O que são vacinas bivalentes. E por que não há doses no Brasil
Mariana Vick
21 de novembro de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h50)Tipo de imunizante contra a covid-19 já é aplicado em países como Chile, Canadá e Estados Unidos. Anvisa ainda analisa autorização para uso no país, enquanto número de casos vem aumentando
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Homem recebe dose de vacina bivalente da Pfizer contra a covid-19, nos Estados Unidos
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) liberou nesta terça-feira (22) o uso emergencial das chamadas vacinas bivalentes , versões do imunizante contra a covid-19 produzidas pela farmacêutica Pfizer que foram atualizadas para combater novas variantes do coronavírus.
Apontadas como uma das soluções para lidar com a covid-19 no futuro, as vacinas bivalentes, ou vacinas de segunda geração, estão no centro das discussões sobre a pandemia no Brasil desde que o país identificou a circulação da BQ.1, nova subvariante da ômicron, em outubro. A sublinhagem levou ao aumento de casos de covid-19 em diversos estados e incentivou governos locais a retomarem restrições .
Neste texto, o Nexo explica como as vacinas bivalentes funcionam e o que marca a nova fase da pandemia que as trouxe para o centro da discussão. Mostra também qual é a previsão de que elas cheguem ao país e quais são outras vacinas contra a covid-19 em desenvolvimento.
As vacinas bivalentes produzidas pela Pfizer e por laboratórios como a Moderna são vacinas de mRNA (ou RNA mensageiro , mesma tecnologia dos primeiros imunizantes criados pela Pfizer contra a covid-19) que têm o diferencial de serem adaptadas para combater a variante ômicron do coronavírus, que hoje é a principal em circulação.
A ômicron é uma linhagem do novo coronavírus identificada em novembro de 2021 na África do Sul. Em 2022, tornou-se a variante dominante do vírus em diversos países, incluindo o Brasil. Com os meses, ela passou a produzir subvariantes, ou seja, sublinhagens que dividem características com a ômicron original, mas não são idênticas a ela.
Passageiros transitam na rodoviária central de Brasília, DF
É comum que vírus como o coronavírus tenham mutações e produzam novas variantes ou subvariantes. Essas mutações acontecem devido a erros que ocorrem durante a replicação do vírus no organismo do hospedeiro. Quanto mais o vírus circula, mais esses erros acontecem. Quando essas mutações têm vantagens evolutivas — a ômicron, por exemplo, é mais transmissível que o coronavírus original —, tornam-se dominantes.
A vacina bivalente tem a vantagem de ser mais eficaz contra a ômicron do que os primeiros imunizantes produzidos contra a covid-19, que foram desenvolvidos para combater o coronavírus original, descoberto em 2019, na China. Apesar de serem eficazes para prevenir doença grave e morte pelo coronavírus, as vacinas originais são menos eficientes para bloquear o contágio pela ômicron, que escapa parcialmente de sua proteção.
Frasco de vacina bivalente da Pfizer contra a covid-19
Imunizantes feitos de RNA mensageiro, como as vacinas bivalentes da Pfizer e da Moderna, garantem imunidade contra doenças como qualquer outro. A diferença está em como eles fazem isso: enquanto vacinas convencionais usam vírus atenuados ou inativados para despertar a resposta imune do organismo, essas utilizam o mRNA sintético desenvolvido em laboratório.
O RNA mensageiro serve para fornecer informações ao organismo para criar proteínas. No caso da vacina contra a covid-19, o mRNA produzido em laboratório ensina o corpo humano a fabricar a proteína S do coronavírus, responsável pela ligação do vírus com as células humanas. Assim que a vacina é injetada e o organismo passa a fabricar essas proteínas, os processos de defesa começam a se desencadear.
A diferença entre uma vacina de mRNA comum e a vacina bivalente é que, em vez de conterem apenas um trecho de RNA mensageiro, elas contêm dois : um para ajudar o corpo humano a produzir a defesa contra o coronavírus original (como as primeiras vacinas contra a covid-19) e outro para desencadear defesas específicas contra a variante ômicron.
O país identificou o primeiro caso de um paciente infectado pela subvariante BQ.1 do coronavírus no dia 20 de outubro, no Amazonas. A descoberta foi da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). Mais tarde, a nova sublinhagem também foi registrada em estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Rio Grande do Sul.
Também presente em outros países, a BQ.1 é responsável por uma nova onda da covid-19 na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos. A principal diferença entre essa sublinhagem e a ômicron original (além de outras subvariantes) é a maior capacidade de escape da proteção oferecida pelas vacinas.
Enfermeira trabalha em UTI do SUS, em São Paulo
Segundo boletim Infogripe da Fiocruz divulgado na sexta-feira (18), 12 estados brasileiros registraram aumento dos casos de covid-19 nas últimas quatro semanas. O documento afirma que, hoje, o coronavírus responde por 47% de todos os resultados positivos para doenças respiratórias no Brasil. No fim de outubro, ele respondia por 26,4%.
Em estados como São Paulo, o aumento de casos foi acompanhado pelo aumento de internações em UTIs (unidades de terapia intensiva) por covid-19. De 17 a 31 de outubro, as hospitalizações desse tipo cresceram 86% no estado, embora estejam em patamares mais baixos do que na fase mais grave da pandemia, em 2021. O número de mortes por coronavírus não aumentou da mesma forma.
23,1%
foi a taxa de testes com resultado positivo para covid-19 (indicador que mede a circulação do coronavírus) na primeira semana de novembro, segundo a Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica; no começo de outubro, essa taxa era de 3,7%
Segundo profissionais de saúde, fatores como aumento das aglomerações, o relaxamento no uso de máscaras e a queda da imunidade dos vacinados (o tempo médio da proteção da vacina contra a covid-19 é de cinco meses) ajudam explicar a alta de casos, além da circulação da BQ.1.
Fora isso, a cobertura vacinal caiu. Segundo dados do consórcio de veículos de imprensa, apesar de 80% da população brasileira ter feito o esquema vacinal completo contra a covid-19 (de duas doses), apenas 50% tomaram a terceira e a quarta doses de reforço, consideradas fundamentais para o combate a variantes mais transmissíveis, como a ômicron e suas sublinhagens.
Homem com os filhos às margens do rio Negro, em Manaus (AM)
Em resposta ao aumento de casos, a Sociedade Brasileira de Infectologia divulgou uma nota no dia 11 de novembro recomendando a retomada de práticas como usar máscaras em locais públicos, evitar aglomerações e tomar as doses de reforço disponíveis para cada faixa etária.
Governos locais e instituições voltaram a sugerir ou determinar restrições. Na sexta-feira (18), a prefeitura de Belo Horizonte passou a obrigar o uso de máscaras no transporte público e no sistema de saúde. O governo do estado do Rio de Janeiro voltou a recomendar na mesma data a proteção no transporte e em ambientes fechados. Em São Paulo, universidades como a USP (Universidade de São Paulo) passaram a obrigar o uso de máscaras em locais fechados.
Apesar de as vacinas originais contra a covid-19 serem importantes para conter o avanço do vírus — principalmente a terceira e a quarta dose, e principalmente para prevenção de doença grave e morte por covid-19 —, os imunizantes bivalentes têm sido requisitados por serem mais adaptados à ômicron e às suas sublinhagens, que têm escape parcial dessa proteção.
Países como Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Chile aprovaram os imunizantes atualizados em setembro, dois meses antes do Brasil. Com a liberação da Anvisa, o imunizante pode começar a ser distribuído no país.
A distribuição das doses dependerá do Ministério da Saúde, que afirma que “reforça o interesse em adquirir novas versões dos imunizantes e ressalta que o atual contrato com os fornecedores contempla a entrega de vacinas com cepas atualizadas”.
Reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostra, por outro lado, que a estratégia de vacinação do Ministério da Saúde para o futuro ainda está indefinida , bem como a quantidade de doses utilizadas. Segundo especialistas as vacinas bivalentes devem ser aplicadas apenas em 2023. Questionados, representantes da equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, não responderam qual sua estratégia para o próximo ano.
Além das vacinas gênicas, pesquisadores desenvolvem e aplicam outros tipos de vacinas para tentar combater a pandemia. Em 2022, por exemplo, a China aprovou o uso de um imunizante nasal e de um imunizante oral para pessoas que iriam se vacinar pela primeira vez ou receber a dose de reforço do imunizante tradicional.
Imunizantes orais e nasais têm a vantagem de serem mais fáceis de armazenar do que os que exigem o uso de agulha. Com isso, pesquisadores esperam que sua distribuição possa tornar a vacinação mais acessível em países com sistemas de saúde frágeis. As vacinas nasais têm também o diferencial de serem aplicadas na porta de entrada do coronavírus, com potencial de serem mais eficazes na prevenção do contágio.
Trabalhador de limpeza pública atua em meio a lockdown em Sanya, na China
Países como Israel, Cuba e Estados Unidos também estudam esse tipo de imunizante. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), cerca de uma dúzia de vacinas nasais estão sendo testadas em todo o mundo. Mesmo que já venham sendo aplicadas em lugares como a China, a eficácia das vacinas sem agulhas ainda está em estudo.
Pesquisadores brasileiros também desenvolvem novas vacinas contra a covid-19. Em 2021, o país tinha 17 projetos para obter imunizantes nacionais. Entre elas, está a ButanVac , produzida pelo Instituto Butantan, que usa a tecnologia de inoculação do vírus inativado em ovos embrionados, e uma vacina da Fiocruz que utiliza o vírus influenza (da gripe) para combater a covid-19.
Embora as vacinas disponíveis sejam seguras e eficazes contra a covid-19, o desenvolvimento de novos imunizantes é importante para grupos vulneráveis à doença (como idosos e pessoas com comorbidades), que precisam de mais proteção, e populações de países mais pobres e com menos acesso à vacina.
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