O paradoxo do multilateralismo em tempos de pandemia

Debate

O paradoxo do multilateralismo em tempos de pandemia
Foto: Pool New/Reuters

Flavia Loss de Araujo e Kelly Komatsu Agopyan


27 de julho de 2020

A crise mundial apenas escancara um desgaste histórico do modelo de participação e engajamento dos Estados desenvolvido pela ONU nas últimas décadas

Uma constatação que tem sido repetida por muitos analistas é de que a pandemia causada pelo coronavírus se soma a várias outras crises existentes, aprofundando-as. No que diz respeito às relações internacionais, a pandemia colocou em evidência um problema antigo: a crise do multilateralismo.

Apontado como inoperante, ineficiente e custoso, o multilateralismo ganhou novos inimigos com a ascensão do “antiglobalismo”, termo em disputa que significa, entre outras coisas, a reação à governança global e às instituições internacionais e cujo mais importante adepto é Donald Trump, e agora o atual governo de Jair Bolsonaro. Seria então o momento propício de se repensar e reformar esse modelo vigente de cooperação internacional?

O multilateralismo é mais do que a cooperação envolvendo três ou mais Estados. Trata-se da adesão desses atores em torno de um projeto e do compartilhamento de normas e valores comuns, podendo resultar em acordos informais (como os regimes internacionais, ou seja, conjuntos de normas e regras sobre determinada área) ou formais, como são as organizações internacionais, espaços permanentes de cooperação.

É paradoxal que a crise do multilateralismo tenha atingido seu ápice justamente em 2020, ano em que se comemora o seu centenário, inaugurado com o início das operações da Liga das Nações a partir do estabelecimento de sua sede em Genebra, na Suíça. Apesar de extinta em 1946, a Liga é considerada o embrião do que viria ser a ONU (Organização das Nações Unidas), criada em 1945.

As comemorações do centenário foram canceladas devido à pandemia, mas um site lançado pelo escritório da ONU em Genebra reúne informações sobre a sua trajetória. Consciente da crise de credibilidade que vive, a ONU tentou chamar atenção à importância do multilateralismo com a celebração do “Dia Internacional do Multilateralismo e da Diplomacia para a Paz” , realizada pela primeira vez em 24 de abril de 2019. Na ocasião, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, afirmou que os “ desafios globais estão mais conectados , mas nossas respostas estão ficando mais fragmentadas”.

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