Coluna
Alicia Kowaltowski
Recarregando as nossas baterias internas: as mitocôndrias
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Janeiro é mês de férias escolares, em que muitos de nós aproveitamos para “recarregar as baterias”. Me parece portanto apropriado aproveitar esse momento para falar das baterias das nossas células: as mitocôndrias.
As nossas células precisam constantemente de energia, tanto para continuar vivas, como para fazer suas funções específicas, que podem ser nos movimentar (especialidade dos músculos), pensar (cérebro), filtrar o sangue (rins) ou transformar as nossas moléculas (fígado), dentre muitas outras ações. Para isso, contam com uma organela (um pedaço específico da célula) que age como uma bateria, fornecendo energia. Essa organela é chamada mitocôndria, nome que vem da junção das palavras em grego para “filamento” e “grânulo”, pois as mitocôndrias podem tanto ter formato de grânulos quanto de filamentos.
Independentemente do formato, mitocôndrias são sempre bem pequenas, sendo necessário alinhar cerca de mil delas lado a lado para ocupar um reles milímetro de largura. Por causa desse tamanho pequeno, cada uma de nossas células tem de algumas centenas até alguns milhares de mitocôndrias, ocupando em torno de 20% a 25% do volume da célula. O fato de as mitocôndrias ocuparem muito espaço dentro da célula é evidência da importância delas.
As nossas mitocôndrias nunca tiram férias, trabalhando constantemente, dia e noite, para gerar moléculas ricas em energia química ( o ATP, ou adenosina trifosfato ), que o restante da célula usa para trabalhar. Interessantemente, não são só como baterias no sentido figurativo, mas também na sua maneira de funcionar: assim como baterias têm um polo positivo e um polo negativo, a mitocôndria também tem um lado positivo e outro negativo, separados pela sua membrana, uma estrutura semelhante à “pelinha” que separa a gema da clara de ovo. É a diferença de carga entre esses dois polos que permite que a mitocôndria sintetize a molécula de ATP.
As semelhanças não param por aí. Assim como baterias geram os polos negativos e positivos a partir de reações de oxidorredução (em que são trocados elétrons), as mitocôndrias também geram a diferença de cargas por meio dessas mesmas reações. Nas mitocôndrias, elétrons são removidos dos nossos alimentos ou de moléculas que estocamos como fonte de energia (como gorduras) e transferidos para o oxigênio que respiramos, gerando água como produto final. Não só temos baterias internas, mas temos baterias limpas, que produzem água, que não polui como os componentes de baterias tradicionais! Além disso, a habilidade de usar a energia química das mitocôndrias é muito mais eficiente do que qualquer bateria já construída pelo homem. Afinal de contas, elas tiveram alguns bilhões de anos para evoluir e adquirir mecanismos eficientes.
Alicia Kowaltowskié médica formada pela Unicamp, com doutorado em ciências médicas. Atua como cientista na área de Metabolismo Energético. É professora titular do Departamento de Bioquímica, Instituto de Química da USP, membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo. É autora de mais de 150 artigos científicos especializados, além do livro de divulgação Científica “O que é Metabolismo: como nossos corpos transformam o que comemos no que somos”. Escreve quinzenalmente às quintas-feiras.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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