Coluna
Alicia Kowaltowski
O metabolismo muda com a idade, mas não como esperávamos
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É comum ouvir pessoas atribuindo ganhos de peso após os 40 anos ao “metabolismo desacelerado”. Para cientistas que trabalham com metabolismo como eu, falar em “desaceleração” do metabolismo não faz sentido, pois metabolismo inclui todas as reações químicas que transformam moléculas em nosso corpo, inclusive aquelas que nos fazem ganhar gordurinhas. Mas entendo o uso popular de “metabolismo desacelerado” como facilidade de ganhar peso.
Ganhamos peso, ou engordamos , quando comemos mais moléculas do que gastamos para nos manter vivos, movimentar, pensar e realizar as atividades típicas diárias; nossos corpos armazenam estes excessos como gorduras. Deste modo, a tendência a engordar está intimamente ligada ao uso de energia. Em um trabalho publicado em 13 de agosto por um consórcio internacional de autores, aprendemos muito mais sobre como este uso de energia corporal, e como varia com a idade.
O trabalho é impressionante em vários aspectos. Primeiro, eles mediram o gasto energético de pessoas usando água duplamente marcada, técnica que, embora cara e muito trabalhosa, permite medir o gasto de energia do corpo durante suas atividades diárias normais, e não somente em repouso. Além disso, o estudo impressiona pela abrangência: foram medidos gastos diários de energia em 6.421 pessoas, com idades entre 8 dias e 95 anos. As medidas incluem tanto homens quanto mulheres, originários de 29 países, portanto abrangendo muitas origens e culturas diferentes.
O primeiro achado que é discutido neste trabalho é esperado: o gasto energético de um indivíduo varia com o tamanho de seu corpo. Uma pessoa de 100 quilos gasta mais energia diariamente do que uma pessoa de 50 quilos, e assim não dá para comparar diretamente um recém-nascido com um adulto. Para poder fazer comparações, eles calcularam o gasto de energia de cada pessoa normalizado por massa magra, que inclui os seus órgãos metabolicamente e fisicamente ativos que gastam energia, como fígado, rins, cérebro e músculos. Fazendo essa correção, surge um padrão de como nosso gasto de energia por quilo varia com a idade.
O padrão resultante tem vários aspectos inesperados. O primeiro é que o gasto diário de energia é o mesmo entre homens e mulheres. Manter um corpo feminino “custa” a mesma quantidade de energia por quilo que manter um corpo masculino – não há efeito de hormônios sexuais. Mais surpreendentemente ainda, o gasto de energia por quilo não muda nem mesmo durante a gravidez. Consistentemente com esse achado, medidas de gasto de energia por quilo de recém-nascidos (menos de um mês) são iguais às de adultos. Isso explica o gasto por quilo não mudar em grávidas, já que o corpo dos bebês dentro delas possuem um gasto energético semelhante ao delas.
Alicia Kowaltowskié médica formada pela Unicamp, com doutorado em ciências médicas. Atua como cientista na área de Metabolismo Energético. É professora titular do Departamento de Bioquímica, Instituto de Química da USP, membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo. É autora de mais de 150 artigos científicos especializados, além do livro de divulgação Científica “O que é Metabolismo: como nossos corpos transformam o que comemos no que somos”. Escreve quinzenalmente às quintas-feiras.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do Nexo.
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