Expresso

Como está a liberação de agrotóxicos no governo Bolsonaro

Juliana Sayuri

11 de março de 2019(atualizado 28/12/2023 às 12h16)

Mais 74 produtos entraram no mercado brasileiro em pouco mais de dois meses do novo governo. Entenda o que envolve o processo de liberação

FOTO: CHAFER MACHINERY/CREATIVE COMMONS

Máquina aplica agrotóxicos em lavoura

Até 4 de março de 2019, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) havia liberado 74 produtos relacionados a agrotóxicos , 58 deles já formalizados mediante publicação no Diário Oficial da União. Agora, o país passa a ter mais de 2.000 produtos agrotóxicos liberados para comercialização.

De acordo com dados do Ministério da Agricultura , em 2018, durante o governo de Michel Temer (MDB), foram aprovados 450 registros, um recorde histórico. O Ministério da Agricultura afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que o aumento nos registros vem ocorrendo em razão de “uma maior agilidade da Anvisa nas análises toxicológicas” . A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) é responsável por avaliar o nível de toxicidade dos produtos.

O ministério ressaltou também que as recentes liberações não envolvem ingredientes novos. Isso quer dizer que os componentes liberados já eram comercializados no país. A diferença é que, agora, esses ingredientes podem ser utilizados em novas culturas ou em combinações com outras substâncias químicas. E mais empresas podem fabricá-los e comercializá-los.

Cada um dos agrotóxicos licenciados recentemente, portanto, corresponde a um produto novo (ou uma fórmula nova, ou uma marca nova) que poderá circular no mercado, feito com ingredientes anteriormente aprovados no país.

Governos anteriores

O Brasil e o uso dos agrotóxicos

O Brasil é líder mundial em consumo de agrotóxicos . No país, esse mercado movimenta cerca de US$ 10 bilhões por ano , o que representa 20% do mercado mundial, estimado em US$ 50 bilhões. Em 2017, segundo dados do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), os agricultores brasileiros usaram 540 mil toneladas de agrotóxicos, quase o dobro em relação a 2010.

O agrotóxico é um produto, químico ou biológico, utilizado para prevenir ou exterminar pragas das lavouras, como insetos, fungos, bactérias e ervas daninhas. Há disputas sobre o termo na língua portuguesa: representantes do agronegócio usam o termo “defensivo agrícola” ou “fitossanitário”, para afastar a imagem de uma substância “tóxica”.

As novas liberações

Quem libera

A análise para liberação do registro de agrotóxicos é feita por três órgãos: Ministério da Agricultura, Anvisa e Ibama. Eles analisam o grau toxicológico e potencial de periculosidade ambiental.

O que foi liberado

Entre os 58 agrotóxicos aprovados e divulgados no Diário Oficial, 21 são classificados como “extremamente tóxicos”; 11 foram considerados “altamente tóxicos”; 19, “medianamente tóxicos”; e 7, “pouco tóxicos”.

O que define o grau de toxicidade

Segundo a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), a toxicidade é definida pela Dose Média Letal (DL50) , que se refere ao número de miligramas do ingrediente ativo do agrotóxico necessários para matar 50% dos animais em um teste de laboratório.

Os dois projetos em debate

Desde 2018, o licenciamento de novos produtos agrotóxicos vem acompanhado pela discussão de dois projetos divergentes no Congresso: o PL 6.299/2002 , que pretende flexibilizar as regras de registro para novos produtos; e o PL 6.670/2016 , que visa instituir a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos.

PL 6.299/2002

Apresentado pelo ex-senador e ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi (PP-MT) em março de 2002, o projeto foi aprovado em comissão especial do Senado, presidida pela deputada federal Tereza Cristina (DEM), em junho de 2018. Tereza Cristina é a atual ministra da Agricultura. O texto confere a avaliação toxicológica de pesticidas ao Ministério da Agricultura, reduzindo o papel de fiscalização e controle da Anvisa e do Ibama no processo. O projeto, que ainda não foi votado no Congresso, é defendido por parlamentares da bancada ruralista. Críticos se referem à iniciativa como o “Pacote do Veneno” .

PL 6.670/2016

Em dezembro de 2016 foi proposto o projeto de autoria da Comissão de Legislação Participativa , com apoio de instituições de pesquisa como a Fiocruz – Fundação Oswaldo Cruz e ONGs como o Greenpeace, organizados na plataforma #ChegaDeAgrotóxicos . Em dezembro de 2018, o texto foi aprovado em comissão especial do Senado. Na contramão do PL 6.299, o PL 6.670 propõe reduzir gradualmente o uso de agrotóxicos e endurecer a fiscalização de resíduos de pesticidas. O texto tramita na Câmara.

Como é na Europa e nos EUA

Em junho de 2018, cinco relatores da Organização das Nações Unidas assinaram relatório manifestando preocupação sobre a possível aprovação do PL 6.299 pelo Congresso Nacional. Em audiência para discutir o projeto em setembro de 2018, Denise Hamú, chefe da ONU Meio Ambiente no Brasil, lembrou que o país é signatário da Convenção sobre Diversidade Biológica , que determina redução de agroquímicos para não afetar a biodiversidade.

Atualmente, agrotóxicos já liberados no Brasil são proibidos em outros países, por estarem associados a casos de câncer e alterações genéticas . Cerca de um terço dos ingredientes liberados para uso no Brasil estão proibidos na União Europeia , por exemplo. Nos Estados Unidos, mais de 60 tipos de pesticidas foram banidos.

A recente leva de liberações brasileiras incluiu agrotóxicos proibidos em outros países, como os inseticidas Sulfoxaflor (restringido nos EUA) e Fipronil (banido na França). Os venenos de pulverização aérea Imazetapir e Hexazinona , vetados na Europa desde 2004 e 2002 respectivamente, agora foram liberados no Brasil.

Uma vez autorizadas, as substâncias só são reavaliadas mediante pedidos formais no Brasil. Em outros países, a licença tem validade temporária: nos Estados Unidos, os produtos devem ser analisados a cada 15 anos, levando em consideração atualizações de pesquisas científicas na área; na Europa, a cada 10 anos; no Japão, a cada 3 anos.

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