em R$ 39.293,32 no nível federal e R$ 35.462,22 no estadual. Para se ter uma ideia, a média da remuneração dos magistrados estaduais, engordadas por auxílios, indenizações e recebimentos eventuais – os chamados penduricalhos – é de R$ 48.666, mais de R$ 13 mil acima do teto.
No áudio do procurador miserê, vemos ser tratado com naturalidade um dos artifícios usados para aumentar os vencimentos da turma. Em determinado momento, entre reclamar que não tem origem humilde e, por isso, não estar acostumado com tanta “limitação”, e lamentar que teve que reduzir os gastos do cartão de crédito de R$ 20mil para R$ 8mil por mês, o procurador Leonardo Azeredo questiona o procurador geral da Justiça mineira se este “planeja alguma coisa dentro da sua criatividade para melhorar a situação”.
Tiago Mitraud
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