A resposta do direito brasileiro aos ataques à democracia

Debate

A resposta do direito brasileiro aos ataques à democracia
Foto: Adriano Machado/REUTERS - 08/01/2022

Bruna Santos, Juliana Santos, Lucas Santos e Rodrigo Gomes


08 de fevereiro de 2023

A responsabilização – individual e coletiva – dos agentes envolvidos nas invasões não é suficiente. É preciso promover a desarticulação efetiva de atividades antidemocráticas

Um atentado à democracia não se constrói – tampouco se executa – em um único ato. A deterioração democrática facilitou ataques como os que presenciamos no último dia 8 de janeiro, em Brasília. Foi um processo vagaroso cujas etapas foram executadas e direcionadas por agentes com mandatos eletivos. Embora visíveis, essas etapas são construídas a partir de ações aparentemente legítimas. E a democracia e o estado de direito têm imensas dificuldades de lidar com essa corrosão. A compreensão precisa do desvio de finalidade de atos administrativos discricionários que importam nessa corrosão democrática, no momento em que eles ocorrem, é algo que o direito não solucionou.

No Brasil, esse processo de corrosão encontra suas raízes na ferida mal-curada da ditadura militar, a partir de uma redemocratização marcada por concessões, em que se deixou de responsabilizar os agentes do Estado, especialmente os militares, pelas violações de direitos humanos cometidas à época do período autoritário. Integra essa herança maldita da ditadura o enraizamento nas instituições públicas de uma cultura autoritária, pouco comprometida com a justiça social e com a democracia, que na verdade é sintoma e ápice histórico a demonstrar a vocação violenta e autoritária ancestral que remonta à própria fundação do Brasil enquanto colônia e enquanto país.

Essa ferida vira chaga purulenta com a ascensão de Bolsonaro. A criação de uma narrativa “antiestablishment”, violenta, maniqueísta, supremacista e militarizada, encontra terreno fértil. E é esse discurso que Bolsonaro utilizou para descredibilizar instituições (atacando o sistema eleitoral, o Supremo Tribunal Federal, o Congresso etc.), fragilizar a proteção de direitos humanos e promover discursos e ações anti-minorias.

Identificar esses padrões não implica afirmar que as instituições brasileiras estão completamente à deriva. Embora não tenham conseguido conter a corrosão democrática, elas se mostraram uma barreira sólida às reivindicações ditatoriais ou antirrepublicanas professadas diretamente, como ocorreu no 8 de janeiro.

Mas não é suficiente encarar esse triste episódio como um atentado golpista não consolidado. O regime democrático deve ser construído permanentemente e encontrar formas de se proteger. Duas perspectivas complementares se fazem necessárias sob esse cenário: (i) responsabilização exemplar de participantes, financiadores e agentes públicos envolvidos; (ii) alterações legislativas e administrativas para aperfeiçoamento do regime democrático com a criação de mecanismos institucionais de autoproteção.

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