A mais plural das COPs e a lição de casa para o Brasil

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A mais plural das COPs e a lição de casa para o Brasil
Foto: Yves Herman/Reuters - 10.out.2021

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Marina Grossi


18 de novembro de 2021

O país precisa mostrar como cumprirá as metas assumidas. Serão necessárias medidas práticas para dar legitimidade e credibilidade aos anúncios feitos na conferência

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A 26ª Conferência do Clima das Nações Unidas chegou ao fim e já pode ser considerada emblemática por uma série de razões. A COP26 foi realizada com a perspectiva de que os países tornassem ainda mais ambiciosos os compromissos assumidos no enfrentamento das mudanças climáticas, de modo a evitar que a temperatura global se eleve acima de 1,5ºC, marca que já vinha sendo discutida desde o Acordo de Paris, de 2015.

Sediada em Glasgow, na Escócia, a COP26 trouxe alguns legados importantes. Entre eles, um texto final aprovado pelos quase 200 países-membros da ONU, que prevê a redução gradativa dos subsídios aos combustíveis fósseis e do uso do carvão; também finalizou o livro de regras do Acordo de Paris e os pontos que estavam em aberto, como a regulamentação do artigo 6°, referente ao mercado de carbono.

Para além das salas dos negociadores, essa conferência se destacou pela maciça participação da sociedade civil: esta foi a COP mais plural da história, com imenso engajamento de lideranças empresariais, somado aos movimentos da juventude, dos ambientalistas, dos indígenas, das mulheres e dos negros, que estiveram presentes de modo enfático, reforçando o clamor por justiça climática.

O Brasil deixa a Conferência com o compromisso de fazer valer sua meta (a NDC, ou Contribuição Nacionalmente Determinada, na sigla em inglês), anunciada em Glasgow, e reduzir 50% dos gases de efeito estufa até 2030 em relação aos níveis de 2005 anteriormente, a meta de redução era de 43%. O país também reforçou o compromisso, já colocado na Cúpula dos Líderes sobre o Clima, em abril, de alcançar a neutralidade climática até 2050.

Além disso, o país assinou duas declarações importantes, que podem trazer muitas oportunidades para nossa retomada econômica no pós-pandemia. O compromisso sobre florestas, acordo firmado por lideranças de mais de 100 países, promete zerar e reverter a perda de florestas no mundo até 2030. O pacto – que inclui nações como Brasil, Rússia, China e Estados Unidos abrange cerca de 85% das florestas do mundo e foi considerado um dos grandes acordos a emergir da cúpula da ONU. O país também assinou o compromisso global sobre metano, que estabelece a redução de 30%, em relação aos níveis de 2020, das emissões do gás até o final desta década.

Esses resultados não teriam sido alcançados sem a intensa participação da sociedade civil. A pressão do setor empresarial, que se posicionou de maneira contundente nesta COP26, gerou impacto positivo. O CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) capitaneou, por meio do movimento “Empresários pelo Clima”, a adesão de 119 CEOs de importantes empresas e 14 instituições do setor privado, de setores tão diversos como agronegócio, alimentício, aviação, elétrico, farmacêutico, finanças, infraestrutura, logística, papel e celulose, petroquímico, saúde, tecnologia, telefonia e varejo. Somando-se apenas as 51 companhias desse grupo que publicam resultados, o faturamento delas em 2019 foi de R$ 1,1 trilhão. O posicionamento, lançado em setembro e levado à COP26, reafirmou a defesa de uma agenda verde, baseada no desenvolvimento sustentável.

O pós-COP26 será, sobretudo, marcado pela necessidade de cooperação e um diálogo estruturado entre setor empresarial, instâncias governamentais e sociedade civil para a construção conjunta da agenda interna

Desde o início, esse grupo de empresas defende que uma transição rápida para a economia de baixo carbono é possível e desejada pelo setor empresarial, já que o Brasil poderia inclusive antecipar sua meta de redução das emissões de gases do efeito estufa – esse pleito foi alcançado com a decisão do governo brasileiro de realinhar suas metas, assinar acordos importantes e contribuir para as negociações que resultaram em acordo sobre a regulamentação do mercado global de carbono.

Agora, nos debruçamos sobre o pós-COP26. Mais do que compromissos verbais, o Brasil precisa mostrar como cumprirá as metas assumidas, com medidas práticas que darão legitimidade e credibilidade aos anúncios. O desmatamento dos biomas, especialmente da Amazônia, continua sendo o nosso elefante na sala, respondendo por 44% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa. Temos de agir para mudar isso de forma enérgica. Como lição de casa, precisamos fazer cumprir a NDC anunciada e criar um mercado de carbono regulado doméstico, além da implementação do Código Florestal, ampliando o potencial da agricultura de baixo carbono.

O pós-COP26 será, sobretudo, marcado pela necessidade de cooperação e um diálogo estruturado entre setor empresarial, instâncias governamentais e sociedade civil para a construção conjunta da agenda interna. A colaboração entre os setores econômicos será necessária para superar as lacunas existentes e acelerar as oportunidades que os anúncios realizados na conferência trazem ao país. No CEBDS, estamos preparados para auxiliar as empresas a alcançarem suas metas net zero até 2050, inclusive com os desafios de redução das emissões no chamado escopo três, que diz respeito à descarbonização das cadeias de fornecedores – o que envolve pequenas e médias empresas.

Ambição e ação foram os mantras da COP26, que agora precisam ser postas em prática no curto e no médio prazo, com a velocidade que se precisa imprimir a processos e projetos para que o objetivo maior seja alcançado: evitar um futuro de extremos climáticos e, ao mesmo tempo, direcionar nossas economias para um novo patamar onde todos se beneficiem: as pessoas, os negócios, os países e todo o planeta.

Marina Grossi é presidente do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), entidade com 77 empresas associadas, que representam quase 50% do PIB brasileiro.

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