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Luiza Dulci
A condição de vulnerabilidade social, econômica e política torna as juventudes um dos grupos mais afetados pela crise
No fim de janeiro de 2020 ocorreram os primeiros casos de pessoas contaminadas pela covid-19 no Brasil. Desde então, postagens nas mídias sociais defendem a tese da natureza democrática do vírus, ressaltando que ele acomete a todos sem preconceito. O avanço da pandemia no país mostra, no entanto, que essa ideia não condiz com a realidade. Além dos grupos mais afeitos ao risco de desenvolver a doença e chegar a óbito (idosos, pessoas com deficiências imunológicas e respiratórias, dentre outros), vemos que fragilidades socioeconômicas são um forte componente para sua disseminação em larga escala. Isto é, o vírus e a covid-19 afetam de maneira distinta os variados grupos sociais. Por essas e outras razões, vale uma análise mais detida sobre seus possíveis impactos em um dos segmentos da sociedade brasileira pouco analisado: a juventude, ou melhor as juventudes.
Na medida que não compõem o segmento prioritário do grupo de risco do ponto de vista da saúde — apesar do crescente número de óbitos entre jovens em diversos países —, muitas análises não têm levado em conta os efeitos desta pandemia sobre os jovens. Contudo, a condição de vulnerabilidade social, econômica e política torna as juventudes um dos grupos mais afetados pela crise. Se os efeitos no presente já se mostram devastadores, é importante considerar ainda as consequências que estão por vir. As dimensões da crise nos levam a crer que teremos anos, ou até mesmo décadas, de reconstrução pela frente. Nesse contexto, tanto no médio como no longo prazos, os jovens estão entre aqueles que sofrerão mais e por mais tempo.
De acordo com o Estatuto da Juventude ( Lei n. 12.852/2013 ) são jovens as pessoas entre 15 e 29 anos de idade. Segundo dados do IBGE de 2017, elas somam 48,5 milhões de brasileiros, 23,4% do total da população. São mulheres, homens, brancos, pretos, pardos, indígenas e quilombolas, LGBT, religiosos e ateus, da cidade e do campo, das florestas e das águas, com terra e sem terra, estudantes, trabalhadores, subempregados e desempregados.
A pluralidade que caracteriza a juventude contrasta com o tratamento por ela recebido no âmbito das políticas públicas. Até muito recentemente as agendas governamentais dedicadas à juventude eram circunscritas a um conjunto restrito de ações, focado sobretudo nas áreas educacional e disciplinar.
No Brasil, o ano de 2005 inaugurou a agenda das políticas públicas de juventude no governo federal, com a criação da SNJ (Secretaria Nacional de Juventude), do Conjuve (Conselho Nacional de Juventude) e do ProJovem (Programa Nacional de Inclusão de Jovens). Em 2010, foi aprovada a Emenda Constitucional 65, que inseriu na Constituição Federal o termo jovem; e em 2013 foi sancionado o Estatuto da Juventude. Nesse período, a juventude brasileira foi também objeto de políticas nas áreas de cultura, saúde, segurança, trabalho e emprego, agricultura familiar e reforma agrária, igualdade racial, promoção dos direitos das mulheres, dentre outras. Merecem destaque as conquistas educacionais. Entre 2004 e 2014, cresceu de 32,9% para 58,5% o acesso de jovens de 18 a 24 anos ao ensino superior . Regionalmente, o maior crescimento ocorreu no Nordeste (16,4% para 45,5%). Já considerando a variável raça, observou-se aumento de 16,6% para 45,5% entre negros e de 47,2% para 71,4% entre brancos no mesmo período. Ressalta-se ainda expressiva experimentação da participação social entre as políticas públicas para a juventude. O Conjuve foi o primeiro conselho a ter paridade entre membros do governo e da sociedade civil e as três conferências nacionais de juventude (2008, 2011 e 2015) mobilizaram mais de 1,5 milhão de jovens em todo o país. Os esforços no governo federal incentivaram a elaboração de políticas públicas para a juventude e a criação de conselhos de juventude também nos estados e municípios.
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