Coluna

Giovana Xavier

Final feliz

13 de novembro de 2018

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Por mais que a universidade não vá diretamente resolver os gravíssimos problemas que afetam a existência das comunidades negras, estar nela na “primeira pessoa” é indispensável

Assistíamos empolgadas à mesa “Primeira pessoa”. Quando a colunista Ana Paula Lisboa comentou que “se não teve privilégios, teve os encontros que me proporcionaram cursar a universidade”, eu e minha amiga iniciamos uma conversa paralela. “Final Feliz é o nome de uma favela no Rio de Janeiro que pouca gente conhece. O acesso é de bote. As casas são de palafita. O lugar é assustador em termos de miséria, desumanização, entre elas a presença do tráfico”. Senti um arrepio imaginando como um lugar com características tão aterrorizantes poderia se chamar “Final Feliz”. Eu perguntei a ela: final feliz para quem? Olhamos uma para outra com cara de pois é. Era um lindo domingo de sol. Continuamos, atentas, ouvindo os palestrantes.

***

Na semana passada, entre 6 e 11 de novembro, aconteceu no Rio de Janeiro a Festa Literária das Periferias . Em sua sétima edição, o evento que apresentou como tema “Cais do Valongo: a negritude brasileira”, reafirmou-se como um espaço político voltado para a visibilização das juventudes negras como produtoras de conhecimento e de projetos democráticos para a sociedade brasileira. Em seis dias de programação intensa, a #flup2018 trouxe mesas de debates, performances, além dos campeonatos nacional e internacional de slam, a poesia falada que representa um dos principais ícones de trabalho intelectual inovador e que se liga ao acesso de jovens negros às universidades públicas.

Na edição internacional, sagrou-se campeão o belga Lizette Ma Neza com sua linda carta para Beethoven. Já na modalidade nacional Juliana Jesus, de São Paulo, foi a grande vencedora da noite com uma emocionante homenagem ao menino Pipa. Além dos jovens poetas, uma vasta e qualificada lista de artistas, estudantes, escritores, acadêmicos, influenciadores digitais, livreiros, estilistas estiveram na Biblioteca Parque Estadual do Rio de Janeiro. A jornalista Flavia Oliveira, as escritoras Ana Maria Gonçalves, Conceição Evaristo, Esmeralda Ribeiro, Jarid Arraes, Selma Silva. A cineasta Rokhaya Dialo, a slamer Roberta Estrela D’Alva, a cantora Liniker, Gilberto Gil, a filósofa Djamila Ribeiro, a funkeira Taisa Machado entre outras presenças ilustres. Final feliz!

Considerando que estamos em novembro, o mês da consciência negra, gostaria de repassar dois momentos da #flup2018 que me marcaram, em sintonia com o exercício ao qual sempre me proponho, de uma narrativa passado-presente.

Giovana Xavieré professora da Faculdade de Educação da UFRJ. Formada em história, tem mestrado, doutorado e pós-doutorado, por UFRJ, UFF, Unicamp e New York University. É idealizadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Intelectuais Negras. Em 2017, organizou o catálogo “Intelectuais Negras Visíveis”, que elenca 181 profissionais mulheres negras de diversas áreas em todo o Brasil.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.

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