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Numa manhã de sol, num fim de semana recente, fui com a família para um desses centros culturais hipsters, cheios de artistas tatuados, tomar um café da manhã orgânico e ver as crianças correrem na grama. Fomos meus filhos, minha esposa, minha irmã e eu, encontramos uma porção de amigos. Uma hora um dos artistas – um ator – ergueu a voz, interrompendo as conversas e pedindo a atenção de todo mundo. Perto dele, havia um rapaz de olhar tranquilo, que na hora não saquei se era artista também ou o que é que fazia.
O ator explicou que naquele dia haveria uma sessão de hipnose, e pedia voluntários. Fiz o que costumo fazer quando atores pedem voluntários: me escondi num canto. Não foi só pela timidez, me escondi também porque esse assunto me dá medo. A ideia de alguém de algum jeito encontrar uma porta aberta para entrar na minha mente e tomar nas mãos as rédeas dela me parece apavorante.
Mas minha irmã não é feita da mesma coisa que eu: levantou a mão antes de todo mundo, deu um passo à frente e disse “eu quero”. Nessa hora, o olhar do rapaz tranquilo me encontrou escondido no canto e ele perguntou se eu queria assistir. Sim, assistir eu quero, disse, enquanto minha curiosidade superava minha aflição.
Minha irmã sentou à frente dele, cada um em uma cadeira no jardim. Ele avisou que ela não seria hipnotizada se não quisesse – ela tinha que permitir. Se é verdade, ela permitiu: segundos depois ela estava ainda sentada ereta, mas com a cabeça caída para a frente, os olhos fechados, aparentemente dormindo. Fiquei chocado. Um minuto antes ela estava conversando comigo, sei que não combinou nada com o hipnólogo, nem o conhecia, e agora lá estava ela, suspensa entre a consciência e a inconsciência, atenta a tudo o que ele dizia, obedecendo cada comando.
Veja bem. Eu sei que hipnose existe, li as reportagens da Superinteressante, vi documentários, vi fazerem ao vivo na TV ou do alto de um palco. Mas – dei-me conta naquela hora – no fundo, não acredito. Na minha visão de mundo, cada um de nós é dono da nossa vontade, da nossa consciência, da nossa mente. Só que não é. Minutos depois que minha irmã sentou na cadeira, ela já havia esquecido o número sete e olhado confusa para suas mãos depois de contar até dez e sobrar um dedo. Em seguida, o hipnólogo avisou-a que o nome dela era Denis, que é o meu nome, e ela voltou à consciência achando super normal que dois irmãos, um de cada gênero, tenham o mesmo nome. Ela era capaz de acreditar em qualquer coisa que ele dissesse.
Denis R. Burgiermané jornalista e escreveu livros como “O Fim da Guerra”, sobre políticas de drogas, e “Piratas no Fim do Mundo”, sobre a caça às baleias na Antártica. É roteirista do “Greg News”, foi diretor de redação de revistas como “Superinteressante” e “Vida Simples”, e comandou a curadoria do TEDxAmazônia, em 2010.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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