Expresso

Qual a importância da COP da biodiversidade da ONU 

Mariana Vick

06 de dezembro de 2022(atualizado 28/12/2023 às 22h52)

Conferência que está na 15ª edição acontece no Canadá e busca acordo global para reverter perda de espécies e ecossistemas. Resolução depende de negociações de países 

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FOTO: FERNANDO STANKUNS/FLICKR

Tuiuiú, uma ave com bico longo, cabeça preta e corpo branco, voa sobre uma área de vegetação.

Tuiuiú, ave considerada o símbolo do Pantanal, em fazenda em Miranda (MS)

Depois da COP27 , conferência global do clima que aconteceu em novembro, no Egito, começa nesta quarta-feira (7) outra cúpula da ONU: a COP15 , voltada para a biodiversidade, queem 2022 é sediada em Montreal, no Canadá. O evento dura até 19 de dezembro.

Junto com a mudança climática , a perda de biodiversidade ameaça a vida e o bem-estar humano na Terra. Os países que se reúnem na COP15 buscam assinar um acordo global para reverter a tendência atual de extinção de espécies e ecossistemas, com ambição semelhante à do Acordo de Paris para o clima de 2015. Essa resolução, no entanto, irá depender de negociações.

O Nexo explica o que é a COP15, por que ela é importante e o que é a crise atual da perda de biodiversidade. Mostra também quais são as expectativas para o evento no Canadá e o que um possível novo acordo para a biodiversidade pode ter de concreto.

O que é a COP da biodiversidade

Para entender o que é a COP15, é preciso voltar atrás para explicar a CDB ( Convenção sobre Diversidade Biológica), tratado internacional que entrou em vigor em 1993, depois da ECO-92, conferência ambiental da ONU que aconteceu no Rio de Janeiro no ano anterior.

A CDB tem três objetivos: conservar a biodiversidade global, garantir o uso sustentável das espécies e ecossistemas e desenvolver formas justas e equitativas de compartilhar os benefícios do uso econômico dos recursos genéticos, como drogas e outras tecnologias encontradas na natureza.

FOTO: BRUNO KELLY/REUTERS – 14.AGO.2021

Família do povo Cambeba participa de aula de canoagem, no rio Cueiras, no estado do Amazonas

Família do povo Cambeba participa de aula de canoagem, no rio Cueiras, no estado do Amazonas

A convenção é regida por uma Conferência das Partes, a COP, uma reunião de representantes dos países que ratificaram o tratado. O Brasil está entre eles. Assim como as cúpulas do clima da ONU (que também foram criadas a partir de um tratado climático assinado em 1992), as COPs da biodiversidade servem para construir consensos sobre o tema e avançar em novos acordos para cumprir os objetivos da CDB.

A COP da biodiversidade acontece a cada ano par (diferentemente da conferência do clima da ONU, que é anual). A décima quinta edição da cúpula estava prevista para acontecer em Kunming, na China, em 2020, mas foi adiada por dois anos por causa da pandemia de covid-19.

Esse atraso levou a organização da COP15 a realizar o evento em duas partes. A primeira aconteceu de forma virtual, em outubro de 2021, quando os participantes assinaram a Declaração de Kunming, que propõe avanços em compromissos com a biodiversidade. A segunda acontece agora em Montreal.

O que esperar da COP em 2022

A conferência de biodiversidade da ONU estabeleceu em 2010, no Japão, as Metas de Aichi, um acordo global de conservação válido por uma década. O tratado, porém, não prosperou: de 2011 a 2020, nenhuma das 20 metas do documento foram totalmente alcançadas, e apenas seis foram parcialmente atendidas.

A COP15, no Canadá, busca aprovar um novo marco global para a biodiversidade no período de 2020 a 2030. O texto deve definir novas metas de conservação, uso sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade nos próximos oito anos e traçar caminhos para reverter a perda de espécies.

FOTO: BRUNO KELLY/REUTERS – 05.JUN.2017

Com folhas desfocadas em primeiro plano, onça olha direto para a câmera

Onça-pintada nos galhos de uma árvore no estado do Amazonas

A conferência publicou em março o primeiro rascunho do texto que deve ser debatido em Montreal. Entre as metas mais relevantes do documento, está a meta 3, que estabelece que os países devem garantir a conservação de pelo menos 30% das áreas terrestres e marinhas globais até 2030.

Os países também tentam chegar a acordos sobre o financiamento da conservação da biodiversidade. A meta 19 do rascunho propõe reservar US$ 200 bilhões por ano para países em desenvolvimento e aumentar em pelo menos US$ 10 bilhões por ano esse apoio até 2030.

US$ 500 bilhões

é quanto o rascunho do acordo da COP15 propõe reduzir a cada ano em incentivos prejudiciais para a biodiversidade (como financiamento para setores que poluem)

A manutenção dessas metas no texto final do acordo vai depender das negociações dos dias 7 a 19 em Montreal. O grau de ambição de algumas propostas pode transformar o novo texto, se aprovado, em um documento para a biodiversidade equivalente ao Acordo de Paris de 2015, tratado global para o clima mais ambicioso assinado até hoje.

Caso seja aprovado, o acordo deve incentivar os países que participam da COP a adotar novas políticas para conservar a biodiversidade — políticas de combate ao desmatamento, por exemplo — e cumprir as metas do texto.

Apesar disso, as metas desse tipo de acordo não são impositivas. Os países que não as cumprirem não sofrerão sanções — embora provavelmente venham a ser pressionados pela comunidade global e sociedade civil a respeitar o texto, como acontece hoje com os países que assinaram o Acordo de Paris.

Quais são os pontos controversos

Conservação de 30%

Existem ressalvas sobre como os 30% das áreas terrestres e marinhas globais a serem conservadas devem ser calculados: se individualmente (cada país deve conservar 30% de seu território, por exemplo) ou se globalmente. Caso a opção seja por uma divisão global, há dúvidas sobre como dividir essas áreas entre cada país.

Financiamento

Também não há consenso sobre a proposta desenhada no rascunho de financiamento da conservação da biodiversidade. Os países têm dúvidas sobre como criar um mecanismo para alocar esses recursos e distribuir os valores de forma equitativa.

Recursos genéticos

O acordo em discussão propõe implementar medidas para facilitar o acesso aos recursos genéticos da biodiversidade e garantir a repartição equitativa dos benefícios decorrentes do uso desses recursos. O tema opõe países mais ricos, que têm tecnologia para explorar esses recursos, e os mais pobres, onde geralmente eles estão.

O quadro da crise de biodiversidade

Com a criação de novos marcos para a proteção da biodiversidade, a conferência da ONU sobre o tema busca reverter a tendência atual de ameaça de extinção ou perda de fato de diversas espécies e ecossistemas considerados importantes para a vida na Terra.

Essa perda tem sido documentada por pesquisadores. Segundo o relatório Planeta Vivo de 2022, as populações de vida selvagem monitoradas no mundo foram reduzidas em 69% de 1970 a 2018. Outro estudo da IPBES (Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos) mostra que hoje 1 milhão de espécies de animais e plantas estão ameaçadas de extinção.

75%

da superfície terrestre foi alterada significativamente pela ação humana, segundo relatório da IPBES

66%

da área oceânica tem sofrido impactos de atividades como a pesca, além da poluição e da acidificação

40%

das espécies de anfíbios estão ameaçadas

33%

dos recifes formadores de corais estão ameaçados

9 milhões

é a diversidade total de espécies conhecidas (sem contar bactérias e outros microrganismos), segundo análise publicada no Nexo Políticas Públicas a partir de diferentes dados

A perda de biodiversidade tem diversos impactos sobre a vida e o bem-estar humano. Do ar que se respira até a água e os alimentos, a natureza é responsável por fornecer elementos essenciais para as pessoas, que no jargão são chamados de serviços ecossistêmicos .

FOTO: BRUNO KELLY/REUTERS – 08.JUL.2022

Imagem aérea mostra área desmatada. Do lado direito, há um pouco de árvores em pé.

Área desmatada da floresta amazônica em Manaus, no Amazonas

Também estão incluídos nesses serviços benefícios de saúde, culturais, espirituais e econômicos. Cerca de US$ 125 trilhões em serviços ecossistêmicos são fornecidos à economia global todos os anos por meio de água, alimentos, ar fresco e solo produtivo, que contribuem para setores como o agrícola, o industrial e o energético, por exemplo.

Esses benefícios valem tanto para quem vive em grandes cidades quanto para quem está no litoral ou vive no campo e em área de floresta. Populações indígenas e outros povos tradicionais (como ribeirinhos e caiçaras), no entanto, dependem mais da conservação da natureza para manter sua cultura e seus modos de vida. Esses também são os grupos que mais protegem a biodiversidade global.

O papel do Brasil na cúpula

O Brasil é o país mais megadiverso do mundo, ou seja, é o país que abriga o maior número de espécies conhecidas, em grande parte por causa de biomas como Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica. Também é o país que mais se beneficia dos serviços ecossistêmicos, segundo o Nexo Políticas Públicas .

10%

é quanto o Brasil tem de toda a biodiversidade global

Depois de o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, ter declarado o compromisso de combater a mudança climática na COP27, no Egito, há expectativa da sociedade civil de que o Brasil reafirme na COP15 seu compromisso com o desmatamento zero e a proteção da biodiversidade em todos os biomas.

O país pode ser um dos líderes na negociação para um acordo em Montreal equivalente ao Acordo de Paris de 2015, segundo organizações da sociedade civil. As ex-ministras do Meio Ambiente Marina Silva e Izabella Teixeira, que fazem parte da equipe de transição de Lula, devem ir ao Canadá para representar o futuro governo. O governo atual, de Jair Bolsonaro, também enviará à COP15 integrantes do Itamaraty e outros negociadores.

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