A suspensão da Lei Rouanet para artistas de áreas de quarentena
Aline Pellegrini
05 de março de 2021(atualizado 28/12/2023 às 22h59)Secretaria da Cultura do governo Bolsonaro veta análise e aprovação de projetos em estados e municípios que adotaram restrições de circulação por causa da pandemia
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Mário Frias, secretário especial de Cultura do governo Bolsonaro
Uma portaria publicada no Diário Oficial da União na sexta-feira (5) suspendeu a análise e aprovação de projetos de captação de verba via Lei Rouanet de artistas de estados e municípios que restringiram a circulação de pessoas por causa da pandemia de covid-19. Segundo a portaria nº 124 assinada por André Porciuncula, secretário de Fomento e Incentivo à Cultura (que integra a Secretaria Especial da Cultura, chefiada por Mário Frias), a medida vale para projetos que “envolvam interação presencial com o público”.
A suspensão vale por 15 dias e poderá ser derrubada ou prorrogada a depender da situação: se os estados e municípios encerrarem as restrições de circulação, os artistas desses locais voltarão a ter seus projetos analisados. Se as restrições forem estendidas, a suspensão também poderá ser prorrogada. O texto da portaria lista como restrição de circulação lockdowns, toque de recolher ou “outras ações que impeçam a execução do projeto”.
Com os sistemas de saúde pressionados pelo agravamento da pandemia – e alguns lugares já vivendo um colapso -, estados e municípios vêm adotando diferentes níveis de quarentena a fim de reduzir a circulação do novo coronavírus. O presidente Jair Bolsonaro, a quem a pasta da Cultura é subordinada, é contra o isolamento social, mesmo diante de todas as evidências de que o distanciamento é necessário em meio à crise sanitária.
Bolsonaro já chegou a dizer que deixaria de pagar a nova rodada de auxílio emergencial à população de estados que optam pelas quarentenas. A retomada do benefício pago em 2020 ainda precisa ser viabilizada por uma emenda constitucional no Congresso.
Porciuncula, que assinou a portaria, já se manifestou contrariamente às medidas de isolamento social. Em julho de 2020, escreveu que “lockdown é a neurose de um monomaníaco” em suas redes sociais . Ex-capitão da Polícia Militar baiana, o secretário foi nomeado para o cargo apesar de não ter experiência comprovada na área da cultura.
“Apenas adotei uma medida de probidade administrativa. Não posso aprovar o uso do dinheiro público em projetos culturais em local que não haja possibilidade de execução. Tão logo as restrições acabem, o fluxo de análise voltará ao normal”, comentou o secretário sobre a medida em uma rede social.
Projetos aprovados pela Lei Rouanet não são imediatamente executados. Com o aval da Secretaria da Cultura, o artista ou empreendedor cultural ainda tem que captar recursos junto a empresas para viabilizá-lo. O prazo de captação é de até três anos.
A suspensão é apontada como um problema porque o tempo entre a aprovação e a execução do projeto pode ser longo. Assim, mesmo em quarentena, o projeto, uma vez aprovado, poderia ir sendo tocado até que as apresentações para o público sejam novamente liberadas.
Para Eduardo Barata, presidente da Associação dos Produtores de Teatro do Rio, a única função verdadeira da medida é atrapalhar a cultura no Brasil. “Na verdade, ele [Porciuncula] está prejudicando o andamento da Lei Rouanet. Só que não é para agora. Será que ele tem certeza de que a pandemia estará igual daqui a seis meses?”, afirmou Barata o jornal Folha de S.Paulo.
A portaria também foi classificada como uma retaliação do governo federal contra governadores que estão adotando medidas para conter o contágio pela covid-19. “Inacreditável! O governo está vetando a Lei Rouanet como forma de retaliação aos estados que estão decretando restrições de circulação”, escreveu a atriz Leandra Leal em suas redes sociais.
Deputados da oposição já pediram, por meio de cinco projetos de decretos legislativos, a suspensão da portaria. “Mais uma vez, o governo federal penaliza agentes culturais em um momento de grande crise social e de saúde pública”, escreveramMaria do Rosário (PT-RS), Benedita da Silva (PT-RJ) e Waldenor Pereira (PT-BA), autores de um dos projetos de decreto legislativo.
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