Expresso

As pontes que Sergio Moro queimou na sua empreitada política 

Isadora Rupp

23 de junho de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h44)

Ex-juiz da Lava Jato e ex-ministro da Justiça de Bolsonaro começou a fazer pré-campanha no Paraná sem ainda ter definido a que cargo deve concorrer

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FOTO: ADRIANO MACHADO /REUTERS 31.05.2022

Retrato de Sergio Moro em cerimônia do seu partido, o União Brasil. Ele usa terno escuro e camisa branca, está sentado e olha para a câmera

Sergio Moro em cerimônia do seu partido, o União Brasil

Com um tom de “volta para casa”, o ex-juiz, ex-ministro do governo Bolsonaro e ex-presidenciável Sergio Moro iniciou a sua pré-campanha eleitoral no Paraná, seu estado natal. O cargo que vai disputar, porém, ainda está indefinido.

Seu partido, o bilionário União Brasil , analisa se Moro concorrerá ao Senado ou a uma vaga à Câmara dos Deputados – o ex-juiz, por sua vez, cogita disputar o cargo de governador do Paraná.

A solução de retornar ao estado de origem foi uma forma de solucionar o revés da transferência de domicílio eleitoral do candidato para São Paulo, barrado pelo TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo).

No texto abaixo, o Nexo elenca as possibilidades que Sergio Moro liquidou na sua trajetória política e mostra como sua volta ao Paraná é a chance de ele se consolidar na política tradicional.

A saída do Judiciário e a entrada na política

Natural de Maringá, região noroeste do Paraná, Moro se formou em direito na UEM (Universidade Estadual de Maringá) em 1995. De junho de 1996 até novembro de 2018, foi juiz federal do Tribunal Regional Federal da 4ª região. É mestre e doutor pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), onde também lecionou.

FOTO: PAULO WHITAKER/REUTERS 12.09.2017

Outdoor de apoio à Operação Lava Lato, em Curitiba, no auge das investigações em 2017 , com o texto "República de Curitiba, aqui a lei é para todos"

Outdoor de apoio à Operação Lava Lato, em Curitiba, no auge das investigações em 2017

Na capital Curitiba, Moro conduziu processos da Operação Lava Jato entre 2014 e 2018 e ganhou notoriedade popular: a imagem do juiz ficou atrelada ao combate à corrupção. A cidade carregava orgulhosa o título de “República de Curitiba”. Formaram-se grupos de apoio ao juiz e aos procuradores do Ministério Público Federal. Os ativistas, engajados no tema na esteira do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), mantiveram de 2016 a 2018 o Acampamento Lava Jato , em frente à sede da Justiça Federal, onde Moro dava expediente.

O reconhecimento público gerou especulações sobre a sua saída do Judiciário para uma entrada na política, algo que ele negou em diversas ocasiões .

“Não, jamais. Jamais. Sou um homem de Justiça e, sem qualquer demérito, não sou um homem da política”

Sergio Moro

ex-ministro em sua primeira entrevista como juiz da Lava Jato, em 2016, ao jornal O Estado de S. Paulo

Com intensa cobertura da imprensa, prisões de empreiteiros e políticos, a Lava Jato possibilitou que o nome de Sergio Moro ficasse conhecido nacionalmente. Em abril de 2018, a condenação e prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tirou o petista da disputa ao Planalto, poucos meses antes das eleições vencidas por Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno. Em novembro daquele ano, com Lula preso e Bolsonaro eleito, Moro pediu exoneração da magistratura para ser ministro da Justiça do vencedor da disputa.

As rusgas com Bolsonaro e a cadeira no STF

No primeiro ano do mandato Bolsonaro, em dezembro de 2019, Sergio Moro foi apontado como o ministro mais popular e bem avaliado de acordo com pesquisa Datafolha: 53% consideraram a sua gestão como ótima ou boa na pasta. Bolsonaro tinha 30% de ótimo/bom em relação ao seu governo.

FOTO: ADRIANO MACHADO/REUTERS

Jair Bolsonaro e Sergio Moro, ambos de terno, descem lado a lado rampa interna do Palácio do Planalto

O presidente Jair Bolsonaro e Sergio Moro, então ministro da Justiça, no Palácio do Planalto

As aparições públicas e a proximidade de Moro a figuras que antagonizaram com Bolsonaro, como o ex-governador de São Paulo João Doria (PSDB), irritaram o presidente.

Moro também sofreu com frituras públicas e a sua principal agenda, a anticorrupção, perdeu fôlego durante o governo Bolsonaro. O próprio presidente decretou o fim da Lava Jato ao dizer que em sua gestão havia acabado com a corrupção.

Os dois travaram um embate pela troca do comando da Polícia Federal, na época a cargo de Maurício Valeixo, considerado braço direito de Moro. Valeixo foi exonerado por Bolsonaro sem que o então ministro soubesse.

Moro pediu demissão em abril de 2020, 16 meses depois de ter assumido o comando do Ministério da Justiça. Ele alegou que o presidente afirmava ter lhe dado “carta branca” para governar a pasta, mas que a atitude do presidente em relação a Valeixo era uma interferência política.

Depois que o ministro deixou o cargo, Bolsonaro concedeu uma entrevista coletiva em que acusou Moro de ter pedido uma vaga no Supremo Tribunal Federal para aceitar a saída de Valeixo. Especulações sobre um pedido de Moro para ser indicado para a Corte já tinham surgido em 2018, quando ele aceitou o convite para comandar o Ministério da Justiça.

FOTO: MARCELLO CASAL/AGÊNCIA BRASIL

Sem Sergio Moro, discurso de combate à corrupção no governo de Bolsonaro perde força

Bolsonaro reuniu ministros para rebater acusações de Sergio Moro em pronunciamento nesta sexta-feira (24)

Moro saiu da pasta sem vaga no Supremo, rompido com Bolsonaro e com o bolsonarismo raiz, que enxergou nas suas atitudes vaidade e defesa de interesses pessoais.

A parcialidade como juiz da Lava Jato

Moro busca mostrar seu legado no combate à corrupção mesmo após ter sentenças anuladas pelo Supremo por uma atuação considerada parcial contra Lula no caso do triplex do Guarujá. Em 2019, a relação do ex-juiz e procuradores da Lava Jato foi revelada em uma série de reportagens publicadas pelo The Intercept Brasil, que mostram discussões internas e controversas da força-tarefa.

No campo judicial, além das derrotas nos processos contra Lula, que deixou a carceragem da Polícia Federal em novembro de 2019, após 580 dias preso, Moro amargou um novo revés em 1° de dezembro de 2021, quando o Superior Tribunal de Justiça anulou as condenações do ex-ministro da Fazenda do governo petista Antônio Palocci, do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e do ex-diretor de serviços da Petrobras Renato Duque, todos condenados por Moro.

FOTO: RODOLFO BUHRER/REUTERS – 26/9/2016

Palocci é conduzido em Curitiba após sua prisão, em setembro de 2016

Palocci é conduzido em Curitiba após sua prisão, em setembro de 2016

Sem magistratura e cargo do governo, Moro cumpriu quarentena obrigatória de 6 meses e seguiu para a iniciativa privada – o período é necessário quando a autoridade deixa a atividade pública, para evitar conflitos de interesses. Foi trabalhar nos Estados Unidos como consultor na Alvarez & Marsal. O sigilo sobre o seu salário foi motivo de cobrança pública e alvo de investigação no TCU (Tribunal de Contas da União), por suspeita de revolving door (quando a migração de um agente do setor público para o privado pode envolver interesses questionáveis).

Em entrevista ao jornal Gazeta do Povo na quinta-feira (22), Moro diz não ter se arrependido de largar o judiciário para integrar o governo Bolsonaro. “Não me arrependo. Acolhi o convite com a expectativa de contribuir para uma transformação para o Brasil, implementar uma agenda importante”, afirmou . “Acabei me desapontando, mas não me arrependendo.”

Ex-presidenciável e rusgas com partidos

Mesmo no exterior e com uma incerteza sobre seu retorno à política, o nome de Sergio Moro continuava cobiçado entre os partidos que tentavam viabilizar nomes relevantes para disputar com Lula e Bolsonaro o cargo majoritário em outubro de 2022. Em novembro de 2021 ele retornou ao Brasil e filiou-se ao Podemos e teve o senador Álvaro Dias como principal padrinho político.

Na sequência, em dezembro de 2021, Moro realizou em capitais brasileiras uma turnê para promover o seu livro, “Contra o Sistema da Corrupção”. Nas conversas do lançamento, se dividiu em dois temas: autoelogios a seu trabalho na Lava Jato e críticas ao presidente Bolsonaro.

FOTO: REPRODUÇÃO/TWITTER SERGIO MORO

O ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro em lançamento do seu livro em Curitiba, no dia 2 de dezembro de 2021.

O ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro em lançamento do seu livro em Curitiba, no dia 2 de dezembro de 2021.

São os mesmos assuntos que nortearam a sua pré-candidatura presidencial pelo Podemos: embora pequeno e com recursos mais modestos de fundo eleitoral, a legenda bancou inicialmente as pretensões presidenciais de Moro, que estava em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, com 8% em média. Muito atrás de Lula e Bolsonaro, que se mantêm em patamares estáveis , acima de 40% e 30%, respectivamente.

Os números estagnados geraram pressão interna para que Moro não concorresse ao Planalto, já que uma candidatura nacional poderia consumir boa parte do dinheiro público a que o Podemos tem direito em 2022. Nome mais viável da chamada “terceira via”, Moro anunciou em 31 de março de 2022 a desistência de concorrer à Presidência pela legenda, que no mesmo dia trocou pelo União Brasil, o partido do bilhão em 2022: a fusão do DEM (Democratas) com o PSL (Partido Social Liberal) garantiu à legenda um fundo eleitoral e partidário bilionário.

A saída de Moro do Podemos não pegou bem entre correligionários, entre eles o padrinho político Álvaro Dias e a presidente do partido, Renata Abreu . A deputada federal disse que ficou sabendo da decisão do ex-juiz pela imprensa. Para ser aceito pelo União Brasil, Moro teve que aceitar condições como desistir de concorrer ao Palácio do Planalto.

FOTO: ADRIANO MACHADO/REUTERS

Sergio Moro está de pé num púlpito com o seu nome e uma bandeira do Brasil ao fundo

Sergio Moro durante evento de filiação ao Podemos

A vaga ao Senado por São Paulo não vingou por enfrentar resistências dentro da ala paulista do partido , e a ideia era que o nome de Moro servisse como um puxador de votos para o União Brasil na Câmara dos Deputados. No dia 7 de junho, uma decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) rejeitou a transferência do domicílio eleitoral para a capital paulista.

Na decisão, os juízes do TRE entenderam que Moro não tem vínculos pessoais e profissionais com o estado. Para conseguir a transferência, Moro havia registrado o endereço de um flat no bairro Itaim Bibi. O parecer do tribunal ceifou novamente os planos do ex-magistrado e ex-ministro. Restou a ele o Paraná.

As propostas da pré-campanha de Moro

“Em breve, cinco propostas para transformar o Paraná e o Brasil”, escreveu Sergio Moro em seu perfil no Twitter na terça-feira (21). No vídeo da pré-campanha, divulgado dias antes, Moro diz que enfrenta ataques e resistência por ir contra um “sistema de privilégios e da corrupção que não me vê como aliado pelo que já fiz pelo Brasil”.

O tom da comunicação é de felicidade em “voltar para casa”. Idas a restaurantes e reuniões com empresários na capital Curitiba e visita à sua cidade natal, Maringá, integram a agenda do pré-candidato, que ainda conserva uma imagem positiva no estado. Só falta definir o cargo, decisão que o União Brasil deve tomar em julho.

Por enquanto, pesquisas internas apontam o Senado como a melhor opção. Isso implicaria disputar com Álvaro Dias – ele e o padrinho político já selaram um “ pacto de não agressão ” caso sejam adversários. Há apenas uma vaga em disputa em outubro. Em 2022, um terço do Senado será renovado: o mandato dos senadores têm duração de 8 anos e, por isso, há senadores eleitos em 2018 que seguirão em seus cargos até 2026.

No entanto, o União Brasil também encomendou uma pesquisa eleitoral com o nome de Moro candidato ao governo do Paraná. Segundo informações de bastidor, ele avalia a possibilidade de se lançar ao Executivo. Nesse caso, seu maior adversário seria o atual governador Ratinho Júnior (PSD), aliado de Bolsonaro.

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