Como agir quando pensar na crise climática me paralisa?
Mariana Marques
31 de agosto de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h40)Uma ativista e uma psicóloga especializada em temas ambientais dizem como lidar com a ‘ansiedade climática’ e superar os momentos em que a preocupação com o planeta começa a afetar a saúde mental
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Manifestante segurando um globo terrestre despedaçado em um protesto do movimento “Fridays for Future”
Buscar informação e conscientização sobre a mudança climática e o nosso impacto no planeta são passos importantes para enfrentar a crise do clima. Mas muitas vezes, a dimensão dos problemas a serem sanados e a escassez de tempo provocam sentimentos paralisantes.
Essa angústia já ganhou até nome: “ecoansiedade” ou “ansiedade climática”. Os termos são usados com frequência por grupos ligados à causa ambiental e foram descritos pela Associação Americana de Psicologia como “medo crônico da ruína ambiental”. A entidade divulgou um relatório em 2021 alertando para os efeitos da crise do clima na saúde mental.
“A preocupação com as mudanças climáticas, somada à preocupação com o futuro, podem levar ao medo, raiva, sentimentos de impotência, exaustão, estresse e tristeza, comumente descritos como ‘ecoansiedade’ ou ‘ansiedade climática’. Estudos indicam que essa ansiedade é mais prevalente entre pessoas jovens; e tem sido associada ao aumento do uso de substâncias e idealizações suicidas”
A Ponto Futuro , editoria do Nexo dedicada a pensar futuros possíveis, convidou duas profissionais com experiência na área ambiental para responder o que pode ser feito quando o medo da crise climática é paralisante:
“Penso que paralisada os problemas não se resolvem, e pelo meu amor à nossa espécie e beleza do nosso planeta eu junto forças para continuar lutando por mudanças.
Nunca pensei na crise climática como não tendo solução, pois existem muitas. Para mim o problema real mesmo é a falta de mobilização política para implementar essas soluções. Então escapo dessa ideia lembrando que tem muita gente, principalmente da minha geração, que está lutando para ocupar exatamente essas posições de tomada de decisão, e que vão conseguir. Enquanto não chegam lá, a mobilização da sociedade civil para pressionar aqueles que têm o poder é importantíssima, e já faz parte da solução.
Acho importante que cada pessoa encontre seu papel na luta climática, pois assim podem se dedicar à causa nas mais diferentes áreas de atuação. O problema parece ser maior quando pensamos que a solução é ‘one size fits all’, que é apenas uma solução milagrosa para resolver tudo. Mas não, em cada contexto há abordagens diferentes, e quando ‘quebramos’ o problema em partes menores fica mais fácil enxergar uma saída.
Então é entender que o problema do mundo é resolvido em pequenas partes, onde cada um tem um papel importante, independentemente de qual a área de atuação. Pensando assim não me paraliso, pois sei que apesar da lentidão daqueles que têm o ‘poder’ hierárquico para implementar mudanças, há muito trabalho a ser feito em menores escalas.”
“A sensação de paralisação é uma entre tantas respostas emocionais diante de uma questão difícil de ser enfrentada. Quando entramos em contato com dados reais, sejam eles projeções científicas das consequências geradas pela crise climática ou fatos vivenciados ao redor do mundo, podemos nos sentir impotentes e é importante acolher as emoções sentidas nesse momento.
Antes de pensar em agir é necessário entender quais pensamentos, emoções e sentimentos estão associados à sensação de paralisação. Por exemplo, se você está se sentindo paralisado quando pensa nas mudanças climáticas e associa esse sentimento ao medo da escassez de água, pode pensar em quais estratégias podem ser adotadas em curto prazo para mitigar a falta de água. Se, somado a isso, existir o medo de perder seu emprego porque ele não gera impactos positivos, você pode adaptar sua atuação profissional para trabalhar em carreiras verdes. A ação sempre deve ser resultado de autorreflexão e autoconhecimento!
Outro ponto importante é se fortalecer coletivamente, participando de grupos e interagindo com pessoas que compartilham do mesmo desejo de regenerar os sistemas ambientais e sociais. Um dos fatores da resiliência é ter relações nutritivas, compartilhar problemas e se sentir compreendido. Nutrir a sensação de que ‘não estou sozinho nessa causa’ fortalece nossa resiliência e ajuda a manter esperança e motivação para continuar agindo.
Para desenvolver recursos psicológicos eficazes para enfrentar o futuro da humanidade precisamos nos deixar afetar pelas experiências individuais e coletivas da vida que nos cerca. Adicionalmente, precisamos de espaços emocionalmente seguros para expor nossos sentimentos e vulnerabilidades. Particularmente, desconheço melhores espaços do que a psicoterapia e as relações comunitárias saudáveis.
Quando entendemos o que podemos fazer a partir de quem somos, do conhecimento que temos e das condições que nos circundam, veremos que há soluções. Mesmo com limitações de recursos, internos ou externos, existe algo a ser feito. É relevante, também, aceitar que nossas ações são limitadas. E esse é um dos grandes problemas na tomada de decisão para comportamentos pró ambientais, a demora para colher resultados. Esse é o grande desafio: aceitar que não resolveremos tudo no tempo que gostaríamos, mas que isso não pode nos resignar e impossibilitar ações que cuidam do nosso presente e do futuro da humanidade.
Além disso, é extremamente importante que as pessoas engajadas com as mudanças climáticas tenham autoconhecimento para compreender os seus limites psicológicos. Frequentemente, atendo pessoas que estão emocionalmente esgotadas e desesperançosas porque ‘em nome da causa’ esqueceram de cuidar delas mesmas. Deixam de nutrir relações significativas, de se divertir, descansar, de apreciar a natureza e isso as deixa ainda mais vulneráveis e enfraquecidas para enfrentar problemas complexos e que só serão resolvidos coletivamente.
Honestamente, acredito que essa ideia de que o problema é tão grande que não tem solução irá acometer a todos em algum momento. A forma como enfrentamos esse questionamento e as consequências emocionais e materiais das mudanças climáticas é que irá pautar o futuro da humanidade. Não se trata mais do que iremos enfrentar, mas de como iremos enfrentar. E essa habilidade de enfrentamento pode e deve ser desenvolvida em todos nós.”
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